Acórdão nº 154/15.1T8VFL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução17 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

P. F., melhor identificado nos autos, intentou acção de impugnação de escritura de justificação notarial contra J. M.

, também melhor identificado nos autos, peticionando: (a) que se considerem impugnados, para todos os efeitos legais, os factos justificados na escritura melhor identificada nos autos; (b) que se declare ineficaz e de nenhum efeito essa mesma escritura de justificação notarial, de forma que o réu não possa, através dela, registar qualquer direito sobre os prédios supra-descritos; e (c) que se declare o cancelamento de quaisquer registos operados com base no documento impugnado.

* Para tanto alega, em suma, que no dia 18/12/2014, no Cartório Notarial, foi outorgada uma escritura de justificação notarial para efeitos de registo de aquisição por usucapião, de um conjunto de oito prédios melhor identificados nos autos.

Que na referida escritura intervieram como primeiro outorgante o réu, e como segundos outorgantes F. S., F. C. e D. M., constando na mencionada escritura que o primeiro outorgante é possuidor, com exclusão de outrem, de diversos bens imóveis melhor identificados no documento complementar, pelo que os adquiriu por usucapião, confirmando os segundos outorgantes as declarações do primeiro.

No respeitante ao prédio n.º 567, a sua aquisição foi inscrita no Registo Predial a favor do réu em 19/02/2015, impugnando o autor os factos referidos na aludida escritura, alegando que o mesmo foi por si adquirido em 1991 e pelo Réu apenas em 2005.

No que respeita aos prédios n.º 514, 563, 659, 811, 1523, 757 e 1541, o autor alega serem falsos os factos constantes da aludida escritura referentes aos mesmos.

*O réu apresentou contestação, excecionando a legitimidade do A relativamente ao prédio inscrito na matriz rústica com o n.º 567, e impugnando a demais matéria de facto alegada.

Esclarece que negociou, por intermédio do seu pai J. F., a compra verbal dos prédios descritos na escritura de justificação notarial em causa, tendo sido o seu pai que o vem representando na gestão e administração dos mesmos, ou seja, que tem exercido os atos de posse sobre os prédios de que se arroga proprietário por intermédio do seu pai, pelo que os adquiriu por usucapião, sendo, por isso, seu legítimo proprietário.

Mais acrescenta que no prédio rústico com o nº 567 procedeu, em 2006, à plantação de uma vinha com a área de 2.250 m2, a qual tem cuidado e tratado até ao presente e cujo valor é claramente maior do que o valor do terreno anteriormente adquirido.

Com base nos factos alegados deduziu pedido reconvencional, pedindo que seja declarado judicialmente que adquiriu o direito de propriedade sobre o prédio rústico descrito na matriz predial com o nº 567, por usucapião e, subsidiariamente por acessão industrial imobiliária.

*O autor apresentou réplica, pugnando pela inadmissibilidade do pedido reconvencional deduzido, e impugnando, à cautela, os factos alegados pelo reconvinte, relacionados com esse pedido, pugnando pela sua improcedência.

*Foi proferido despacho saneador, no qual foi admitida a reconvenção e o autor considerado parte legítima na acção relativamente ao prédio nº 567 e parte ilegítima em relação aos demais.

*Tramitados regularmente os autos foi proferida a seguinte decisão: “…Termos em que o Tribunal decide: 1. Julgar procedentes os pedidos do autor e: a. (a) considerar impugnados, para todos os efeitos legais, os factos justificados na escritura melhor identificada nos autos; b. (b) declarar ineficaz e de nenhum efeito essa mesma escritura de justificação notarial de forma que o réu não possa, através dela, registar qualquer direito sobre o prédio inscrito na matriz predial da freguesia de (...) sob o artigo 567 e; c. (c) se declare o cancelamento de quaisquer registos operados com base no documento aqui impugnado; 2. Julgar procedente o pedido reconvencional (…) e declarar o réu proprietário do prédio rústico inscrito na matriz predial da freguesia de (...) sob o artigo 567.

Custas a cargo de autor e do réu, em partes iguais (art. 527º, n.º 2 do Cód de Proc Civil)…”.

*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio o autor interpor o presente recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1. O presente recurso incide, apenas e só, no segmento decisório que julgou procedente o primeiro pedido reconvencional formulado pelo ora Recorrido, e, consequentemente, o declarou proprietário do prédio rústico inscrito na matriz predial da freguesia de (...) sob o artigo 567, por usucapião e, ainda, nos factos referentes ao segundo pedido reconvencional formulado, não apreciado por se tratar de um pedido subsidiário.

  1. Por via do presente recurso pretende o ora Recorrente demonstrar que o Recorrido nunca poderia adquirir, por usucapião, a propriedade do prédio rústico inscrito na matriz predial da freguesia de (...) sob o artigo 567, na medida em que (1) não o adquiriu a A. F.; (2) não se provou que o seu pai, J. F., pessoa que adquiriu o prédio, o tenha depois doado ao Recorrido e, ainda que o tivesse feito, em que data tal doação ocorreu; (3) nunca o Recorrido praticou sobre o prédio os actos e fruição que materializam o corpus sobre o prédio; (4) a posse pública que conduz à aquisição da propriedade por usucapião nunca foi exercida pelo Recorrido, seja directamente, seja por interposta pessoa; (5) A vinha aí plantada e tratada pelo pai do Recorrido nem sequer lhe pertence, sendo titulada por S. G..

