Acórdão nº 1122/14.6TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução25 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I- Relatório FA - FABRICANTE DE MOBILIÁRIO E REVESTIMENTOS, LDA, intentou a presente acção declarativa de condenação contra o BANCO A, S.A, formulando os seguintes pedidos: a) Por violação da LCCG, seja declarado nulo o contrato celebrado entre as partes, e por força do art. 289º do Código Civil, seja o réu condenado a restituir à autora a quantia de € 25.971,28, acrescida dos juros vencidos e vincendos à taxa moratória comercial, contados desde as datas em que a conta da autora foi debitada pelo réu, até efectivo e integral pagamento, mais devendo ser declarado que o réu nada mais pode exigir da autora por força do contrato SWAP aqui em causa; b) Subsidiariamente, caso assim não se entenda, deve o contrato de SWAP em causa ser anulado por erro sobre o objecto e dolo, devendo o réu ser condenado a restituir à autora aquela mesma quantia, nos mesmos termos, mais devendo ser declarado que o réu nada mais pode exigir da autora por força do contrato em causa; c) Ainda subsidiariamente, caso assim não se entenda, pede a condenação do réu a indemnizar a autora pelos prejuízos sofridos no montante acima indicado, por força da responsabilidade civil pré-contratual e violação dos deveres decorrentes do Código dos Valores Mobiliários (C.V.M.) referente ao contrato de SWAP aqui em causa, acrescido dos juros vencidos e vincendos à taxa moratória comercial, contados desde as datas em que a conta da autora foi debitada pelo réu, até efectivo e integral pagamento, mais devendo ser declarado que o réu nada mais pode exigir da autora por força do contrato swap.

Alega, em síntese, que celebrou com o Banco réu, em 29/9/2008 um contrato de SWAP de permuta de taxa de juro, tendo-lhe sido garantido que, face às constantes subidas do indexante Euribor, a operação financeira seria altamente vantajosa para a empresa. Sucedeu porém que a partir de Outubro de 2008, com a crise do subprime norte-americano e a falência do LB, as taxas de juros e, por consequência, o indexante Euribor, iniciaram uma longa descida, o que determinou que, entre 15 de Abril de 2009 e 17 de Outubro de 2011, em cumprimento do contrato em causa, tenha a autora pago ao réu a quantia de € 27.971,28, nada recebendo do mesmo. Acrescenta que, em face da referida descida das taxas de juro, o contrato se revelou estruturalmente desequilibrado e completamente desajustado.

Reclamou perante a ré, tendo-se esta recusado a resolver o contrato por mútuo acordo, optando a autora por cumprir o mesmo pois, caso o não fizesse, o réu comunicaria tal facto ao Banco de Portugal, pondo em risco a credibilidade da autora perante os outros bancos e clientes.

Considera assim a autora que o réu violou os deveres de informação e comunicação impostos pelo DL 446/85, de 25/10, atendendo à natureza das cláusulas constantes do contrato, nunca tendo o réu lido nem explicado as mesmas ao sócio-gerente da autora, o que determinará a exclusão das cláusulas do contrato celebrado e, por via da indeterminação insuprível que então ocorre, a nulidade total do contrato.

Mais aduz que a actuação que imputa ao réu, violando culposamente os deveres de informação, lealdade, de esclarecimento e de clareza, implica não só a violação do dever de boa-fé imposto pelo art. 227º do C.C., fazendo o réu incorrer em responsabilidade pré-contratual, como as normas do Código dos Valores Mobiliários aplicáveis a este tipo de contratos, o que, entende a autora, fulmina igualmente com a nulidade o contrato em causa, fazendo-a responsável pelos danos sofridos pela autora.

Contestou o réu, alegando, em síntese, que o sócio gerente da ré é um empresário experiente, conhecedor e sabedor dos produtos bancários, acompanhando com regularidade as notícias económicas e financeiras, sendo que a autora, à data da celebração do contrato em causa, mantinha contratos de mútuo e de crédito em conta corrente com o réu que implicavam a sua exposição à variação das taxas de juro, sendo com base nessa mesma exposição que o réu apresentou ao sócio-gerente da autora o SWAP de taxa de juro que veio a ser contratado. Acrescenta que foram prestados todos os esclarecimentos julgados necessários e solicitados pela autora, incluindo diferentes opções de contratação e simulações e informação sobre taxas de juros e sua evolução, tendo sido dado cumprimento às regras resultantes da transposição da Directiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros para o Direito Português (operada pelo D.L. 357-A/2007), classificando a autora como investidor não profissional e dando cumprimento aos deveres impostos pelos arts. 312º e 317º do C.V.M., tendo o réu formado a certeza de que a autora, por intermédio do respectivo sócio-gerente, se encontrava devidamente familiarizada com a natureza e riscos envolvidos na subscrição e detenção do produto contratado, tendo até alterado a autora, por sua iniciativa, o montante e prazo da operação, cumprindo, do mesmo modo, os deveres de comunicação e informação previstos pelos arts. 5º e 6º da LCCG.

