Acórdão nº 2791/04.0TBVLG.P2.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 06 de Novembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I E intentou ação declarativa sob a forma de processo comum ordinário, contra C, M e P, pedindo: que sejam condenados os Réus a reconhecer a Autora como legítima proprietária da fração autónoma designada pelas letras BQ-um, que faz parte da fração BQ; que seja a Ré P... condenada a abster-se de violar o direito de propriedade da autora deixando de aí guardar qualquer veículo, nem permitindo que outrem aí guarde quaisquer bens ou veículos, bem como a devolver tal fração à Autora, livre de pessoas e bens; que sejam condenados os 1ºs Réus (C e M) no pagamento à Autora da quantia que se vier a liquidar em execução de sentença; subsidiariamente, se se entender que a 2ª Ré (P) é a única responsável pela ocupação abusiva da garagem - aparcamento, deverá ela ser condenada na indemnização à autora na quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença.
Como fundamento da sua pretensão, alegou a Autora, em síntese, que por escritura pública de 8 de Janeiro de 1987, os 1°s Réus (C e M) venderam a M C a fração autónoma designada pelas letras 'BR', correspondente a habitação no 9º andar esquerdo e lugar de garagem na cave designado por BR-um; por escritura pública de 5.12.1986, os mesmos Réus (C e M) venderam à Autora e ao ex-marido A..., a fração autónoma designada pelas letras BQ correspondente a habitação no 9º andar direito e lugar de garagem na cave designado por BQ-um; porém, embora a Autora e seu então marido ocupassem a fração desde meados de 1987, nunca ocupou a garagem BQ-um, mas sim, sem que se apercebesse da diferença, e por indicação dos lºs Réus, a garagem BR-um; é que os lugares de garagem encostados às paredes foram transformados em garagens fechadas e isso fez com que diminuísse o espaço e faltasse, do lado respetivo, uma garagem nas 15 previstas - facto de que nunca a Autora se apercebera; M C foi sucessivamente ocupando diversas garagens, à medida que elas iam sendo vendidas e os adquirentes respetivos as reivindicavam, até que ficou sem lugar; por isso, em 1996, M C intentou uma ação contra a Autora e seu ex-marido reivindicando a posse e propriedade da garagem BR-l; tal ação foi julgada improcedente; em 1997 M C intentou uma outra ação contra os aqui 1°s Réus (C e M), julgada procedente, tendo sido a Autora e seu ex-marido condenados a devolver - e já devolveu - o lugar de garagem que ocupavam e a pagar-lhe indemnização a liquidar em execução de sentença (vide acórdão desta Relação de 21 de Outubro de 1997 - fls. 65), ficando, portanto, sem aparcamento, com consequentes prejuízos; com a Ré P sucedeu o mesmo: adquiriu a fração com lugar de garagem M-um mas nem ela, nem os anteriores proprietários que adquiriram dos lºs Réus, alguma vez a ocuparam, antes tendo sempre ocupado o lugar BQ-um [da autora]; além disso, a Autora praticou atos de posse sobre as frações autónomas [habitação e garagem] integradores dos pressupostos de aquisição por usucapião.
Os Réus contestaram.
Os primeiros (C e M) contestaram nos termos que constam do articulado de fls. 232 a 234, impugnando os factos, e alegando, designadamente, que houve delimitação de lugares “através do levantar de paredes divisórias”, que não desapareceu qualquer lugar, que o lugar de parqueamento da autora continua a existir, que a delimitação foi feita por iniciativa e no interesse exclusivo dos comproprietários, não tendo havido qualquer alteração (mormente de dimensões) em função do projeto de construção aprovado, e que ignoram se a autora usa o seu lugar ou não, sendo que a cave do prédio mantém a divisão constante da planta incluída no projeto de construção aprovado e licenciado.
A segunda Ré, P, contestou nos termos que constam do articulado de fls. 253 a 263, impugnando a factualidade alegada pela autora, alegando que sempre possuiu, tendo adquirido por usucapião, a garagem questionada (BQ-1), sendo certo que as garagens fechadas o foram antes da primeira transmissão ocorrida em 1986. Mais impugnou os prejuízos invocados e deduziu reconvenção na qual pede a condenação de «todos os reconvindos a reconhecerem que a reconvinte adquiriu por usucapião o direito de propriedade sobre a garagem constituída pelos lugares designados como BQ-l e BN-l no doc. 4 e que corresponde à garagem designada como Ml no doc. 5, ambos da pi.».
Deduziu ainda o Incidente de Intervenção Provocada de A e de A M, adquirentes da fração BN por ela parcialmente ocupada e alegadamente adquirida (por usucapião).
A Autora apresentou réplica, conforme consta de fls. 271 a 275, alegando que a posse invocada pela 2ª Ré não é titulada, referindo que a posição desta é igual à da Autora nas ações judiciais anteriores e que toda a situação (desconformidade entre os títulos e a realidade e ocupação das garagens) era amplamente conhecida.
Foi proferido despacho (fls. 288) no qual foi indeferida a intervenção principal provocada requerida pela Ré P, intervenção essa que veio a ser admitida após recurso de Agravo.
A Autora requereu a ampliação do pedido (fls. 691), o que foi indeferido por despacho de fls. 725, ampliação essa que veio a ser admitida por via da decisão do recurso de Agravo interposto.
Na sequência de convite (fls. 1255), veio a autora requerer a intervenção principal provocada passiva de R e D, P C e S, por serem os proprietários dos aparcamentos BMT e BR1, aparcamentos esses confinantes com aquele que é objeto dos presentes autos (fls. 1258 e seg.), o que foi deferido.
Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: I - Julga procedente, por provada, a acção e, em consequência: - Condena os RR a reconhecerem que a Autora E é titular do direito de propriedade sobre a garagem BQ-l, com a área de cerca de €10,56 m2, que faz parte da fracção autónoma BQ do prédio em questão constituído no regime de propriedade horizontal.
- Condena a 2ª Ré P e RR intervenientes a abster-se de violar tal direito da Autora, deixando de nela guardar qualquer veículo, nem permitindo que outrem aí guarde quaisquer bens ou veículos.
- Condena a 2ª Ré P a restituir à Autora E a referida garagem BQ-l, livre de pessoas e bens.
- Condena os RR intervenientes a demolirem as paredes...
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