Acórdão nº 2143/15.7T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução25 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório JOSÉ, casado, residente na Rua do …, freguesia de D…arque, Viana do Castelo, instaurou a presente acção de processo comum contra Seguros X, COMPANHIA DE SEGUROS DE VIDA, S.A.

, com sede na Rua …, Lisboa, peticionando a condenação da Ré no pagamento ao Autor da quantia de €41.000,00 (quarenta e um mil euros), acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, contados sobre a referida quantia e desde a data da participação do sinistro, até integral e efectivo pagamento; e, subsidiariamente, a condenação da Ré no pagamento ao Banco A, S.A. do montante do empréstimo em dívida e no pagamento ao Autor das prestações que pagou ao Banco desde que ficou incapacitado para exercer a sua actividade (Fevereiro de 2013) e até à data do pagamento da Ré ao Banco A, S.A..

Para tanto, e em síntese, alega que: A 12 de Junho de 2007 contratou com a Ré o seguro denominado “Crédito à habitação – Vida Habitação Seguro de Vida Grupo 2 Cabeças” pelo qual a Ré se obrigava a pagar ao Autor a quantia de €40.000,00 (quarenta mil euros), em caso de morte, tendo como beneficiários os seus herdeiros legais, e a quantia de €40.000,00 (quarenta mil euros) em caso de invalidez absoluta e definitiva, tendo como beneficiário o aqui Autor.

Que após admissão no Instituto Português de Oncologia do Porto FG, EPE, no Porto, em Fevereiro de 2013, o Autor apresentava um quadro de tumefação cervical submandibular esquerda, com evolução de cerca de 3 meses, otalgia reflexa e sensação de maxilar preso associado e que actualmente, encontra-se a fazer tratamento experimental - ensaio clínico LUX Head e Neck - afatinib adjuvante vs placebo após radio-quimioterapia, mantendo seguimento no IPO Porto.

Mais alega que enviou à Ré documentação que atestava que o mesmo é portador de uma incapacidade permanente de 84% e que se encontra incapacitado para o exercício de qualquer actividade profissional, necessitando de terceira pessoa.

Mais invoca ter sofrido danos morais.

A Ré contestou alegando em síntese que o Banco A SA previamente à subscrição da proposta de seguro comunicou ao autor as cláusulas inseridas no contrato e informou os elementos essenciais à sua celebração; mais alegou que o Autor não reúne as condições necessárias para que se considere em invalidez absoluta e definitiva.

Foi admitida a intervenção principal da mulher do Autor Maria (lado activo) e foi admitida a intervenção principal do Banco A, S.A. (lado passivo).

O Autor formulou ainda articulado superveniente, pedindo a condenação da Ré no pagamento ao Autor da quantia €9.833,48.

Foi realizada a audiência prévia, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Em face de todo o exposto julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, condeno a ré Seguros X – Companhia de Seguros Vida, S.A.: -a) a pagar ao Banco A, S.A. o montante ainda em dívida relativo ao empréstimo mencionado no ponto 17 dos factos provados e que, em Fevereiro de 2013 – data do sinistro/doença – ascendia a € 34.854,83; -b) a pagar ao Autor as quantias que este pagou no âmbito do aludido empréstimo, desde Fevereiro de 2013 em diante e, bem assim, todas as prestações que o Autor pagar até que a ré cumpra com o acima determinado.

-c) a pagar ao Autor os juros, à taxa legal, sobre as quantias mencionadas em b), desde as datas em que o Autor as desembolsou e desembolsará, até integral pagamento.

No mais, julgo a acção improcedente, absolvendo-se a ré dos restantes pedidos”.

Inconformada, apelou a Ré da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “1. Não se conformando com a decisão proferida, nomeadamente no que respeita à aplicação da lei ao casos dos presentes autos, vem a ora Recorrente apresentar as suas alegações de recurso no que concerne a: · Das Cláusulas Contratuais Gerais e Da sua Comunicação · Das Cláusulas Contratuais Gerais e Da Nulidade do Contrato 2. Estando perante uma situação de seguro de grupo em que é invocada a existência de uma cláusula contratual geral, a sua não comunicação prévia e respectiva explicação do seu teor ao aderente, o ónus da prova relativamente a tal facto impende sobre o tomador do seguro, de acordo com a repartição do ónus da prova - artigo 4.° do Decreto-Lei 176/95, de 26.Julho, actual artigo 78.° do DL 72/2008, de 16 de Abril e pelo artigo 342.° do Código Civil.

  1. De facto, convém ter presente que o seguro é feito em benefício essencialmente do Tomador (o Banco é o beneficiário essencial) logo é absolutamente excessivo penalizar a seguradora pelo incumprimento praticado por quem, verdadeiramente, é o dono do negócio (o Tomador).

  2. É o Banco que negoceia com a Seguradora os termos em que quer o contrato de seguro até para se proteger relativamente aos riscos dos seus empréstimos.

