Acórdão nº 5348/18.5T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | EVA ALMEIDA |
Data da Resolução | 08 de Novembro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO Pedro requereu processo especial para acordo de pagamento, alegando, em síntese, que não tem capacidade, por meios próprios, de cumprir pontualmente as suas obrigações. Concluindo: “Assim sendo, dúvidas não restam que o requerente se encontra em situação económica difícil, pelo que o recurso ao processo especial para acordo de pagamento, com vista a negociar com os seus credores a consolidação do seu passivo e um plano de pagamento das suas obrigações se afigura como a solução mais vantajosa e a viável quer para o requerente quer para os seus credores”.
Concluído o processo sem se ter celebrado acordo de pagamento, o Administrador Judicial Provisório (AJP), após “auscultar” o devedor (que nada disse), e os credores (alguns dos quais se pronunciaram no sentido do devedor se encontrar insolvente), emitiu Parecer, nos termos do nº 4 do art.º 222ºG do CIRE, em que, sustentado no facto de devedor ter dívidas no montante de €785.747,25, não ter património e os únicos rendimentos que aufere serem os da sua actividade de gerente, que em 2015 montaram a €9.485,20, conclui que o devedor se encontra numa situação de insolvência, requerendo que a mesma seja declarada.
Foi determinada a extracção de certidão do requerimento inicial, dos documentos e do parecer e a sua remessa à distribuição.
Distribuído como apenso, foi aberta conclusão, proferindo-se de imediato sentença, com a seguinte DECISÃO: – «Face a todo o exposto, julgando procedente a presente acção: 1 – Declaro a insolvência de Pedro, residente na Rua … Braga nesta comarca; 2 – Fixo a sua residência na mesma morada.
3 - Como Administrador da Insolvência nomeio o Sr. Dr. F. D.; 4 – Nos termos do artº 66º, nº 2, e sem prejuízo do disposto no artº 67º, nº 1, não se procede à nomeação da Comissão de Credores.
5 – Determino que o insolvente proceda à entrega imediata ao administrador da insolvência dos documentos a que aludem as alíneas do nº 1 do art. 24º (art. 36º, al. f).
6 - Ordeno a imediata apreensão de todos os bens do insolvente, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos (art. 36º, a. g).
7 – Fixo em 30 dias o prazo para a reclamação de créditos (art. 36º, al. j).
9 – Designo, para realização da Assembleia de Apreciação do Relatório a que alude o art. 156º do CIRE o próximo dia 2 de Outubro de 2018, pelas14 horas (art. 36º, al. n).
10 - Dê publicidade à sentença nos termos previstos nos arts. 37 e 38º do CIRE.
11 - Notifique a presente sentença: a) ao insolvente; b) ao Ministério Público; 12 – Cite os demais credores e outros interessados, nos termos do art. 37º, nº 5, 6 e 7.
13 – Remeta certidão à Conservatória do Registo Civil, no prazo de 5 dias, nos termos e para os efeitos previstos no art. 38º, nº 2, a. b), nºs 5 e 6 do CIRE e arts. 9º, al. i) e l) do Cod. Reg. Comercial.
14 – Cumpra o disposto no art. 38º, nº 3 e 5.
15 – Custas pela massa insolvente (art. 304º).
»*Inconformado, o devedor interpôs o presente recurso, que instruiu com as pertinentes alegações, em que formula as seguintes conclusões: «I - O devedor foi declarado insolvente sem citação prévia, com base no entendimento de que este veio, representado pelo seu Administrador Judicial Provisório, apresentar-se à insolvência, nos termos do disposto no art.º 28.º do CIRE, aplicável por força do n.º4 do art.º 222.ºG do CIRE.
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A aplicação do n.º 3 e n.º 4 do art.º 222º-G e art.º 28.º, ambos do CIRE, pelo Tribunal a quo viola, de forma cabal, os princípios contidos nos números 1 e 4 do artigo 20.º da CRP, pelo que não pode ser admitida.
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È mister, nos termos do n.º4 do art.º 222.º-G do CIRE a extração de certidão para instauração de processo de insolvência sendo certo que, nesse processo, deverá ser ordenada a citação do devedor para contestar a ação nos termos dos artigos 219.º e art.º 225.º, ambos do C.P.Civ., atendendo ao disposto no art.º 17.º do CIRE.
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Não é aplicável ao caso o art.º 28º do CIRE, porque que não existe reconhecimento pelo devedor da sua situação de insolvência.
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Nada há na lei que justifique que o AJP possa substituir o devedor na apresentação à insolvência, de sorte que não pode equivaler aquele requerimento à apresentação à insolvência nem pode implicar o reconhecimento pelo devedor da sua situação de insolvência.
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Compete sempre ao tribunal sopesar os fundamentos factuais alegados pelo AJP no seu parecer e subsumi-los à lei em ordem a concluir ou não pela situação de insolvência do devedor.
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Porquanto, os nºs 3 e 4 do art.º 222.º-G não preveem a possibilidade do devedor contraditar judicialmente, de facto e de direito, o parecer do AJP.
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A unidade do sistema jurídico, concretamente o direito de defesa e a exigência de um processo equitativo consagrados no art.º 20º n.º1 e 4 da C.R.P. e o principio do contraditório plasmado nos artigos 29º e 30º do CIRE e 3º do CPC, impedem que se interpretem os artigos 222.º-G n.º 4 e 28º do CIRE, no sentido de equiparar o parecer do AJP de que o devedor está em situação de insolvência ao reconhecimento da insolvência pelo devedor, quando este declarou no PEAP que não se encontrava insolvente.
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Estabelece a Constituição da República Portuguesa (art.º 20º, nºs 1 e 4) que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, bem como a que a causa em que intervenham seja objeto de uma decisão mediante um processo equitativo.
X.
Sendo pois, as supra citadas normas do art.º 222.º-G do CIRE inconstitucionais na interpretação que...
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