Acórdão nº 10776/15.5T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | HENRIQUE ARAÚJO |
Data da Resolução | 19 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
PROC. N.º 10776/15.5T8PRT.P1. S1 REL. 65[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO A Massa Insolvente da sociedade “AA, Lda.”, propôs acção sob a forma de processo comum contra BB, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de 440.976,68 €, acrescida de juros desde a data de instauração da acção até efectivo pagamento.
Para fundamentar a sua pretensão alegou factos praticados pelo Réu, lesivos dos interesses da sociedade em causa, de que era sócio e gerente, com violação do disposto nos artigos 35º, 78º, 213º e 523º do Código das Sociedades Comerciais.
Na contestação, o Réu pediu a improcedência da acção.
Realizou-se o julgamento e foi proferida decisão que julgou parcialmente procedente acção e condenou o Réu a pagar à Autora a quantia de 315.000,00 €, acrescida de juros à taxa legal de 4% até efectivo pagamento, perfazendo os vencidos, em 30 de Abril de 2015, a quantia de 125.033,00 €.
Não se conformando com o assim decidido, interpôs o Réu recurso de apelação.
No entanto, a Relação do Porto, por acórdão de 13.07.2018, rejeitou o recurso por falta de conclusões.
Recorre o Réu, agora, para o STJ, rematando as alegações de revista da seguinte forma: 1. Vem o presente recurso interposto do acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto que rejeitou o recurso de apelação apresentado pelo recorrente, com fundamento no artigo 641º, n.º 2, do CPC.
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Entendeu aquele Tribunal da Relação que as conclusões apresentadas pelo recorrente constituíam reprodução da motivação integrante de tal recurso e, por tal motivo, considerou haver falta de conclusões.
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Tal interpretação viola, de forma evidente e grosseira, a lei processual aplicável e bem assim os mais elementares princípios do acesso ao Direito, do contraditório e da cooperação.
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As conclusões apresentadas no aludido recurso encontram-se formuladas de acordo com os preceitos normativos aplicáveis, pelo que o recurso em causa deveria ter sido admitido e conhecido pelo Tribunal da Relação.
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As conclusões em causa são claras e inteligíveis, correspondendo a uma versão mais sintética do segmento da motivação apresentado.
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De resto, apesar de as conclusões terem, necessariamente, a mesma estrutura, o recorrente eliminou as partes que considerou não serem essenciais ao conhecimento do recurso, bem como alterou e sintetizou as ideias constantes da motivação.
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O que se reflecte, desde logo, no facto de a motivação ocupar 29 páginas e meia e conter 82 parágrafos e as conclusões ocuparem 13 páginas e meia e constarem de 54 parágrafos.
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Tratando-se de um recurso da matéria de facto, revelava-se essencial a inclusão de parte dos excertos dos depoimentos das testemunhas inquiridas.
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O recorrente eliminou e reduziu tais excertos aos essenciais à percepção das questões colocadas ao tribunal e das respostas que o recorrente considera terem resultado do julgamento efectuado.
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As conclusões definem e delimitam o âmbito do recurso, não se bastando por uma impugnação e discordância vaga e generalizada da decisão recorrida.
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Impunha-se a admissão e o conhecimento do recurso apresentado, porquanto as conclusões vertidas são claras, perceptíveis e inteligíveis, nomeadamente no seguimento da unânime jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça existente sobre a matéria.
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Caso assim o Tribunal da Relação não entendesse – como não entendeu – sempre se imporia a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões, ao abrigo do artigo 639º, n.º 3, do CPC, bem como do artigo 3º, n.º 3, o que, igualmente, não sucedeu.
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Dispõe tal artigo que “quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de 5 dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afectada”.
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Nos termos da própria definição de ‘conclusões complexas’ defendida pelo Tribunal da Relação no acórdão em crise – extensas e prolixas –, impunha-se a notificação do recorrente para proceder ao seu aperfeiçoamento.
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Ademais, não podem tais conclusões, por motivos óbvios e evidentes, ser consideradas ausência de apresentação de conclusões, já que consubstanciam em si, necessariamente, conclusões, no termo literal do conceito para os efeitos da lei.
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Pelo que, padecendo as conclusões de qualquer deficiência ou irregularidade, sempre se impunha a notificação do recorrente para o seu aperfeiçoamento.
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Conforme, de resto, é posição unânime deste Supremo Tribunal de Justiça.
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Impõe-se a revogação do acórdão proferido e, em consequência, a remessa dos presentes autos ao Tribunal da Relação para que este conheça o recurso apresentado, ou, caso assim se não entenda, profira despacho que convide o recorrente a apresentar novas conclusões, ou a aperfeiçoar as apresentadas, em 5 dias, o que expressamente se requer.
Não houve contra-alegações.
* Sendo o recurso balizado pelas conclusões do recorrente, a única questão a conhecer é a de saber se a apelação não devia ter sido rejeitada por falta de conclusões.