  3. É o Banco que, em consequência da sua actividade, informa os clientes (futuros segurados) da necessidade de aderirem a um seguro em seu próprio benefício.

  4. É o Banco que determina quem pretende ou não incluir no contrato de seguro (e não a seguradora que quando muito poderá recusar pedidos de inclusão).

  5. É o Banco que recebe o valor em caso de sinistro coberto para ressarcimento dos valores mutuados.

  6. Assim, se conclui que o Banco actua por si próprio, em seu próprio nome, no seu próprio interesse, por sua própria conta, como Tomador de Seguro e Beneficiário e é nessa qualidade que ele está obrigado a informar o Segurado do teor das cláusulas contratuais.

  7. Assim, não tendo o A. demandado a instituição de crédito tomadora do seguro, não pode ser oposta à seguradora demandada a violação do dever de comunicação e informação do conteúdo das cláusulas contratuais gerais.

  8. A primeira daquelas características das cláusulas contratuais gerais permite distingui-las do contrato pré-formulado.

  9. As cláusulas contratuais gerais excluem a liberdade de estipulação – mas não a liberdade de celebração.

  10. A ordem jurídica não podia, na verdade, ficar indiferente aos riscos e abusos que as cláusulas gerais encerram, atendendo à situação de precariedade e de vulnerabilidade em que colocam frequentemente os contraentes aderentes. Essa tutela desenvolve-se, não apenas ao nível do conteúdo do negócio concluído na base de cláusulas contratuais gerais, mas desde logo – compreensivelmente – no momento da formação do contrato.

  11. Não está em causa a qualidade do contrato – ou seja o equilíbrio e a razoabilidade dos termos contratuais – mas a qualidade da contratação, i.e., um nível satisfatório de realização de pressupostos informativos e situacionais de formação esclarecida da vontade contratual.

  12. Para assegurar a protecção do aderente, a lei disponibiliza um disciplina especial que faz depender a inserção das cláusulas contratuais gerais nos contratos singulares de um dever de comunicação ao aderentes dessas cláusulas e de um dever de informação sobre o seu alcance (artºs 5 e 6 da LCCG).

  13. Ora, e conforme já exautivamente supra se expôs, no caso em concreto, o dever de comunicação das cláusulas era do tomador de seguro – Banco.

  14. A inobservância destes deveres é sancionada com a sua expurgação do contrato singular concreto de seguro celebrado, que, em princípio, subsistirá mediante o recurso às normas supletivas integradoras gerais (artºs 8 e 9 da LCCG).

  15. O contrato, porém, não subsistirá se, apesar da aplicação das normas supletivas ou das regras de integração dos negócios jurídicos, se verificar uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais desse mesmo contrato ou um desequilíbrio nas prestações, gravemente atentatório da boa fé, hipótese em que o contrato se deve ter irrefragavelmente nulo (artº 9 nº 2 da LCCG).

  16. No caso, pergunta-se: essa exclusão implica uma indeterminação, em absoluto insanável ou insuprível dos elementos essenciais do contrato de seguro, que implique a declaração da sua nulidade e o estabelecimento entre os contraentes de uma relação de liquidação? A resposta que se tem por exacta é positiva.

  17. Ora, uma das grandes “traves mestras” da actividade seguradora assenta precisamente na análise do risco e na consequente adequação dos prémios de seguro às circunstâncias concretas de cada caso, de modo a que seja possível assegurar uma razoável proporcionalidade entre o risco assumido pelo segurador, e o prémio de seguro a suportar pelo tomador.

  18. Esta relação entre o risco a assumir pela companhia de seguros e o prémio a suportar pelo tomador, configura precisamente uma das características principais do contrato de seguro: trata-se de um negócio jurídico bilateral, na medida em que dele resultam obrigações recíprocas para ambas as partes contratantes.

  19. Assim, não obstante a clara tendência de se sacrificar a posição contratual das Seguradoras, no pressuposto de que estas figuram, na verdade, como sendo o “lado forte” do contrato, na medida em que, em regra, encontram-se numa posição economicamente mais favorecida, não será admissível impor às Seguradoras a aceitação ou o pagamento de todo e qualquer risco/prejuízo, ainda que não contratados, no pressuposto que estes possam ser inerentes à celebração de um contrato de seguro.

  20. Nesta medida, e ressalvando novamente o devido respeito, que é muito, a condenar-se a ora Recorrente no pagamento dos montantes indemnizatórios peticionados pelo Recorrido considerando a exclusão em apreço nula, violar-se-ia, por completo, o equilíbrio contratual das partes.

  21. Assim, e pelo que se acaba de referir, seria gravemente atentatório da boa-fé e equilíbrio das prestações manter o contrato em questão com exclusão de cláusulas essenciais para a validade do mesmo.

  22. Isto porque, o que se pretendeu com a cláusula em causa nos presentes autos foi definir a invalidez absoluta e definitiva por critérios diversos dos que definem invalidez total e permanente e poer critérios diversos dos que regem, por...

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