Acórdão nº 4761/15.4T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução20 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO Maria intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra António e Sofia, pedindo a condenação destes a: a) reconhecer a qualidade sucessória da Autora como herdeira legítima da herança de António; b) restituir a parte da herança de António à Autora e demais herdeiros, que se concretizará condenando os Réus a: b.1) parar as obras que estão a realizar no imóvel e abster-se de realização de outras obras; b.2) permitir a entrada no imóvel da Autora e a usufruir do mesmo; b.3) demolir as obras efectuadas, repondo o imóvel e muros no estado em que se encontravam antes da sua intervenção; b.4) consultar a Autora, na qualidade de herdeira, sobre as alterações que pretende efectuar no imóvel, bem como sobre o destino a dar ao mesmo; c) condenados em sanção pecuniária compulsória diária, nos termos do artº. 829º-A do Código Civil, nunca inferior a € 50 por cada dia de incumprimento do exposto em 15. e 19. da petição inicial.

Subsidiariamente, pede a condenação dos Réus a pagarem-lhe o valor de € 22,50/mês, em face da sua titularidade de 7,5% do imóvel, a título de indemnização pela ocupação do mesmo, desde Outubro de 2014 até desocupação ou partilha definitiva do mesmo, perfazendo, nesta data, o valor de € 225,00.

Para tanto, alega, em síntese, que a Autora e o 1º Réu são filhos e herdeiros de António e Manuela, sendo a 2ª Ré filha do 1º Réu.

No processo de inventário nº. 1978/10.1TBGMR, que correu termos na Comarca de Braga – Guimarães – Instância Local – J4, por óbito de Manuela, no estado de viúva, entre outros bens, foi relacionado sob a verba nº. 3, o prédio urbano identificado no artº. 4º da petição inicial.

Em audiência de tentativa de conciliação realizada em 24/10/2014, foi a referida verba rectificada para o direito à meação e à quota hereditária da inventariada Manuela na herança aberta por óbito de António, dado não ter ocorrido naqueles autos a cumulação de inventários dos dois falecidos e, consequentemente, a 2ª Ré, que tinha adquirido a propriedade do imóvel mediante escritura pública de compra e venda efectuada em 3/10/2013, com o despacho proferido no processo de inventário, viu tal aquisição reduzida ao referido direito, o mesmo se dizendo relativamente à inscrição de aquisição a favor da 2ª Ré no registo predial, o qual é inválido.

Refere, ainda, que apesar de ter sido notificada, em audiência de conferência de interessados, para o direito de anulação da aludida escritura, a 2ª Ré nada requereu.

Dado que o negócio mantém todos os requisitos substanciais e de forma, e as partes ainda mantém o interesse no mesmo (a inexistência de processo de anulação da escritura por parte da compradora e vendedores é sintomático desse sentimento), pode o mesmo ser convertido, nos termos do artº. 293º do Código Civil, em escritura de compra e venda do direito à meação e quota hereditária da inventariada na herança aberta por óbito de António.

Acontece que, desde finais de Outubro de 2014, na sequência da sentença proferida no processo de inventário e não obstante o despacho proferido, os 1º e 2º RR. ocuparam o imóvel da herança e aí realizaram obras, sem o conhecimento e autorização dos demais titulares do direito à herança, apesar de saberem que não eram titulares nem proprietários da totalidade do imóvel, e sem o devido licenciamento municipal (descriminando algumas dessas obras), não permitindo o acesso dos demais herdeiros ao mesmo.

A 2ª Ré apresentou contestação, alegando que o prédio em questão foi adquirido na sua plenitude pela Ré, mediante venda por negociação particular, não tendo a questão suscitada no inventário posto em causa a venda, que se manteve, cabendo o direito de anulação apenas à adquirente, ou seja, à aqui 2ª Ré, devendo apenas ser intentada uma acção de cumulação de inventários de António e Manuela, por forma a actualizar o estado do registo de aquisição do imóvel, que está provisório por dúvidas.

Refere, ainda, que pagou em termos totais o montante que apresentou na proposta de aquisição a que nenhum herdeiro se opôs, não tendo a 2ª Ré visto a sua posição de proprietária do imóvel ser reduzida a um mero direito de aquisição, o que significa que a A. não é titular de qualquer direito de propriedade ou outro sobre o imóvel em causa, nem qualquer outro herdeiro de António.

Acrescenta que se a A. não concordou com o despacho exarado pelo Tribunal (que manteve a venda, sem prejuízo do direito de anulação que poderá caber à adquirente), deveria aquela ter recorrido do mesmo e não se socorrer de uma nova acção.

Admite ter procedido à realização de obras no referido imóvel, mas sendo a 2ª Ré proprietária do mesmo, não tem que pedir autorização para a realização de quaisquer obras a pessoas que já tiveram a qualidade sucessória do imóvel, mas que presentemente não detêm.

Conclui, pugnando pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido, e pedindo a condenação da Autora como litigante de má-fé.

