Acórdão nº 5543/16.1T8STB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelBERNARDO DOMINGOS
Data da Resolução06 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL * Relatório O Banco AA, S.A., intentou contra os RR., BB, CC, DD e EE, a presente acção, por via da qual pretende fazer operar a impugnação pauliana, decretando-se a ineficácia, em relação a si, da doação efetuada pelos 1.º e 2.ª RR aos 3.ª e 4.º RR dos imóveis descritos na p.i., podendo o A executar os referidos bens no património dos 3.ª e 4.º R na medida em que tal seja necessário para obter o pagamento integral do seu crédito e praticar atos de conservação de garantia patrimonial.

Instruída a causa, procedeu-se à audiência de julgamento e de seguida foi proferida sentença onde se julgou improcedente a acção se se absolveram os RR., do pedido.

Inconformado, apelou o A., tendo o Tribunal da Relação de …, decidido pela « … total procedência do recurso, em consequência do que revoga a decisão recorrida, declarando a ineficácia em relação ao A da doação realizada entre os RR, reconhecendo-se o direito do A. executar os bens imóveis objeto de doação enunciados no n.º 10 dos factos provados no património dos 3.ª e 4.º RR e dos bens imóveis enunciados no n.º 11 dos factos provados no património do 4.ª R na medida do que se mostrar necessário para integral satisfação do seu crédito ainda em dívida».

Irresignados com esta deliberação, vieram os RR. Interpor recurso de revista, tendo rematado as suas alegações com as seguintes Conclusões: « A. O tribunal conhece dos factos através das provas produzidas no processo.

B. As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos, conforme preceitua o artigo 341° do Código Civil.

  1. Cada uma das partes, tem o encargo de provar os factos de que depende a aplicação das normas que lhe são favoráveis, conforme artigo 342°, n°s 1 e 2, do Código Civil.

  2. Assim, impende sobre o autor o ónus da prova dos factos constitutivos do direito subjacente ao pedido, E. Que no caso sub judice seria "ser o credito anterior ao ato", e, F. Sem prejuízo de a Autora nada ter alegado quanto a esta matéria, G. "Sendo o crédito posterior, ter sido o ato realizado dolosamente (...)".

  3. A impugnação pauliana constitui, como se sabe, um meio de conservação da garantia geral do cumprimento de obrigações, com ela se tutelando o interesse dos credores contra o desvio do património pelo devedor que implique obstáculo absoluto à satisfação dos seus créditos ou o seu agravamento.

    I. Os pressupostos da impugnação pauliana são: a existência de um crédito; a prática, pelo devedor, de um ato que não seja de natureza pessoal, que provoque, para o credor um prejuízo (a impossibilidade de obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade); a anterioridade do crédito relativamente ao ato ou, se o crédito for posterior, ter sido o ato dolosamente praticado com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor; que o ato seja de natureza gratuita ou, sendo oneroso, que o devedor e o terceiro tenham agido de má fé (arts. 610.° a 612.° do CC).

  4. No que concerne ao ónus de prova, cabe ao credor a prova do montante do crédito que tem contra o devedor, da anterioridade dele em relação ao ato impugnado (611° do Código Civil).

  5. Como dá conta a matéria de facto, o direito de crédito da Recorrida advém de aval prestado em 10 de Agosto de 2012, sendo as doações de 08 de Agosto de 2012, L. Ou seja, são anteriores à data de emissão / subscrição da livrança em causa, anterior ao direito de crédito da ora Recorrida.

  6. No que diz respeito ao dolo das doações efetuadas, e sem prejuízo do Tribunal da 1.

    a Instancia, ter dado como provado que as mesmas foram realizadas com o intuito de diminuir as garantias patrimoniais da Recorrida, N. Tal facto não importa de per si, que a doação foi realizada dolosamente, ou /i que é dolosa.

  7. O dolo, como vício da vontade, consiste na noção de erro, em qualquer das suas modalidades, isto é, quer se refira à pessoa do declaratório, ao objecto do negócio (artigo 251°) ou aos motivos não referentes à pessoa do declaratário nem ao objeto do negócio (artigo 252°), P. Desde que provocado, e traduz-se sempre numa representação inexata ou na ignorância de uma qualquer circunstância de facto ou de direito que foi determinante na decisão de efetuar o negócio, em termos tais que, se o declarante tivesse sido esclarecido ou o tivesse conhecido, não teria realizado o negócio ou não o teria realizado nos mesmos termos.

  8. Segundo o n° 1 do artigo 253° do citado diploma, "Entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante".

  9. "O declarante cuja vontade tenha sido determinada por dolo pode anular a declaração" - artigo 254°, n° 1, acima referido.

  10. Temos, assim, que o primeiro dos elementos do conceito de dolo, como vício da vontade, consiste na noção de erro, em qualquer das suas modalidades, isto é, quer se refira à pessoa do declaratário, ao objeto do negócio (artigo 251°) ou aos motivos não referentes à pessoa do declaratário nem ao objeto do negócio (252°), desde que provocado, e traduz-se sempre numa representação inexata ou na ignorância de uma qualquer circunstância de facto ou de direito que foi determinante na decisão de efetuar o negócio, em termos tais que, se o declarante tivesse sido esclarecido ou o tivesse conhecido, não teria realizado o negócio ou não o teria realizado nos mesmos termos - Mota Pinto, in "Teoria Geral do Direito Civil", 3a edição. Páginas 505 e 506.

  11. No caso sub judice, reitera-se, nada foi alegado e/ou provado, pela Recorrente que denote uma atuação dolosa, dos RR., ora Recorrentes na realização desse intuito.

  12. NADA foi trazido aos autos, em ordem a suportar o dolo da doação efetuada.

    V. Os atos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:, W. Ser o credito anterior ao ato ou, sendo posterior, ter sido o ato realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor, X, Resultar do ato a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu credito, ou o agravamento dessa impossibilidade.

  13. Ora, nos presentes autos, ficou apenas provado, que do ato impugnado resultou, a impossibilidade de o A. obter a satisfação ainda que parcial do seu crédito, e que o mesmo foi realizado com o intuito de diminuir as garantias patrimoniais do A..

  14. Não se encontrando provado que o ato impugnado foi realizado dolosamente, não se verificam os requisitos e as circunstancias exigidas para a impugnação pauliana, preceituadas no artigo 610.° do C.C., AA. Não podendo desta feita a doação ser impugnada conforme pretende a A., ora Recorrida.

    NESTES TERMOS, E nos melhores de Direito, e sempre com o douto suprimento dos Venerandos Juízes Conselheiros, deve o presente recurso, ser julgado procedente, mantendo-se a douta Sentença proferida pelo Tribunal de 1.

    a Instancia.

    * Respondeu o A., pedindo a improcedência da revista.

    ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT