Acórdão nº 17363/15.6T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução13 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I M, intentou declarativa comum, contra a S, SA, pedindo a anulação da deliberação social de 28 de Maio de 2015, que teve por conteúdo a aprovação das contas da sociedade relativas ao exercício findo em 31 de Dezembro de 2014.

Alega para o efeito que tendo aquela assembleia geral como ordem de trabalhos, entre o mais, a aprovação do Relatório de Gestão, Balanço e demais documentos de prestação de contas relativos ao exercício de 2014, na verificação que fez dos elementos de prestação de contas que a Ré pôs à sua disposição, verificou que o sector de actividade especificado como “Casa X” é intencional e cronicamente deficitário, pois que o uso desse imóvel está reservado aos accionistas da Ré em fins de semana pré-determinados, de acordo com a participação que cada um detém no capital social da mesma, sendo o custo efectivo dessa fruição por fim de semana muito superior ao de cerca de 450 € que é imputado aos accionistas-utentes. Refere ainda que o custo de exploração do dito imóvel não foi contabilizado na “A, Lda” participada quase a 100% da Ré e a quem foi cometida a gestão da “Casa X”, estando em causa custos que não serão menores do que os relativos a 2012, que ascenderam a € 67.646,00, sendo que são alocadas a esta sociedade “A” as receitas dos fins de semana, mas à Ré a grande maioria dos custos que essa actividade determinou.

Acresce que na assembleia geral em causa não esteve presente o Fiscal Único e Revisor Oficial de Contas da Ré, o que impediu a Autora, através do seu representante, de exercer o direito que lhe é atribuído pelo artigo 290º, nº3 do CSComerciais, acabando a Autora, através do seu representante, por ter votado contra a aprovação das contas em referência.

Entende que a deliberação em crise é anulável, porque as contas aprovadas em função dela não respeitaram o comando do artigo 980º do CCivil.

A Ré contestou, referindo ser proprietária da “Casa X”, que é detida pela família Lopo de Carvalho desde 1918, e que, desde tal data, sempre houve consenso dos accionistas em manter tal imóvel como referência de marca e imagem da Ré e das suas participadas, reservando a sua utilização apenas para os accionistas e para a promoção dos negócios e produtos comercializados pela Ré e pela sua participada Q, Vinhos (QV). Assim, foi decidido que a gestão/administração da “Casa X” fosse efectuada pela participada da Ré Al, Lda, que ficou encarregada de organizar e gerir a utilização do referido imóvel em conformidade com a premissa de não ser a mesma aberta ao público em geral. Sendo a sua utilização apenas permitida para a organização de eventos (almoços, jantares, cocktails e provas de vinhos) de promoção dos produtos comercializados pela Ré e pela sua participada, QV, e aos accionistas da Ré aos fins de semana, mediante o pagamento de um valor, que actualmente, em média, se cifra em € 450,00. As receitas geradas pelas referidas utilizações revertem a favor da A, que suporta algumas despesas inerentes a tal utilização (interior e exterior do imóvel), mantendo-se as principais despesas inerentes à sua conservação e manutenção na esfera da Ré, por ser a sua proprietária. A autonomização contabilística das despesas e receitas da “Casa X” visa permitir uma melhor organização da gestão do grupo empresarial liderado pela Ré, permitindo à gestão um conhecimento mais rigoroso do resultado directo e indirecto de todas as unidades de negócio, facilitando a análise das contas e resultados das efectivas áreas de negócio e a tomada de decisão no dia-a-dia. A “Casa X”, enquanto imagem de marca dos produtos comercializados pela Ré e suas participadas, contribui de forma indirecta para a obtenção dos resultados gerados pelas mesmas. A Ré e as suas duas participadas, encontram-se em regime de consolidação de contas. Lembra que a propriedade de qualquer imóvel que não esteja afecto a exploração comercial, como é o caso da “Casa X”, gera despesas sem directa contrapartida do foro financeiro, mas com outras contrapartidas, no caso concreto desde logo traduzidas na imagem de marca dos produtos comercializados pela Ré e pela sua participada QV, e que contribui significativamente para os resultados positivos auferidos pelo grupo empresarial liderado pela Ré. Frisa que a Autora conhece, ao pormenor, todo o funcionamento da Ré e suas participadas, e sempre lhe foram prestadas todas as informações pela mesma solicitadas. Assume que na assembleia geral de aprovação das contas do exercício de 2014 não esteve presente o Fiscal Único, e por isso, e pese embora todos os esclarecimentos e informações solicitados pela Autora lhe terem sido prestados, anunciou a renovação da deliberação em crise nos autos, com nova assembleia geral de accionistas a realizar no dia 5 de Novembro de 2015, por forma a sanar a irregularidade apontada.