Mais alega que, na execução do contrato, foram reciprocamente liquidados valores que ascenderam a final, ao montante de € 26.697,84, pago pela autora (diverso, portanto, do valor que a autora alega ter pago), sendo que a autora era sabedora e conhecedora de todos os riscos que o contrato comportava, tendo decidido corrê-los, tendo cumprido todo o contrato sem qualquer reclamação quanto aos valores liquidados no âmbito do mesmo.

Acrescenta ainda que a autora, aquando da celebração do contrato, sabia exactamente o que estava a contratar, inexistindo qualquer erro na formação da vontade. E ainda que se entendesse que teria ocorrido violação do dever de informação por parte do réu, ou existisse qualquer fundamento para dar as disposições contratuais em causa como nulas ou anuláveis, sempre se deveria considerar o exercício do direito correspondente, por parte da autora, como prefiguradora da excepção do abuso de direito, previsto no art. 334º do CC, na modalidade do «venire contra factum proprium», na medida em que vem agora a autora invocar vícios num contrato que manteve em execução, durante três anos, entre 2008 e 2011, cumprido pontualmente por ambas as partes.

Efectuada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo a ré do pedido.

Inconformada com esta decisão, a autora dela veio interpor recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo – arts. 627º; 629º,1; 631º; 637º; 638º,1,7; 639; 641º,1; 644º,1,a; 645º,1,a; e 647º,1, todos do CPC.

Termina as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões (transcrição): 1.

Por sentença datada de 28 de Março de 2017, julgou o douto Tribunal de Primeira Instância totalmente improcedente a acção intentada pela aqui recorrente, absolvendo a ré (aqui recorrida) dos pedidos formulados.

  1. Por discordar desta decisão, serve o presente recurso para tentar demonstrar que julgou mal o douto Tribunal ao entender que a recorrida cumpriu escrupulosamente com o seu dever de comunicação e informação, quando, na verdade, foram criadas objectivamente expectativas irrealistas, abstraídas de qualquer informação do risco - elevado risco.

  2. O contrato de swap trata-se de um instrumento financeiro, de elevado risco, contratado junto de um banco que lhe paga sempre que a indexante EURIBOR, neste caso, superar a percentagem da taxa estabelecida entre as partes.

  3. Os riscos surgem, pois, no momento em que se dá uma eventual descida dos juros, ou seja, quando a taxa de juro se fixa abaixo da percentagem fixada entre as partes.

  4. Uma vez perante a apreciação da validade de um contrato, começar-se-ia por apreciar se a ré cumpriu ou não os deveres de informação e de comunicação que lhe competiam, tanto mais num contrato de tal complexidade.

  5. Devia toda a informação sobre este produto, ter sido exposta ao cliente, bem como todos os riscos a ele inerentes. Acontece que, tal não se sucedeu.

  6. A recorrida defende-se de tal infirmando o facto de a recorrente já antes ter celebrado contrato semelhante com um outro banco, sendo que, por isso, havia já adquirido a informação necessária.

  7. Apesar de ter assinado num primeiro momento um contrato de swap com um outro banco que não a recorrida, a verdade é que a informação que terá reunido quanto a este contrato (a pouca e desacertada informação!) foi conseguida junto da recorrida.

  8. E, apesar de uma informação muito escassa, por toda a confiança que na recorrida depositava, bastou-se com ela.

  9. A celebração de ambos os contratos ocorreu em datas muito próximas. E, é claro que a experiência não se adquire num lapso de tempo de um mês, ou pouco mais. Questionando-se, assim, de onde adviria a experiência que o Tribunal entendeu que José detinha.

  10. Ainda assim, independentemente de existir esta “experiência”, nada obstaculizava ao dever de informação que à recorrida se impunha, devendo ter sido ao legal representante transmitida a informação exigível, em cada conversação que existiu entre ele e a recorrente, bem como aquando da reunião, onde, definitivamente, toda a informação inerente a este tipo de contrato deveria ter sido exposta de forma clara e inequívoca.

  11. Porém, perante o testemunho do próprio, compreende-se que essa exposição terá sido feita numa linguagem técnica, nada corrente. De difícil compreensão, ouse-se, para alguém sem conhecimento ou experiência alguma em actos deste calibre, que possui uma escolaridade apenas até ao sexto ano.

  12. Uma escolaridade que não lhe permite hoje atingir a dimensão de certos negócios, como aquele que realizou com a recorrida.

  13. Compreenda-se que, face uma exposição tão tecnicizada, até para quem hoje apresenta elevado grau académico, este tipo de contratos se revelam ardis, tendo o próprio Estado Português sido vítima dos contratos de gestão de risco financeiro.

  14. Tanto mais que essa exposição foi feita num tão curto tempo, que foi aquele que durou a reunião.

  15. Assim, porque indevidamente...

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