  2. Relativamente à aquisição do prédio em causa nos autos, deu o Tribunal como provado, nos pontos 10 e 20 dos factos que julgou provados que: “J. F. negociou a compra do prédio inscrito na matriz predial sob o artigo 567 entre outros com o A. F. para o seu filho, o réu J. M., em data não concretamente determinada, mas sita entre 1990 e 1994”(…); “J. F., progenitor do Réu (…) para quem (entenda-se para o R) negociou a aquisição do terreno” 4. Com a expressão negociar um terreno “para o seu filho” pretendia o Tribunal recorrido afirmar que J. F. negociou e adquiriu, verbalmente e em nome próprio, o prédio, embora o tenha feito com a intenção de posteriormente o transmitir para o seu filho, conforme se esclarece na sentença recorrida quando se afirma que “apenas se fez prova que o seu [entenda-se, do Recorrido] progenitor J. F. adquiriu verbalmente o prédio em nome próprio e com intenção de o transmitir para o réu (art. 874º do Cód Civil) na medida em que não resulta dos factos provados nenhuma relação de mandato ou de representação que permita imputar na esfera jurídica do réu a aquisição do dito prédio (…).

  3. No entanto, ainda que a sentença não o esclarecesse, a identidade do comprador do prédio resulta igualmente dos depoimentos dos únicos intervenientes no negócio: o próprio J. F. (comprador) e A. F. (vendedor), confirmando ambos que foi J. F. quem, em nome próprio, adquiriu o prédio, e não o Recorrido, representado pelo seu pai, J. F., conforme o mesmo alegou na sua contestação e reconvenção.

  4. No que diz respeito à intenção subjacente à compra do prédio em causa nos autos, a suposta intenção de doação ao ora Recorrido, A. F., limitou-se a confirmar que J. F., pai do Recorrido, lhe teria dito ser essa a sua intenção, desconhecendo, contudo, se a mesma se concretizou.

  5. ' No entanto, além de não alegada, também nenhum prova se fez da concretização da intenção de J. F. e, muito menos, se, tendo-se porventura materializado por via da doação ao ora Recorrido, quando é que esta ocorreu, de que é reflexo o facto de não terem sido vertidas nos factos provados.

  6. ' Quanto à intenção subjacente à pratica pelo pai do Recorrido dos actos de fruição do prédio, mesmo fazendo fé nos depoimentos, naturalmente interessados no desfecho da causa, na medida em que produzidos pelo pai e irmão do Recorrido, não haveria dúvidas de que J. F. tratou ou 'fabricou' o terreno com intenção de o dar ao seu filho, mas, uma vez mais, nenhuma prova se fez da concretização desta intenção, de que é reflexo a sua omissão nos factos provados.

  7. ' Assim, deve o ponto 10 dos factos considerados provados na sentença recorrida passar a ter o seguinte teor: 'J. F., em data não concretamente determinada mas sita entre 1990 e 1994, negociou e comprou o prédio inscrito na matriz predial sob o artigo 567, entre outros, a A. F. com intenção de o dar ao seu filho, o réu J. M..' 10.' Do mesmo modo e pelas mesmas razões, o segmento do ponto 20. supra transcrito deverá passar a ter o seguinte teor: “J. F., progenitor do Réu, realizou os actos descritos no ponto anterior com intenção de doar o terreno ao réu".

  8. Em suma, não se provou que a doação se tenha concretizado mas, apenas e só que a aquisição ocorreu tendo subjacente essa intenção e, in extremis, que tudo quanto foi feito no prédio por J. F. tinha subjacente essa intenção, que se desconhece se e quando foi concretizada. Aliás, a própria sentença recorrida assim o reconhece quando afirma que 'o Tribunal optou por introduzir nos factos provados a intenção com que J. F. fabricava' o terreno) fazendo-o no interesse do réu' 12.' Ainda relativamente à aquisição do prédio objecto dos presentes autos, tendo o Recorrido alegado na sua contestação que ele próprio, 'através do seu pai J. F.) negociou a compra dos prédios em causa aos anteriores possuidores) A. F. e J. G.' - facto de incontestável relevância e que constitui, aliás, o alicerce da sua defesa e resultando da sentença recorrida que não se provou 'que este o tivesse encarregado para esse efeito (entenda-se, que o Réu tivesse encarregado o seu pai, J. F., de negociar a compra dos terrenos em seu nome) e nem tão pouco se provou que o Réu 'tivesse atribuído poderes para esse efeito" ao seu pai, J. F., impõe-se verter nos factos não provados o seguinte facto: 'O réu, através do seu pai J. F., negociou a compra dos prédios em causa aos anteriores possuidores, A. F. e J. G.' 13. A propósito da vinha existente no prédio objecto dos presentes autos, alegou o Recorrido que 'procedeu à plantação de uma...

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