Acórdão nº 0380/08.0BEBJA 0204/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução10 de Outubro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A…………, Ldª com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida contra as liquidações adicionais de IVA referente aos períodos de 2007/08 e 2007/09 e respectivos juros compensatórios, no valor global de € 434.668,06.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «

  1. O escopo do processo de impugnação judicial consiste na obtenção da anulação dos actos praticados pela Autoridade Tributária, com fundamento na errónea qualificação e quantificação dos factos tributários e por violação da lei, mormente na indagação e aplicação do artigo 71/5 do CIVA aos factos, reconduzindo-se essencialmente a um contencioso de mera anulação.

  2. O Tribunal a quo julgou improcedente a presente impugnação judicial e como tal foram admitidas (i) a liquidação adicional de IVA n.º 08084252, referente ao período de 0708, no montante de € 251.092,54, (ii) a liquidação de juros compensatórios n.º 08084253, referente ao período de 0708, no montante de € 5.971,19, (iii) a liquidação adicional de IVA n.º 08084254, referente ao período de 0709, no montante de € 183.575,52, e (iv) a liquidação de juros compensatórios n.° 08084255, referente do período de 0709, no montante de €3.701,69.

  3. Em concreto e em síntese, o Tribunal a quo, apesar de reconhecer o direito ao reembolso por parte da Recorrente, considerou que «(...) para permitir o reembolso, a lei nacional impõem como condição a comunicação aos adquirentes da alteração da taxa, não distinguindo entre consumidores finais e outros sujeitos passivos. De qualquer forma, podendo muito bem considerar-se como de prova impossível o contacto, por não poderem ser identificados, dos clientes da Impugnante, certo é que era possível e adequado o anúncio ao público da disponibilidade de reembolsar quem se apresentasse e demonstrasse ter sido consumidor final, no período de tempo em causa. À Impugnante competia esta prova de ter feito anúncio público. Assim pode concluir-se que a Impugnante não diligenciou pela comunicação aos adquirentes da rectificação como exige o artigo 71/5 CIVA. E, não o tendo pugnado pelo anúncio aos adquirentes da alteração da taxa, a dedução tem de se considerar indevida».

  4. Contudo, considera a Recorrente que tal disposição legal não tem aplicação ao caso vertente porquanto o preço final cobrado pelo ingresso no parque encontra-se previamente fixado - incluindo todas as taxas, impostos e encargos, nomeadamente a taxa reduzida de IVA de 5% -, sendo apenas actualizado em função dos indicadores económicos, mormente a taxa de inflação.

  5. Conforme reconhece o Tribunal a quo, a Recorrente “deveria ter liquidado e entregue IVA à taxa reduzida” com relação aos ingressos no Parque. Assim, ao ter liquidado IVA à taxa normal em vigor à data dos factos (19% ou 21%, conforme o período em causa), ocorreu um erro de direito, que consistiu na incorrecta determinação da norma aplicável em matéria de taxa de IVA (artigo 18° do CIVA e Lista 1 Anexa ao CIVA), o qual originou um consequente erro no apuramento contabilístico do valor do IVA a liquidar e a entregar nos cofres do Estado (nos termos do artigo 49° do CIVA).

  6. Independentemente do erro da Recorrente aquando do apuramento contabilístico do valor do IVA a liquidar a favor do Estado, o preço pago pelos visitantes do parque corresponde exactamente ao que deveria ter sido cobrado, pelo que não há lugar à devolução aos visitantes de qualquer montante, seja a que título for.

  7. O entendimento preconizado pelo Tribunal a quo incorre em manifesto vício de violação da lei, mormente na indagação e aplicação da norma tributária aos factos, bem como a sentença a quo violou os princípios de direito comunitário da generalidade, da igualdade de tratamento, da legalidade e da justiça material (também consagrados na LGT).» 2 – Não foram apresentadas contra alegações.

    3 - Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu fundamentado parecer que, na parte relevante, se transcreve: «(…..) 2. Na sentença recorrida, embora não conste do probatório em termos formais (parte III-fundamentação, a) factos provados), a Mma. Juiz deu como assente que (e passamos a citar), “no caso, na venda de ingressos no parque que explora, a impugnante liquidou e entregou IVA à taxa normal, quando devia ter liquidado e entregue IVA à taxa reduzida”- 7° parágrafo de fls. 336 dos autos.