A A. apresentou resposta, mantendo a posição assumida na petição inicial e pugnando pela improcedência do pedido de condenação por litigância de má-fé.

Foi realizada a audiência prévia, com tentativa de conciliação.

A fim de se poder decidir sobre a validade do negócio, foi determinada a notificação da A. para apresentar petição inicial aperfeiçoada e chamar a juízo os restantes herdeiros interessados.

A Autora apresentou nova petição inicial contra: 1. António, 2. Sofia, 3. José, 4. Joaquim, 5. Francisco, pedindo, a final, que: a) se declare inválida e sem qualquer efeito, a escritura pública de compra e venda efectuada em 3/10/2013 e lavrada a fls. 135 a 136 do livro de escrituras diversas nº. 93-C, do Cartório Notarial de Carla, sito na … Caldas de Vizela; b) ser o negócio convertido, nos termos do artº. 293º do Código Civil, em escritura de compra e venda do direito à meação e quota hereditária da inventariada na herança aberta por óbito de António; c) se declare inválida e sem qualquer efeito, a inscrição de aquisição a favor da 2ª Ré efectuada na ficha do imóvel dos autos – ficha ... da freguesia de …, mormente a Ap. 2296 de 2013/11/05; d) serem os Réus condenados a reconhecer a qualidade sucessória da Autora como herdeira legítima da herança de António, ou seja, do referido imóvel; e) serem os 1º e 2º RR. condenados a restituir a parte da herança de António à Autora e demais herdeiros; f) serem os 1º e 2º RR. condenados a parar as obras que estão a realizar no imóvel e abster-se de realização de outras obras; g) serem os 1º e 2º RR. condenados a permitir a entrada no imóvel da herança da Autora e a usufruir do mesmo; h) serem os 1º e 2º RR. condenados a demolir as obras efectuadas, repondo o imóvel e muros no estado em que se encontravam antes da sua intervenção; i) serem os 1º e 2º RR. condenados a consultar a Autora, na qualidade de herdeira, sobre as alterações que pretendem efectuar no imóvel, bem como sobre o destino a dar ao mesmo; j) sejam condenados os 1º e 2º RR. em sanção pecuniária compulsória diária, nos termos do artº. 829º-A do Código Civil, nunca inferior a € 50 por cada dia de incumprimento do exposto em 16. a 20. da petição inicial; k) Subsidiariamente, sejam condenados os 1º e 2º RR. a pagar o valor de € 22,50/mês à Autora, em face da sua titularidade de 7,5% do imóvel, a título de indemnização pela ocupação do mesmo, desde Outubro de 2014 até desocupação ou partilha definitiva daquele, perfazendo, na data da apresentação da petição inicial, o valor de € 405,00.

A 2ª Ré reiterou a contestação apresentada, impugnando os factos alegados pela Autora.

Foi proferido despacho saneador no qual se procedeu ao saneamento da acção, verificando-se a validade e regularidade da instância.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo.

Após, foi proferida sentença que julgou a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os Réus dos pedidos.

Inconformada com tal decisão, a Autora dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 1 – O que está em causa no presente recurso é saber se a douta sentença recorrida julgou corretamente a questão subjacente aos autos e se os pedidos efetuados pela Autora na sua petição inicial, foram bem decididos ao terem sido julgados totalmente improcedentes.

2 - Salvo o devido respeito, que é muito, não se poderá concordar totalmente com o entendimento perfilhado pela Meritíssima Juiz a quo.

3 – NULIDADE DA SENTENÇA: Apesar do dispositivo somente constar a improcedência da acção, na fundamentação da mesma constam referências e menções várias que implicam a nulidade da sentença.

4 - Nomeadamente e em termos genéricos a sentença a quo considera que a Ré Sofia, ora Recorrida, é proprietária da totalidade do imóvel que era pertença dos pais da Autora. Tal consideração vai totalmente em contrário quer contra o ponto 8. dos factos dados como provados, bem como contra uma sentença já transitada em julgado.

5 - Mais, a sentença a quo efetua considerações de questões de que não podia apreciar, pois a Ré na sua contestação não deduziu qualquer pedido reconvencional no sentido de lhe ser reconhecida a propriedade do imóvel.

6 - Aliás, desde que no processo 1978/10.1TBGMR, na audiência de tentativa de conciliação realizada em 24/10/2014, foi tal verba retificada para o direito à meação e à quota hereditária da inventariada Manuela na herança aberta por óbito de António, que a Ré não fez qualquer diligência judicial no sentido de anular a escritura ou alegar a sua propriedade plena.

7 - Assim, tendo a referida decisão de retificação da verba transitado em julgado, a sentença a quo nunca poderia considerar que a Ré detém a propriedade plena sobre o imóvel, ou seja, verifica-se uma violação de uma sentença judicial e do princípio do caso julgado.

8 - Por outro lado, apesar da sentença considerar 10 factos como provados, a sentença a quo somente refere a...

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