Acórdão nº 0356/15.0BEPRT 01001/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelANTÓNIO PIMPÃO
Data da Resolução10 de Outubro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: * 1.1.

A………. interpôs recurso, nos termos do artigo 80.º, n.º 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, da aplicação da coima, proferida pelo Chefe de Finanças de Vila Nova de Gaia 3, em 17/08/2014, no âmbito do processo de contra-ordenação n.º 39642014060000424880, por falta de pagamento de taxa de portagem.

* 1.2.

Aquele Tribunal, por Sentença de 23/02/2015 (fls. 52/55), concluiu o seguinte: «Nos termos e com os fundamentos expostos, anulo a decisão administrativa que aplicou a coima e ordeno a baixa dos presentes autos ao Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 3, para que seja organizado um só processo (ou efectuada a apensação dos processos), de modo a apreciar a conduta da Recorrente de modo integrado, proferindo uma decisão de aplicação de coima (única) que, caso se verificarem os pressupostos da infracção continuada, deverá atender ao disposto no artigo 79.º do C.P., e, caso tal não aconteça, ao regime consagrado no artigo 25.º do R.C.I.T.».

* 1.3.

Do assim decidido recorrem, para este Supremo Tribunal, o Ministério Público e a Fazenda Pública.

* 1.3.1.

O Ministério Público concluiu as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo: «1ª - QUESTÃO PRÉVIA: o recurso deve ser admitido, apesar do valor da coima aplicada e do disposto no artigo 83 – n.º1 do RGIT, atento o disposto no artigo 73 n.º 2 do RGCO aprovado pelo DL 433/82 de 27/10.

  1. - Nos autos foi aplicada ao arguido e impugnante uma coima que não ultrapassa um quarto (€1.250,00) da alçada fixada para os Tribunais Judiciais da Primeira Instância, pelo que nos termos do art.º 83 – n.º 1 do RGIT, não seria admissível recurso do despacho em crise.

  2. - Todavia, o STA tem vindo a entender ser admissível recurso em casos justificados, com base nos fundamentos previstos no art.º 73 n.º 2 do RGCO, aplicável por força do disposto no art.º 3º - alínea b) do RGIT, quando tal se afigurar manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência (cf. acórdãos do STA de 9/5/2012, 19/9/2012, 08/05/2013 e de 05/02/2014, proferidos nos P. 243/12, 703/12, 655/13 e 1071/13, disponíveis em www.dgsi.pt.

  3. - Ora, nos termos daquele art.º 73 n.º 2 do RGCO, poderá ser admissível recurso quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência, que se afigura ser o caso da decisão ora recorrida.

  4. - Há manifesta necessidade para melhoria de aplicação do direito quando ocorrem erros claros na decisão judicial, de tal forma que repugne manter na ordem jurídica a decisão recorrida, por ela constituir uma afronta ao direito, o que acontece com a solução jurídica encontrada pela decisão recorrida, pelo que é manifestamente necessário a admissão do recurso para melhoria da aplicação do direito.

  5. - Acresce que, se o recurso não fosse admissível, ficaria por saber qual a solução jurídica a dar ao caso, sendo certo que, como vem sendo amplamente divulgado nas últimas semanas nos órgãos de comunicação social, existem milhares de processos de contraordenação que estão pendentes nos Serviços de Finanças, por infrações idênticas à dos presentes autos, alguns deles ainda em instrução e outros já com recursos interpostos que vão sendo remetidos a Tribunal, e há casos em que no mesmo Tribunal são tomadas decisões diversas, para a mesma questão jurídica.

    7 - Assim, caso não fosse admissível recurso, ficariam sem controlo jurisdicional decisões proferidas com duvidosas soluções jurídicas, com manifesta violação do direito, claro prejuízo do direito fundamental do cidadão ao recurso judicial das decisões administrativas e do interesse público e das autoridades fiscais na cobrança das receitas do Estado, pelo que atenta a natureza da questão, o seu impacto público, a necessidade da melhoria da aplicação do direito e a promoção da uniformização das decisões dos Tribunais e das autoridades administrativas, levam a que este recurso deva ser admitido e apreciado, nos termos do artigo 73 n.º 2 do RGCO.

  6. - A QUESTÃO OBJETO DE RECURSO: o despacho recorrido anulou a decisão administrativa que aplicou a coima impugnada e ordenou a baixa dos mesmos ao SF para que seja organizado um só processo ou efetuada a apensação dos processos, de modo a apreciar a conduta do recorrente de modo integrado, proferindo uma decisão única de aplicação de coima em que, caso se verifiquem os pressupostos da infração continuada (art.º 30 nº 2 do CP), se deverá atender ao disposto no art.º 79 do CP., e, caso tal não aconteça, ao regime consagrado no art.º 25 do RGIT, por tal ato de apensação ser da competência da autoridade administrativa, perante a qual foi suscitado esse incidente.

  7. - Conhecedor o Tribunal da existência neste TAF de vários recursos de contraordenação, por ilícitos da mesma natureza e em que o arguido é o mesmo, e sendo o recurso judicial de contraordenação um misto de recurso e de julgamento de fato em primeira instância, por força do disposto no art.º 25 do CPP, aplicável subsidiariamente por força do disposto nos artigos 41 n.º 1 do RGCO e artigo 3º- al) b) do RGIT, o Tribunal recorrido deveria ter ordenado primeiramente a apensação de todos os recursos interpostos por este arguido, pendentes neste TAF, observando-se as normas de antiguidade previstas na al) c) do art.º 25 do CPP.

  8. - E, de seguida e depois de se terem realizado os atos materiais de apensação dos recursos, deveria ter sido lavrado um despacho, em que, considerando agora, depois da apensação operada, como existindo um único processo de recurso judicial de impugnação de coima, se notificasse o recorrente para proceder à autoliquidação da taxa de justiça de uma UC devida, nos termos do art.º 8º - n.º 8 do RCP, ou se aguardasse pela decisão a ser proferida no pedido de apoio judiciário que tivesse sido apresentado, para se passar de seguida ao conhecimento dos efeitos jurídicos da não apensação de processos de contraordenação não aceite nem efetuada pela AT e das suas implicações na decisão de aplicação de coima constante dos autos, pois são questões de direito, em que é obviamente desnecessária a marcação da audiência de julgamento.

  9. - E se tivesse sido observado este procedimento, de apensar os recursos do mesmo arguido, observadas as regras do pagamento ou dispensa de taxa de justiça, é nosso entendimento que, embora não seja caso de aplicação de coima única, por a regra a aplicar ser a de cúmulo material de coimas prevista no art.º 25 do RGIT, se aceita a anulação de todo o processado a partir da não apensação dos processos de contraordenação, por esta omissão constituir uma irregularidade processual (art.º 123 do CPP), atempadamente arguida, com influência na decisão final da causa ou afetação do “valor do ato praticado” (decisão de aplicação de coima) – cf. art.º 123 – n.º 2 – parte final do CPP -, na medida em que podem ocorrer situações em que seja evidente a existência de ilícito contraordenacional continuado, sendo que a tipificação das nulidades processuais previstas no art.º 63 do RGIT não afasta a arguição das irregularidades processuais a que se refere o art.º 123 do CPP.

  10. - É certo que, caso operasse atualmente nas contraordenações fiscais a regra do cúmulo jurídico, seria líquido que se deveria proceder aqui à apensação dos recursos, à autoliquidação da taxa de justiça devida e à posterior anulação do processado e à baixa dos autos ao SF para aplicação duma decisão e coima únicas - neste sentido, acórdão do TCAN de 15/02/2013, proferido no 1097/08.OBEVIS, disponível em www.dgsi.pt.

  11. - Por outro lado, a apensação destes recursos de contraordenação impõe-se também pela aplicação da regra da economia e da boa gestão processual prevista no art.º 130 do CPC, aplicável subsidiariamente ao CPP por força do seu art.º 4º e ao RGCO e ao RGIT, de modo a impedir que se pratiquem repetidos atos de prolação de sentenças e notificações absolutamente iguais, para os mesmos intervenientes, com evidentes prejuízos para uma boa e célere administração da justiça, para além, dos inerente e consequentes prejuízos orçamentais e financeiros que daí resultam.

  12. - Desta decisão de apensação dos recursos, para posterior aplicação duma decisão única de condenação em coimas, ainda que em cúmulo material, em que terá a AT e posteriormente o Tribunal por via de recurso, que ponderar se ocorrem situações de ilícito continuado, não resulta qualquer prejuízo para o arguido, pois foi o próprio a requerer a apensação dos recursos de contraordenação.

  13. - Assim sendo, impõe-se que se proceda a apensação de todos os recursos ou impugnações judiciais de contraordenação, por ilícitos da mesma natureza e em que o arguido é o mesmo, por força do disposto no art.º 25 do CPPP, aplicável subsidiariamente por força do disposto nos artigos 41 n.º 1 do RGCO e artigo 3° - al) b) do RGIT, pendentes neste TAF, observando-se as normas de antiguidade previstas na al) c) do art.º 28 do CPP, e de seguida deveria ter sido proferido um despacho, em que, considerando agora, depois da apensação operada, como existindo um único processo de recurso judicial de impugnação de coima, se notificasse o recorrente para proceder à autoliquidação da taxa de justiça de uma UC devida, nos termos do art.º 8º n.º 8 do RCP, ou se aguardasse pela decisão a ser proferida no pedido de apoio judiciário que tivesse sido apresentado.

  14. - Após isso, passaria o Tribunal ao conhecimento dos efeitos jurídicos da não apensação de processos de contraordenação não aceite, nem efetuada pela AT e das suas implicações na decisão de aplicação de coima constante dos autos, pois são questões de direito, em que é obviamente desnecessária a marcação da audiência de julgamento, e nesta fase, parece-nos juridicamente aceitável a anulação do processado e a baixa dos autos ao SF para aplicação duma decisão única, ponderando a existência, pelo...

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