Acórdão nº 2185/14.0EAPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução04 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: X - Actividades Hoteleiras Lda. veio interpor recurso do despacho proferido pela Sra. Juíza do Juízo Local de Guimarães, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, rejeitando o recurso de impugnação judicial que apresentara no dia 4-01-2018 da decisão da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) de que a mesma fora notificada no dia 21-11-2017.

Com efeito, a Sra. Juíza considerou extemporânea tal impugnação porque, «segundo o disposto nos art.ºs 59.º e 60.º do RGCO, o prazo para interposição do recurso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa é de vinte dias, após o seu conhecimento pelo arguido, suspendendo-se tal prazo aos sábados, domingos e feriados, tendo este prazo natureza administrativa e não judicial, não lhe sendo por isso aplicáveis as regras próprias dos prazos judiciais, nomeadamente não se suspende nem interrompe durante as férias judiciais».

*A arguida formulou na sua motivação as seguintes conclusões: (…) 2. Dispõe o artigo 59.°, n.° 3 do RGCO que o recurso é apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima, no prazo de 20 dias após o seu conhecimento pelo arguido.

  1. De acordo com o disposto no artigo 41.º do RGCO é subsidiariamente aplicável o processo penal e, nos termos do disposto no artigo 103.º n.º 1 do CPP «os actos processuais praticam-se nos dias úteis, às horas de expediente dos serviços de justiça e fora do período de férias judiciais», apenas se exceptuando os casos elencados nas alíneas a) a e) do n.º 2 do artigo 103.º do CPP e os actos considerados urgentes em legislação especial.

  2. O recurso de impugnação judicial, não constando do elenco das excepções do n.º 2 do artigo 103.º do CPP; 5. Nem estando previsto em legislação - especial ou outra - a urgência do acto ou a urgência do processo, no âmbito do qual se pratica o acto de impugnação judicial; 6. Então não se pode considerar que a mera interposição de um recurso de impugnação judicial seja um acto urgente, nem tão-pouco se pode aplicar aquela norma (excepcional) analogicamente.

  3. Refere ainda a alínea e) do artigo 279° do Código Civil que «à fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras: (...) e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo».

  4. Pelo que é irrelevante a circunstância das entidades administrativas não gozarem de “férias judiciais”.

  5. Pois estas, por via do artigo 279.º, alínea e) do CC, são equiparadas a Sábados, Domingos e feriados e, nessa medida, em tais dias deverá considerar-se suspensa a contagem do prazo, por não serem considerados dias úteis.

  6. Nos presentes autos, tendo o termo do prazo caído em período de férias judiciais, este transferiu-se para o primeiro dia útil seguinte ao fim das férias judiciais – 4 de Janeiro de 2018.

  7. Salvo o devido respeito, a interpretação do Tribunal a quo - que considera que não se encontra suspenso em férias o recurso de impugnação judicial – não é harmonizável com as garantias processuais e constitucionais do arguido.

  8. Aliás, existe com esta interpretação uma violação ao princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado, encontrando-se assim aquela também, fatalmente ferida de “não-conformidade-constitucional”.

  9. Pelo exposto, o tribunal a quo violou, ainda, os princípios do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva e o da proporcionalidade e da proibição do excesso, consagrados nos artigos 20.º e 18.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

Termos em que e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, o despacho que rejeitou o recurso de impugnação judicial revogado.

O recurso foi admitido por despacho proferido a fls. 98.

O Ministério Público, em 1ª Instância, apresentou resposta à motivação, pugnando pela improcedência do recurso, defendendo, em suma, que é de natureza administrativa o prazo de 20 dias para apresentação de recurso judicial de impugnação de decisão, em processo de contra-ordenação, com uma argumentação, que o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto, neste Tribunal, reforçou no douto parecer que emitiu.

Foi cumprido o art. 417º, nº 2, do CPP *Na medida em que o âmbito dos recursos se delimita pelas respectivas conclusões (art. 412º, nº 1, do CPP), importa apreciar e decidir a questão de saber se, tendo caído em período de férias judiciais, o termo do prazo para a interposição do recurso de impugnação judicial se teria transferido para o primeiro dia útil seguinte ao fim das férias (4-01-2018), por força do disposto nos arts. 41º do RGCO, 103º nº 1 do CPP e 279º, e), do CC.

Para tanto, relevam os factos que se retiram do antecedentemente relatado.

*O essencial da tese da recorrente resume-se à ideia de que praticou atempadamente a pretendida impugnação judicial porque, estando tal acto sujeito ao prazo de 20 dias (contado a partir de 21-11-2017), a este devem ser deduzidos os Sábados, Domingos e feriados e os dias de férias judiciais [22-12-2017 a 3-01-2018], que àqueles se equiparam quando «o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo», como dispõe o citado art. 297º do CC.

Na sustentação de tal equiparação, a recorrente considera irrelevante a circunstância de as entidades administrativas não gozarem de “férias judiciais”, o que, imediatamente, denuncia o vício do seu raciocínio: a recorrente funda a pretensa tempestividade do recurso que deduziu na suposição de se tratar de um acto praticado, não em procedimento administrativo, mas em juízo, ainda que contra uma decisão proferida no âmbito de um processo contra-ordenacional, sendo, pois, de aplicar o disposto no art. 279º, e), do CC, em função do que aquela impugnação poderia ser apresentada no primeiro dia útil após as férias judiciais, ou seja, em 4-01-2018.

Porém, essa suposição não tem fundamento. Vejamos.

O pertinente regime estabelecido pelo designado RGCO (Ilícito de Mera...

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