Acórdão nº 31/19 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Janeiro de 2019

Data09 Janeiro 2019
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 31/2019

Processo n.º 719/18

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., notificado da Decisão Sumária n.º 749/2018, que não conheceu do objeto do recurso de constitucionalidade por si interposto, vem reclamar para a conferência ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – “LTC”).

Conforme relatado na referida Decisão Sumária, o reclamante, recorrente nos presentes autos, em que é recorrido o Ministério Público, foi condenado, por acórdão transitado em julgado, na pena de 9 anos de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, com referência à Tabela I-B, do Decreto-lei n.º 15/93, de 22-01. Em tal acórdão foi ainda julgado parcialmente procedente o incidente de perda ampliada de bens, deduzido pelo Ministério Público contra o arguido, ora recorrente, e, para efeitos do disposto no artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 5/2002, de 11-01, foi declarada perdida a favor do Estado a quantia de €170.402,40, condenando-se o arguido a pagar tal quantia ao Estado, mais se determinando a manutenção do arresto dos bens já decretado.

Por despacho de 18 de janeiro de 2018 (cf. fls. 78-79), foi determinado o cumprimento do disposto no artigo 12.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11-01, notificando-se o arguido para, em dez dias, proceder ao pagamento daquela quantia.

O arguido veio requerer a autorização do pagamento da mencionada quantia no prazo de dois anos, em prestações mensais, o que foi indeferido, por despacho de 6 de fevereiro de 2018, por falta de fundamento legal.

Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que, por acórdão de 30 de maio de 2018, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida. Deste acórdão recorreu o ora reclamante para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal, foi o recorrente convidado, por despacho do relator, a clarificar qual a norma ou normas objeto do presente recurso, bem como a indicar a peça processual em que suscitou a questão ou questões de constitucionalidade que pretende submeter à apreciação deste Tribunal. O recorrentes respondeu no sentido de pretender a apreciação da inconstitucionalidade da norma constante do artigo 12.º, n.º 3, da Lei 5/2002, de 11/1, «quando interpretada com o sentido da impossibilidade da prorrogação do prazo de 10 dias para proceder ao pagamento de uma quantia avultada (no caso 170.400,00 euros), quando lhe seja requerido pelo devedor e sem atender aos motivos invocados» e que esta inconstitucionalidade foi suscitada no recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto.

2. É a seguinte a fundamentação da decisão sumária ora reclamada:

«5. No requerimento de interposição de recurso, o recorrente refere que «suscitou a inconstitucionalidade de várias normas jurídicas, quando aplicadas com uma certa interpretação», concretizando que suscitou a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 12.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, interpretada «com o sentido de que após o trânsito em julgado de uma decisão penal em que se discute a responsabilidade penal e civil (perda ampliada de bens), se imponha ao condenado o pagamento de uma indemnização de um montante avultado (€170.402,40) no prazo improrrogável de 10 dias».

Na resposta ao despacho-convite (cf. ponto 1., supra), o recorrente veio esclarecer que apenas pretende ver sindicada a inconstitucionalidade da referida norma do artigo 12.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, «quando interpretada com o sentido da impossibilidade da prorrogação do prazo de dez dias para proceder ao pagamento de uma quantia avultada (no caso 170.400,00 euros), quando lhe seja requerido pelo devedor e sem atender aos motivos invocados».

Conforme resulta do exposto, o recorrente aproveitou o referido convite para “reformular” a interpretação normativa da norma do artigo 12.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, que havia indicado como objeto do recurso.

Sem prejuízo de, na sequência do convite efetuado, não ser consentido ao recorrente alterar o objeto inicial do recurso, reformulando-o, a verdade é que a questão de constitucionalidade que aquele pretende ver sindicada, seja na formulação que fez constar do requerimento de interposição de recurso, seja na formulação enunciada no requerimento de resposta ao convite, não foi adequadamente suscitada perante o tribunal a quo.

Com efeito, no recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, o recorrente suscitou a questão de constitucionalidade da seguinte forma: «uma interpretação da norma constante do 12º, nº 3 da Lei 5/2002, de 11/1 que imponha o pagamento da quantia pela qual o arguido foi condenado (170.400 euros) e não atenda ao montante dos bens arrestados e, ainda, os declare perdidos a favor do Estado, pelo não pagamento no prazo improrrogável de dez dias, inquina de inconstitucionalidade material a referida norma» (cf. conclusão 8. das alegações de recurso, a fls. 94).

Ao suscitar tal questão, o recorrente enunciou uma interpretação da aludia norma em que destaca três aspetos: em primeiro lugar, a imposição do «pagamento da quantia pela qual o arguido foi condenado», em segundo lugar, a circunstância de não se atender «ao montante dos bens arrestados» e, finalmente, ao facto de tais bens serem declarados perdidos em favor do Estado no caso de «não pagamento [da aludida quantia] no prazo improrrogável de dez dias».

Já no requerimento de interposição de recurso, a interpretação da norma questionada pelo recorrente reporta-se ao facto de, «no prazo improrrogável de dez dias» após o trânsito em julgado de uma decisão condenatória, se impor «ao condenado o pagamento de uma indemnização de um montante avultado (€170.402,40)».

Ora, é manifesta a inexistência de coincidência entre a interpretação normativa cuja inconstitucionalidade foi suscitada perante o tribunal a quo e aquela que o recorrente fez constar no seu requerimento de recurso (e que constitui o seu objeto).

Aliás, mesmo que se admitisse a possibilidade de alteração da dimensão normativa questionada, na sequência do convite efetuado, é também evidente a aludida falta de coincidência. Com efeito, na resposta ao despacho-convite, o recorrente formula uma interpretação da norma em que questiona a «impossibilidade da prorrogação do prazo de dez dias para proceder ao pagamento de uma quantia avultada (no caso 170.400,00 euros)», realçando a circunstância de ter sido requerida a prorrogação do prazo («quando lhe seja requerido pelo devedor») e de terem sido invocados motivos para o efeito, que foram...

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