    E logo de seguida a Mma. Juiz refere que «não está em causa se os ingressos ou entradas no parque zoológico deveriam ter sido tributados à taxa reduzida, ...». Para acrescentar que «a questão colocada prende-se com a rectificação prevista no artigo 71° do CIVA» Ou seja, na sentença recorrida, embora essa matéria de facto pudesse ter ficado mais explicita, a Mma. Juiz “a quo” parte do facto assente que a impugnante e aqui Recorrente, ao cobrar as entradas no parque zoológico, aplicou e liquidou IVA à taxa normal (21%), que posteriormente rectificou, mediante a regularização a seu favor do montante liquidado em excesso.

    E nessa medida considerou a Mma. Juiz “a quo” que a Recorrente devia ter observado os trâmites previstos no n° 5 do artigo 71° do CIVA e como isso não ocorreu, a regularização a seu favor era indevida.

    Com efeito, para se decidir pela improcedência da acção, a Mma. Juiz ”a quo” considerou que a impugnante e aqui Recorrente ao pretender rectificar o valor do IVA cobrado aos visitantes do seu parque zoológico devia ter feito anúncio da disponibilidade de reembolsar quem se apresentasse e demonstrasse ter sido consumidor final no período de tempo em causa. Mas como não resultou comprovado que o tenha feito, considerou a dedução indevida, confirmando nesta parte o entendimento da administração tributária, de acordo com o qual, «para que o sujeito passivo, possa regularizar a seu favor, o IVA a mais liquidado, deverá estar habilitado a provar que o adquirente, mesmo sendo um particular, tomou conhecimento da retificação, ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que, se se considera indevida a respectiva dedução, nos termos do n° 5 do art. 71° do CIVA» - (cfr. alínea 1) — último parágrafo de fls. 331).

    Ora, é contra este entendimento que se insurge a Recorrente, a qual segundo percebemos o seu raciocínio, como o bilhete cobrado não mencionava a taxa de IVA e o valor do imposto estava diluído no preço cobrado, entende que o erro na cobrança da taxa apenas afectou a sua margem de lucro, motivo pelo qual não havia lugar a qualquer devolução aos visitantes e à consequente necessidade de os contactar de qualquer modo para esse efeito.

    No caso concreto dos autos parece não oferecer dúvidas que o entendimento da administração tributária sufragado na sentença recorrida e que conduziu à liquidação adicional impugnada, tem subjacente o facto de ao regularizar as deduções do IVA a seu favor, a aqui Recorrente obtinha um enriquecimento sem justa causa. Na verdade, não está em causa o direito á dedução de outros sujeitos passivos, já que estamos perante imposto cobrado no âmbito de prestação de serviços ao consumidor final. E nessa medida não se coloca a questão da existência de perigo de diminuição de receitas fiscais.

    A este propósito no acórdão de 10/04/2008 do Tribunal de Justiça (C-309/06 — Marks & Spencer) sufragou-se o entendimento de que «o direito comunitário não se opõe a que um sistema jurídico nacional recuse a restituição de impostos indevidamente cobrados em condições susceptíveis de implicar um enriquecimento sem causa dos contribuintes (acórdãos de 24 de Março de 1988, Comissão/Itália, 104/86, Colect., p. 1799, n.º 6; de 9 de Fevereiro de 1999, Dilexport, C-343/96, Colect., p. 1-579, n.º 47; e de 21 de Setembro de 2000, Michaïlidis, C-441/98 e C-442/98, Colect., p. 1-7 145, n.º 31). No entanto, para ser conforme com o direito comunitário, o princípio da proibição do enriquecimento sem causa deve ser aplicado respeitando princípios como o princípio da igualdade de tratamento. Além disso, há que recordar que, no caso de um imposto ter sido indevidamente cobrado à luz do direito comunitário, se se provar que foi repercutida apenas uma parte do imposto, as autoridades nacionais são obrigadas a restituir o montante não repercutido (acórdão de 14 de Janeiro de 1997, Comateb e o., C-192/95 a C-218/95, Colect., p. 1-165, n.ºs 27 e 28). Cumpre, no entanto, assinalar que, mesmo na hipótese de o imposto ter sido completamente integrado no preço praticado, o sujeito passivo pode sofrer um prejuízo associado à diminuição do volume das suas vendas (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Comateb e o., n.°s 29 e 30, e MichaYlidis, n.ºs 34 e 35).

    O mesmo Tribunal de Justiça, no acórdão de 18/06/2009 (processo C 566/07), entendeu igualmente que «só é possível demonstrar a existência e a medida do enriquecimento sem causa que o reembolso de um imposto, indevidamente cobrado à luz do direito comunitário, gera para um sujeito passivo após uma análise que tenha em conta todas as circunstâncias...

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