Acórdão nº 379/17.5T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Maria…, intentou a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra Sociedade…, Lda., alegando opor-se ao despedimento de que foi alvo em 16/3/2017.

A R. deduziu o seu articulado de motivação do despedimento individual, com fundamento em facto imputável à trabalhadora, discriminado os factos que, em seu entender, integram a prática, pela trabalhadora de várias infrações disciplinares e constituem justa causa de despedimento, acusando-a, em síntese, de, no exercício das suas funções de caixeira e contra ordens e instruções da sua empregadora, ter entregue mercadoria a uma cliente do estabelecimento, sem ter recebido o respetivo preço e sem colocar a mercadoria entregue em reserva na ficha da cliente, não obstante ter conhecimento que a mesma cliente estava em incumprimento, tendo, antes, registado os artigos entregues à cliente em reserva de loja como forma de ocultar a sua atuação e dito à gerência que tais artigos se encontravam em stock no estabelecimento, quando interpelada sobre os mesmos, tudo com intenção de prejudicar patrimonialmente a entidade empregadora e de beneficiar a cliente.

A A. trabalhadora contestou impugnando os factos alegados pela R. empregadora e invocando a ilicitude do despedimento, por improcedência do motivo justificativo e inexistência de justa causa, alegando que tudo não passou de um mero lapso que não causou prejuízo patrimonial à empregadora. Em reconvenção, pede a condenação da R. a reintegrá-la no seu posto de trabalho, ou a indemniza-la numa quantia correspondente a 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade, perfazendo, até à data, o montante de €11.272,00, bem como a pagar-lhe todas as retribuições mensais que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, acrescidas de juros de mora. Mais pediu a condenação da Ré a pagar-lhe diferenças no subsídio de alimentação, no valor de €106,00, diferenças referentes ao trabalho prestado ao sábado, no valor de €58,80 e uma indemnização por danos não patrimoniais de montante não inferior a €7.000,00 para compensação de danos sofridos com o desconto ilegal no seu vencimento da quantia de €453,00 e com o despedimento.

A R. respondeu, pugnando pela improcedência da reconvenção.

Obteve-se a conciliação parcial da partes quanto a diferenças de subsídio de alimentação, do trabalho aos sábados à tarde e diferenças na retribuição de base, tendo a A. reduzido o pedido reconvencional às quantias reclamadas nas alíneas a), b) e) e f) do mesmo. Mais declarou que opta pela indemnização em substituição da reintegração.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, proferindo-se sentença nos seguintes temros: “ Perante o exposto, julgo totalmente improcedente, por não provada, a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e, em consequência, absolvo a R. empregadora do pedido contra si formulado pela A. trabalhadora …” Inconformada a autora interpôs recurso apresentado as seguintes conclusões: … II) Entende a Autora apelante que a Sentença não pode subsistir, em virtude de ter havido uma errada apreciação da matéria de facto, interpretação e aplicação do direito à matéria de facto provada.

III) O tribunal recorrido devia ter dado como não provados os factos supra elencados sob os n.º 33, (corresponde ao artigo 5.º, ponto 17. do articulado da Ré) “Sucedeu que, a Autora, como bem sabia que não podia autorizar que aqueles artigos fossem entregues à referida cliente ao abrigo do regime de “reserva”, conforme descrito supra, uma vez que se tratava de uma cliente em incumprimento, praticou os atos que se seguir se descrevem”; n.º 35 (corresponde ao artigo 5.º, ponto 19. do articulado da Ré) “Como a Autora não podia registar reservas em nome da cliente em causa, porque em qualquer das datas referidas 28.09.2016 e 29.10.2016, a referida cliente apresentava uma situação de incumprimento relativamente a reservas anteriores.”; n.º36 (corresponde ao artigo 5.º, ponto 20. do articulado da Ré) “Registou no sistema informático do estabelecimento … Mirandela os artigos discriminados nos antecedentes pontos 29 e 30, em “reserva de loja”; n.º 47 (corresponde ao artigo 5.º, ponto 32. do articulado da Ré) “A Autora agiu determinada pela vontade de ocultar à entidade empregadora os factos supra referidos”; n.º 48 (corresponde ao artigo 5.º, ponto 33. Do articulado da Ré) “A Autora agiu determinada pela vontade de beneficiar a referida cliente.”, os quais foram incorretamente julgados.

… V) O Tribunal fundamentou tal decisão principalmente nos depoimentos das testemunhas … VI) Sucede que, no entender da Autora, tais testemunhas não prestaram um depoimento isento e do qual pudessem resultar provados tais factos.

VII) E muito menos tais factos poderiam ser dados como provados conjugados os depoimentos das outras testemunhas, com a prova documental carreada para os autos com os articulados e com outros factos dados como provados.