* II. FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:
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Por sentença datada de 10 de Janeiro de 2013, transitada em julgado em 31 de Janeiro de 2013, a sociedade “AA, Lda.”, foi declarada insolvente.
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O Réu era, à data da insolvência e desde 31 de Dezembro de 1985, sócio gerente da referida sociedade, juntamente com a sua mulher CC, com quem era casado em comunhão de adquiridos.
C) O Réu detinha uma quota de 150.000,00 € e a sua mulher uma quota de 100.000,00 €, sendo o capital social de 250.000,00 € e obrigando-se a sociedade com a assinatura de qualquer um deles.
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Na sequência da declaração de insolvência da sociedade “AA, Lda.”, foi nomeado administrador da insolvência DD.
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A “EE, Lda.”, realizou obras num prédio sito na Rua …l, … a …, ..., o qual está registado em nome do Réu e das suas filhas.
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Entre 1 de Janeiro de 2015 e 31 de Dezembro de 2015 foram feitos pagamentos pela sociedade “AA, Lda.”, sem suporte documental, de 50.000,00 € cada, em 31 de Janeiro de 2005, 28 de Fevereiro de 2005 e 31 de Março de 2005, e um de 15.700,00 € em 30 de Abril de 2005, num total de 165.700,00 €, que se destinaram a pagar as obras referidas em E).
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Em 2004, a ora insolvente sociedade “AA, Lda.”, apresentava resultados transitados acumulados negativos de 45.606,29 € e, em 2005, atingiu resultados de exercício negativos de 108.409,57 € … H) … Tendo as dívidas totais aos credores aumentado de 922.994,40 €, em 2004, para 1.234.844,66 €, em 2005.
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A ora insolvente sociedade “AA, Lda.”, quer no balancete geral de 31 de Dezembro de 2012, quer nas contas apresentadas pelo Técnico Oficial de Contas e pela gerência em 31 de Dezembro de 2005, não dispunha de qualquer imóvel no imobilizado nem obras em curso.
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Da contabilidade da ora insolvente resulta que foi movimentada na Conta da Caixa, em 31 de Maio de 2005, a saída de dinheiro, através de transferência, no montante de 150.000,00 €, saída de dinheiro essa que foi registada como contrapartida da conta Prestações Suplementares – J. Figueiredo, anulando-se dessa forma o saldo existente nessa conta, o qual passou a ser zero… K) … Tal operação reduziu os capitais próprios ou a situação líquida da ora insolvente a 103.276,98 €, equivalentes a 41% do capital da “AA, Lda.”, com as reservas legais a cifrarem-se em 6.286,06 €.
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Após a efectivação das obras referidas em E), a “AA, Lda.”, passou a exercer a sua actividade nesse prédio, não pagando renda.
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Pela apresentação 173 de 7 de Setembro de 2009 mostra-se registada na Conservatória do Registo Comercial a constituição da sociedade “FF, Lda.”, dos quais são sócios o réu e as suas duas filhas, tendo sede na mesma morada onde foram efectuadas as obras referidas em E).
O DIREITO O recurso é um acto processual postulativo, porquanto a sua eficácia está dependente de um juízo de procedência sobre o pedido de revogação de uma determinada decisão judicial[2]. Esse pedido baseia-se numa argumentação jurídica orientada no sentido de contrariar as razões adoptadas na decisão impugnada, sendo obrigatoriamente sintetizada na parte final das alegações de recurso, numa fórmula que se deseja clara e que identifique, de forma criteriosa e objectiva, os fundamentos constantes do corpo das alegações. O cumprimento deste ónus por parte do recorrente é muito importante, não só para o tribunal de recurso, que fica devidamente esclarecido quanto à matéria sobre que terá de pronunciar-se, mas também para a viabilização do exercício do contraditório pela parte contrária.
Infelizmente, são muitíssimo frequentes as situações em que esse ónus, a cargo do recorrente, é incumprido ou deficientemente cumprido.
O caso dos autos é, como veremos, um bom exemplo do que acabámos de dizer.
Em reacção à decisão da 1ª instância, o Réu apresentou recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, estendendo as alegações do recurso de apelação por 29 páginas (fls. 329 a 358) e reservando 15 páginas para as 54 conclusões (fls. 358 a 372).
Na parte final das alegações escreveu as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da sentença que decidiu julgar a acção “parcialmente procedente e condeno[ar] o réu a pagar à autora a quantia de 315.000,00 euros acrescidos de juros à taxa supletiva legal de 4% até efectivo pagamento, perfazendo os vencidos em 30.04.2015 a quantia de 125.033,00 euros”.
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A matéria de facto foi incorrectamente julgada, pois que considerou o Tribunal a quo não provados factos que resultaram provados, tendo havido uma errada apreciação e valoração da prova.
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O Tribunal a quo não deu como provado, nomeadamente o acordo existente entre a AA e o Réu de que, como contrapartida do pagamento das obras do imóvel em causa por parte da AA, esta ficaria dispensada do pagamento de qualquer renda.
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Bem como ignorou os seguintes factos, instrumentais daqueloutro, e que se impunha...
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