Acórdão nº 665/18 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução18 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 665/2018

Processo n.º 542/18

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. A. e outros vieram interpor recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), delimitando o objeto respetivo nos seguintes moldes:

«(…) a) no douto Acórdão proferido em 17 de maio de 2018 – do disposto nos artigos 152.º n.º 1 e 615.º n.º 1, al. d) do C.P.C. (ao não apreciar a questão de nulidade do Acórdão acima referido na al. b) por excesso de pronúncia, conforme lhe havia sido expressamente solicitado) e

b) no douto Acórdão proferido em 22 de março de 2018 – do disposto nos artigos 1257.º, 1255.º e 1292 e 303 do Código Civil e artigos 607.º n.º 4 e 635.º n.º 5 do C.P.C pelos motivos já avançados a quando da apresentação da Reclamação deste douto Acórdão.

A interpretação normativa que o Mª Tribunal “a quo” teve das disposições legais acima referidas na al. a) violou o artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa (principio da Constitucionalidade); os artigos 9.º al. b), 202.º n.º 1 e 2 e 205.º n.º 2 do mesmo diploma (Principio do Estado de Direito) e artigo 16.º n.º 2 (Principio da Interpretação em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem – designadamente os seus artigos 1.º, 7.º e 8.º).

Por sua vez, a interpretação normativa que o Mº Tribunal “a quo” teve das disposições legais acima indicadas na al. b) violou o disposto nos mesmos artigos e princípios constitucionais acima indicados e ainda o Principio de Intangibilidade do Caso Julgado Parcial (pelos mesmos abrangido) que aqui se dão como reproduzidos e integrados para os devidos efeitos. (…)».

2. No Tribunal Constitucional, foi proferida a Decisão Sumária n.º 697/2018, que não conheceu do objeto do recurso, com a seguinte fundamentação:

4. O Tribunal Constitucional tem entendido, de modo reiterado e uniforme, serem requisitos cumulativos do recurso, previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, a existência de um objeto normativo – norma ou interpretação normativa – como alvo da apreciação; o esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC); a aplicação da norma como ratio decidendi da decisão recorrida; a suscitação prévia da questão de constitucionalidade normativa, de modo processualmente adequado e tempestivo [artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa e artigo 72.º, n.º 2, da LTC].

Vejamos se tais pressupostos de admissibilidade do recurso se encontram preenchidos in casu.

5. Os recorrentes indicam, no requerimento de interposição de recurso, como primeira questão integrante do respetivo objeto, a «interpretação normativa inconstitucional» do disposto nos «artigos 152.º n.º 1 e 615.º n.º 1, al. d) do C.P.C. (ao não apreciar a questão de nulidade do Acórdão acima referido na al. b) por excesso de pronúncia, conforme lhe havia sido expressamente solicitado)», referindo que, quanto a esta questão, a decisão recorrida corresponde ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de maio de 2018, que apreciou pedido de arguição de nulidades, erros de julgamento e inconstitucionalidades, deduzido relativamente ao acórdão do mesmo tribunal de 22 de março de 2018.

Ora, resulta, à evidência, que tal formulação não se traduz na enunciação de um critério normativo que se afigure como objeto idóneo do recurso de constitucionalidade.

Com efeito, o Tribunal Constitucional apenas pode sindicar a constitucionalidade de normas ou interpretações normativas, estando-lhe subtraída a reapreciação de juízos subsuntivos. Assim, impende sobre cada recorrente o ónus de enunciar uma norma ou interpretação normativa, reportando-a, de forma certeira, a uma concreta disposição ou conjugação de disposições legais, em cuja literalidade o critério normativo enunciado encontre um mínimo de correspondência. Acresce que a enunciação deverá ser feita em termos tais que, caso o Tribunal Constitucional venha a formular um juízo de inconstitucionalidade, possa limitar-se a reproduzi-la, para garantir que os destinatários da decisão e os restantes operadores do direito em geral fiquem cientes do específico sentido julgado constitucionalmente desconforme (cfr. Acórdão n.º 367/94, disponível em www.tribunalconstitucional.pt, bem como os demais arestos deste Tribunal adiante citados).

No caso dos autos, os recorrentes, em vez de selecionarem um objeto do recurso que se revista de verdadeira natureza normativa, manifestam a pretensão de que este Tribunal proceda à reapreciação do concreto ato de julgamento, na sua vertente de ponderação casuística e subsequente subsunção jurídica, desde logo, aferindo se se incorreu em omissão de pronúncia relativamente a questão alegadamente colocada à apreciação do tribunal a quo. Todavia, tal matéria, por contender com o mérito da decisão recorrida, encontra-se, legal e constitucionalmente, subtraída à esfera de competências deste Tribunal, porquanto respeita exclusivamente ao labor dos tribunais comuns. A este propósito, pode ler-se, no Acórdão n.º 633/08, o seguinte:

«(…) cumpre acentuar que, sendo o objeto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade constituído por normas jurídicas, que violem preceitos ou princípios constitucionais, não pode sindicar-se, no recurso de constitucionalidade, a decisão judicial em si própria, mesmo quando esta faça aplicação direta de preceitos ou princípios constitucionais, quer no que importa à correção, no plano do direito infraconstitucional, da interpretação normativa a que a mesma chegou, quer no que tange à forma como o critério normativo previamente determinado foi aplicado às circunstâncias específicas do caso concreto (correção do juízo subsuntivo).

Deste modo, é sempre forçoso que, no âmbito dos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional, se questione a (in)constitucionalidade de normas, não sendo, assim, admissíveis os recursos que, ao jeito da Verfassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo espanhol, sindiquem, sub species constitutionis, a concreta aplicação do direito efetuada pelos demais tribunais, em termos de se assacar ao ato judicial de “aplicação” a violação (direta) dos parâmetros jurídico-constitucionais. Ou seja, não cabe a este Tribunal apurar e sindicar a bondade e o mérito do julgamento efetuado in concreto pelo tribunal a quo. A intervenção do Tribunal Constitucional não incide sobre a correção jurídica do concreto julgamento, mas apenas sobre a conformidade constitucional das normas aplicadas pela decisão recorrida (…)».

Pelo exposto, demonstrada a inidoneidade do objeto do recurso, conclui-se, nesta parte, pela respetiva inadmissibilidade.

Sempre se dirá que a conclusão no sentido da inadmissibilidade do recurso interposto igualmente se imporia com fundamento no incumprimento do ónus da suscitação prévia de uma questão de constitucionalidade de natureza normativa. Na verdade, atento o disposto no artigo 72.º, n.º 2, da LTC, impunha-se que a questão de constitucionalidade que se pretendesse ver apreciada nesta instância tivesse sido apresentada em momento processual prévio à prolação da decisão recorrida, junto do tribunal a quo, mediante a identificação, de uma forma expressa, direta e clara, do critério normativo sindicado, reportando-o ao específico segmento legal ou conjugação de segmentos legais de que o mesmo seria extraível, assim criando para esse tribunal um dever de pronúncia sobre tal matéria.

Não obstante os recorrentes invocarem que a interpretação adotada pelo acórdão recorrido é «de todo imprevisível, inesperada e inimaginável», pretendendo com tal alegação que se reconheça que os mesmos estavam desonerados do cumprimento do pressuposto da suscitação prévia, previsto no aludido artigo 72.º, n.º 2, da LTC, a verdade é que, por um lado, o tribunal a quo não convocou sequer a...

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