… XVII) Quanto muito e apenas resulta que as reservas dos dias 28.09.2016 e 29.10.2016 foram efetuadas pela Autora no sistema informático do estabelecimento ... de Mirandela em “reservas de loja”.

XVIII) Nunca a Autora agiu contra as ordens e instruções da sua empregadora, entregando mercadoria à cliente … e para ocultar a sua conduta, registou as mercadorias entregues no sistema de reserva de loja.

XIX) De resto constam dos autos outros meios probatórios – prova documental – não valorados, como se impunha, pelo Tribunal a quo, que poderá infirmar precisamente o contrário.

XX) Desde logo os talões de venda dos dias 08.10.2016 e 24.10.2016 juntos com a resposta à nota de culpa como documento n.º 4, donde se retira que a Autora podia efetuar vendas em regime de reserva na ficha de cliente e que só por lapso as vendas efetuadas nos dias 29.09.2016 e 29.10.2016 foram efetuadas em “reserva de loja” de Mirandela.

… XXIII) O Tribunal deu como provado o artigo 24.º da contestação (pontos 62 e 63 da Sentença) ou seja, “toda a mercadoria entregue à cliente ficou registada no sistema informático de reservas da loja de Mirandela, ao qual a entidade patronal tinha, como teve, acesso.”; parte do artigo 26.º da contestação, “as reservas são controladas mensalmente” e, quando verificado que existem reservas de cliente sem regularização há mais de um mês ou reservas de loja com mais de oito dias, é enviado um relatório para a loja respetiva para regularização XXIV) O Tribunal deu ainda como provados os artigo 27.º e 30.º da contestação (pontos 64 e 65 da Sentença), ou seja, “no período compreendido entre 28/09/2016 e 29/10/2016, para além da mercadoria referida supra em 29 e 30, no valor de €453,00, a A., em 8/10/2016 e 24/10/2016, entregou à cliente mercadoria no valor de €414,10, em sistema de reserva de cliente, registada no sistema informático da ré na respetiva ficha de cliente, perfazendo o valor total da mercadoria entregue à cliente nesse período a quantia de €867,10; “Toda a mercadoria vendida no período compreendido entre 28/09/2016 a 29/10/2016 foi incluída no acordo efetuado diretamente entre a cliente e a entidade patronal.” XXV) À exceção da situação constante do artigo 5.º, pontos 13 e 14 do articulado da Ré a Recorrente sempre procedeu corretamente ao registo das peças no sistema informático do estabelecimento ... de Mirandela.

XXVI) Pelo que, é também de salientar, que a situação supra referida nenhum prejuízo causou á entidade empregadora.

XXVII) Acresce, referir que a A., conforme resulta da matéria de facto provada, foi admitida ao serviço em 22/09/2003, no estabelecimento comercial “...” em Mirandela, o qual foi posteriormente adquirido pela R. no inicio do ano de 2015, e nunca foi alvo de qualquer processo disciplinar.

XXVIII) Todavia, o Tribunal deu ainda como provado o artigo 12.º da resposta à contestação – reconvenção, (ponto 74 da douta Sentença) ou seja, que “desconto realizado no vencimento da Autora respeitante ao mês de novembro de 2016 foi realizado a pedido insistente da própria Autora, uma vez que bem sabia que não lhe estava permitido realizar mais fornecimentos à referida cliente no regime de “reserva” e não queria prejudicar a sua empregadora” … XXXII) Pelo que, face à prova produzida, houve erro na apreciação da prova e, mesmo que se considerasse que há dúvida, a mesma deveria sempre beneficiar a Recorrente, arguida no processo disciplinar, atento o princípio in dúbio pro reo (cfr., artigo 1.º, n.º 2 al. a) do Código de Processo de Trabalho e artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa).

… XXXIV) É manifesto que a Autora não violou qualquer dever a que estava vinculada, nomeadamente os deveres de obediência, lealdade, de probidade e honestidade e não causou nenhum prejuízo sério à Ré sua entidade empregadora, e muito menos o fez de forma grave que compromete-se de forma absoluta definitiva e irremediável a relação laboral.

XXXV) Ora o facto da Autora ter registado no sistema informático do estabelecimento ... de Mirandela em “reserva de loja” os artigos descriminados no artigo 5.º, pontos 13 e 14 do articulado da Ré, não pode constituir fundamento de justa causa para despedimento.

… XXXIX) Não é qualquer comportamento que permita que seja aplicável uma sanção disciplinar, mas somente aquele que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho e, in casu, não houve comportamento grave, culposo que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral, nem os comportamentos da trabalhadora/Recorrente minaram a relação de confiança, tal como consta da sentença.

XL) Bem pelo contrário, resulta da sentença recorrida, mormente da matéria de facto provada, artigo 3.º e 4.º da contestação (pontos 50 e 51 da Sentença), “A entidade patronal, na segunda metade do mês de dezembro de 2016, antes de...

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