Acórdão nº 0615/15.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução11 de Outubro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

Município de Setúbal (MS), devidamente identificado nos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do TAC de Lisboa, de 05.09.14, que julgou “a ação procedente, por provada, e, em consequência”, condenou “o R. a pagar aos AA. uma indemnização no valor a liquidar em execução de sentença, pela ocupação ilegal de terreno da sua propriedade (com a área total de cerca de 1180m2), com o limite de € 1.596.153,26 (Esc. 320.000.000$00), correspondente ao valor peticionado, acrescido de juros de mora desde a data da citação até integral pagamento” (cfr. fl. 727).

Na base deste recurso está uma acção de responsabilidade civil extracontratual, em processo ordinário, intentada por A………… e outros, em que se peticiona, a final, o seguinte: “Deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, ser a Câmara Municipal de Setúbal condenada a pagar aos A.A. a quantia de 80.000.000$ (399.038,31 euros) pelo ilegal licenciamento da edificação em curso nas parcelas de terreno propriedades dos A.A., E de esc. 240.000.000$ (1.197.114,95 euros) pela ocupação e utilização dos demais 1033 m2 de terreno, propriedade dos A.A., que foram utilizados para infra-estruturar o loteamento licenciado, acrescido de juros devidos desde a citação e até integral pagamento”.

Após algumas vicissitudes processuais relacionadas com a eventual extemporaneidade do recurso e do tribunal competente para o conhecer, questões oportunamente decididas, cabe agora a este STA apreciar o presente recurso.

  1. O MS, ora recorrente, apresentou alegações, concluindo do seguinte modo (cfr. fls. 739 a 240v.): “a) É inquestionável o acerto da douta sentença recorrida ao condenar o R. a pagar aos AA. uma indemnização, de montante a liquidar em execução da sentença, o que não merece qualquer censura.

    1. A sentença recorrida, contudo, considerou como atendível, para efeitos de indemnização, toda a área do prédio, com exceção da área de implantação do moinho, que determinou ser de 1180m2.

    2. Tendo considerado ainda que toda a área do prédio remanescente da implantação do moinho e de uma faixa, cuja área não concretizou, ocupada por dois prédios construídos por terceiros, foi ocupada pelo domínio público, conclusão de facto que se sindica no presente recurso e que não pode ser dada como assente.

    3. Com efeito, pelos motivos atrás invocados, resulta claro da prova documental existente em processo que, aliás, é a prova fundamental e única relevante, quer para o relatório pericial quer para a decisão de facto proferida, que uma parte do prédio dos AA., situado numa zona de lotes a norte da Rua ……, não está integrada no domínio público.

    4. Por tal, ao contrário do decidido, deverá considerar-se apenas assente que a área do prédio, que remanesce da área de implantação do moinho e da área ocupada pelas construções dos particulares, foi integrada no domínio público, com exceção da parte do prédio situada imediatamente a norte da Rua …….

    5. Devendo relegar-se para execução da sentença a determinação da área ocupada pelo domínio público, que depende também da determinação da área ocupada pelas construções particulares e da área situada na zona de lotes existente a norte da Rua …….

    6. A douta decisão recorrida condenou o R. a indemnizar os AA. pela perda patrimonial decorrente, não só da ocupação do seu prédio pelo domínio público, mas também da ocupação do mesmo por duas construções promovidas por particulares, pelo facto de as mesmas terem sido licenciadas pelo Município.

    7. Ora, a atribuição de uma licença de construção por um município não define nem atribui quaisquer direitos de propriedade ao beneficiário perante terceiros ou perante os titulares de direitos reais vizinhos e eventualmente conflituantes.

    8. Pelo que, caso, no desenvolvimento das construções licenciadas, os particulares tivessem lesado os direitos de propriedade dos AA., a estes competiria reagir, pelos meios civilísticos ao seu alcance, o que nunca fizeram.

    9. Pelo que, os danos que pretensamente terão sofrido, não são consequência adequada do licenciamento atribuído pela Câmara que, aliás, foi plenamente lícito, já que os particulares preenchiam todas as condições necessárias para o deferimento, nomeadamente de comprovação dos seus direitos de propriedade.

    10. Por outro lado, o facto de, na planta de síntese do loteamento, o prédio dos AA. coincidir, numa pequena faixa, com parte do desenho de dois lotes, não resulta de uma atuação culposa do Município que, ante as indefinições e dúvidas relativamente à existência de outros direitos reais, na área a lotear, para além do direito de propriedade do produtor do loteamento, publicou e publicitou anúncios para que os eventuais titulares desses direitos os reclamassem no processo, sendo certo que nunca os AA., nessa fase, os vieram reclamar.

    11. Desse modo, a douta decisão recorrida, ao ter condenado o Município pela indemnização dos danos sofridos pelos AA. com a ocupação do seu prédio, resultante daquelas construções promovidas pelos particulares, fez uma errada interpretação e aplicação do disposto nos artºs 2º e seguintes do Dec. Lei nº 48051, de 21/11/1967, devendo, por tal, ser nessa parte revogada.

    Nesses termos e nos mais de direito, Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e decidindo-se no sentido de condenar o Município ao pagamento de uma indemnização, a liquidar em execução de sentença, pela ocupação pelo domínio público de parte do prédio dos AA., devendo, na determinação dessa indemnização, ser apenas tida em conta a área do prédio, também a determinar em execução, que remanesce à área de implantação do moinho, à área ocupada pelas construções levadas a cabo por particulares e à área do prédio situada a norte da Rua ……, que não foi ocupada pelo domínio público nem foi objeto de qualquer ato lesivo por parte da Câmara, assim se fazendo JUSTIÇA”.

  2. Os ora recorridos vieram produzir contra-alegações, não apresentando, contudo, o correspondente quadro conclusivo (cfr. fls. 760 a 763).

  3. O Digno Magistrado do MP junto deste Tribunal teve vista dos autos e emitiu parecer (cfr. fls. 779 a 780) no sentido da improcedência do recurso e, concomitantemente, da manutenção da decisão recorrida.

  4. Colhidos os vistos...

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