Acórdão nº 312/18.7T8STRE.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | PINTO DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 06 de Novembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: I.
AA, SA apresentou processo especial de revitalização com base na sua difícil situação económica e na possibilidade de reestruturação das suas dívidas com a aprovação de um plano de recuperação.
Por decisão datada de 14/03/2018 foi indeferido liminarmente o processo especial de revitalização, com fundamento na circunstância de não se mostrar decorrido o prazo de dois anos a que alude o artigo 17º-G, nº 6, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas desde a data do encerramento do anterior processo especial de revitalização intentado pela devedora.
Discordando desta decisão, a empresa requerente interpôs recurso de apelação que a Relação julgou procedente, com este dispositivo: Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida, a qual deve ser substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos.
Inconformada, a credora BB, SA, veio pedir revista, com fundamento na oposição de acórdãos (art. 14º, nº 1, do CIRE), que foi admitida, tendo apresentado conclusões, de que se destacam as seguintes: - No anterior PER, o plano de revitalização foi aprovado, vindo a ser recusada, judicialmente, a respectiva homologação, pelo que, prima facie, poderíamos ser tentados a concluir que, ao caso em apreço, não se aplica o disposto no artigo 17.º G, n.º 6, do CIRE, uma vez que não se verifica um caso de não aprovação do plano por parte dos credores.
- Se é certo que o plano foi aprovado pela maioria dos credores, o facto é que não veio a ser homologado pelo tribunal, no uso das competências que lhe estão atribuídas e como se dispõe no artigo 215.° do CIRE - No caso de o plano ter sido aprovado mas não chegar a ser homologado judicialmente, fica o devedor impedido de dar início, imediatamente, a novo PER.
- A assim não ser, "os credores - designadamente os credores que votaram contra o plano - poderão ficar eternamente impedidos de exercer os seus direitos, bastando que uma maioria de credores insista em aprovar planos ilegais e que o administrador da insolvência não requeira a insolvência do devedor.
- Seria aliás estranho que a maioria que aprova um plano ilegal pudesse sujeitar a minoria discordante a mais um PER. Assim, o n.º 6 do artigo 17.º-G terá de ser interpretado extensivamente, por forma a incluir o caso em que o plano de revitalização é aprovado, mas não homologado pelo tribunal.
- Recorde-se que o CIRE foi objeto de uma recente alteração.
- Alteração que visou colmatar essencialmente a lei (que era omissa) relativamente aos casos em que o plano era aprovado mas não homologado.
- Ou seja, um devedor que viu o seu Plano aprovado e não homologado não constava, como limitado em apresentar novo PER, independentemente do decurso do prazo de dois anos.
- O Legislador, através do Decreto-Lei n.º 79/2017, de 30 de junho, veio introduzir no CIRE uma remissão - no número 8 do Artigo 17.º-F do CIRE - No número 8, manda-se aplicar, em caso de não homologação do Plano, o disposto nos números 2 a 4,6 e 7 do Artigo seguinte, o 17.º-G - Assim, facilmente se constata que a intenção do legislador foi colmatar essa situação e reforçar a intenção que o limite temporal dos dois anos aplica-se para os casos em que o plano foi aprovado, mas não foi homologado, cfr. situação do acórdão invocado e em oposição com a decisão ora posta em crise.
- Pelo que o acórdão que alterou a decisão deverá ser substituído por outro que, determine o indeferimento liminar do terceiro PER apresentado pela devedora AA, S.A..
A recorrida contra-alegou, concluindo pela improcedência do recurso, acrescentando, tendo em conta a alteração do quadro legal aplicável, o seguinte: - Caso se entenda que deverão aplicar-se à aqui Recorrida, sem mais, as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 79/2017, de 30 de junho, sempre se dirá que, o Legislador, através do referido Decreto-Lei, veio introduzir no CIRE uma remissão - no número 8, do Artigo 17.°-F, do CIRE - a qual entra, numa interpretação direta e literal, em evidente e insuperável contradição com o número 13 desse Artigo 17º0-F, pois, conforme resulta da análise da referida norma, o número 8, do Artigo 17.° - F do CIRE, manda aplicar, sem mais, e em caso de não homologação do Plano, o disposto nos números 2 a 4, 6 e 7 do Artigo seguinte, o 17.°-G; - A análise do teor das referidas normas só pode resultar no entendimento de que estamos perante um lapso manifesto, porquanto, no nº 13 do mesmo artigo, o regime é regulado de forma diferente, admitindo inclusivamente exceções, pelo que na interpretação da norma em questão, se deve entender que existe um lapso no número 8 do referido artigo, que não pode nem deve mencionar a remissão para o número 6 do artigo seguinte, devendo por isso mesmo tal remissão ser eliminada pelo intérprete, já que, com remissão para o mesmo número do artigo seguinte, o número 13 regula expressamente as exceções que se devem aplicar, naturalmente, aos casos de não homologação - não pode ser requerido novo PER no prazo de dois anos, exceto se existir cumprimento do Plano e o requerimento de novo processo especial de revitalização for motivado por fatores alheios ao próprio Plano e a alteração superveniente ser igualmente alheia à empresa - já que este artigo se aplica aos dois casos - homologação e não homologação; - Sendo por isso indispensável que se faça uma análise cuidada do teor das referidas normas, a qual terá forçosamente de passar por uma comparação da redação anterior com a atual redação do CIRE, resultando dessa análise que sempre que exista um plano de revitalização anteriormente aprovado pela maioria dos credores, incumprido por razões exógenas, como é o caso do plano anteriormente apresentado pela aqui Recorrida, pode a Devedora recorrer novamente a tal mecanismo sem que para isso tenha de ser observado qualquer lapso de tempo; - Contudo, e mesmo que se entenda, no que não concedemos, que não existe erro na remissão efetuada no n.º 8 do Artigo 17.º-F do CIRE, sempre, ainda assim, se terá de aplicar, cumulativamente, o n.º 13 do mesmo artigo aos casos de não homologação, já que tal aplicação pode gerar complementaridade, aplicando-se as exceções ali contidas a todos os casos de aprovação (com ou sem homologação), o que deveria ter sido analisado pelo Tribunal de Primeira Instância e não foi, resultando, assim, em omissão de pronúncia; - Sendo tal tese reforçada pelo próprio texto da Lei, quando manda, no citado número 13 do Artigo 17.º-F, contar os dois anos da decisão DE HOMOLOGAÇÃO OU DE NÃO HOMOLOGAÇÃO, sinal inequívoco de que aquele número se aplica, também, às duas situações; - Se o legislador entendesse em sentido diverso, teria dado ao n.º 13 a seguinte redação, ou com o mesmo sentido: "…contando-se o prazo de dois anos da decisão de homologação prevista no n.º 7 do presente artigo…", o que não fez, sendo igualmente de salientar que se atentarmos na parte final do número 13, temos que a situação ali descrita "…o requerimento de novo processo especial de revitalização é motivado por fatores alheios ao próprio plano e a alteração superveniente é alheia à empresa" tem aplicação aos casos de não homologação; -...
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