A Autora respondeu, esclarecendo que relativamente à então, já realizada assembleia geral de 5/11/2015, que ela e mais sete accionistas intentaram acção para anulação da deliberação tomada na mesma.

Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

Do assim decidido, apelou a Autora, tendo o recurso sido julgado procedente, revogada a sentença e anulada a deliberação de aprovação das contas da Ré relativas ao exercício findo em 31 de Dezembro de 2014 tomada na reunião da assembleia geral anual que teve lugar no dia 28 de Maio de 2015.

Inconformada com esta decisão recorre agora a Ré, de Revista, apresentando o seguinte acervo conclusivo: - Entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa que se achava violado o disposto nos artigos 23, nº2, 69º, nº1 e 70º do CIRC, e o disposto no nº 3 dos artigos 66º e 508º do CSComerciais, tendo revogado a sentença proferida em lª Instância, anulando a deliberação de aprovação das contas da Recorrente, - Sustentando tal violação dos indicados preceitos legais, no facto de “... nem o relatório consolidado, nem no relatório de gestão da A, Lda. se contém qualquer referência aos trabalhadores domésticos necessários para proporcionar a fruição da Casa X aos accionistas nos respectivos fins de semana, entendendo-se que se mostra adequado fazê-lo, na medida em que apenas a referência a esse custo permitirá a transparência necessária para se perspectivar a evolução dos negócios, o desempenho e a posição da A, bem como o das empresas compreendidas na consolidação, consideradas no seu conjunto, e a descrição dos principais riscos e incertezas com que aquela e estas (as compreendidas no perímetro da consolidação) se defrontam - cfr n.º1 dos referidos arts 66.º e 508º”, e, consequentemente, anulando as contas da Recorrente, com base no argumento de considerar necessário “... que se conheçam todos os gastos da Al, nos quais se inclui a parcela do valor pago aos trabalhadores domésticos que se mostre correspondente aos serviços por eles prestados em função da referida fruição da Casa X pelos accionistas aos fins de semana.” - Ora, na data a que se reportam os factos dos presentes autos, a aqui Recorrente estava integrada no Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), sendo, por ter exercido essa opção em 2012, o que fez por razões de maior eficiência e transparência fiscal, sendo tributada pelo lucro consolidado, mas não estava obrigada a apresentar e aprovar contas consolidadas.

- Na verdade, em 2014, a Recorrente estava legalmente dispensada de apresentar e aprovar contas consolidadas, por não ultrapassar os limites consagrados na lei, tendo disponibilizado todos os documentos relativos à consolidação das suas contas aos seus accionistas, mas não tendo tais contas sido, como não tinham que ser, objecto de qualquer deliberação.

- A deliberação cuja anulação foi peticionada nos presentes autos - veja-se o pedido constante da petição inicial e os documentos nºs 5 e 12 juntos com a mesma - respeita, única e exclusivamente, à aprovação das contas individuais da Recorrente.

- Não estando sujeita a escrutínio quaisquer aspectos das contas da Alornatur, Lda, participada da Recorrente (directa e indirectamente, a 100%), as quais foram previamente aprovadas em sede própria, não estando também sujeitas a deliberação quaisquer contas consolidadas...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT