Acórdão nº 3827/15.5T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelSALRETA PEREIRA
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA intentou contra BB& Associados acção declarativa comum, pedindo a condenação da R. a: a) Ver declarado o direito de personalidade da autora ao uso exclusivo do nome de seu pai, que lhe foi concedido pelo registo civil, devendo a ré abster-se de usar o nome CC, na sua firma comercial, a partir do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nesta acção; b) A retirar da sua designação social o nome CC, devendo, igualmente, promover, na OA, o registo da sua firma, sem o nome de família CC, a partir do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nesta acção; c) A pagar à A. uma indemnização, a definir em execução de sentença, correspondente à percentagem de 3% sobre a facturação anual bruta da R., o.s., antes de expurgada de despesas, custos e impostos, durante os anos que decorreram entre 1.1.2012 e o momento em que a R. deixe de usar o nome do pai da A. na sua designação comercial, valor que fixa, até à data, em €100.000.

A fundamentar o peticionado alegou, em síntese: A A. é filha de DD e de EE, que usava como nome público e profissional CC.

O pai da A. foi advogado e fundador da R., em 1.1.1994, daí o uso do seu apelido na designação comercial.

A A. usa o nome CC, como nome de família e, profissionalmente, como advogada, desde 7.12.1994.

O pai da A. faleceu em 18.2.2006, não fazendo sentido que a R. mantenha o nome do pai da A. na sua designação comercial.

A A., por ser advogada, não quer que o seu nome profissional seja usado por uma pessoa colectiva, uma vez que tal circunstância a prejudica, não só na identificação, mas também gerando confusões identitárias.

Por considerar que a manutenção do seu apelido na firma social da R. a lesa, sem razão alguma que a justifique, pretende, nos termos do art. 72º, que a R. deixe de usar esse apelido na firma.

Em 5.1.2004, o pai da A. e a R. estabeleceram um contrato de exoneração de sócio, por passagem à reforma, no qual se previa a autorização para utilização de nome, por um período de 5 anos, período renovável automaticamente por iguais períodos de tempo, salvo se a autorização for expressamente retirada, por escrito, com a antecedência de 2 anos relativamente ao termo do período em curso.

Por carta de 29.12.2011, os herdeiros de EE comunicaram à R. que não renovavam a autorização para continuar a usar o nome CC, o qual devia ser retirado da sua denominação social até 1.1.2014.

A R. continua a usá-lo, abusivamente.

Com a confusão provocada pela utilização da R. do nome da A., esta já perdeu clientela e trabalhos, em montante e volume que ignora.

O uso de marcas comerciais está sujeito ao pagamento de uma percentagem, que oscila entre 3 e 5%, mensal ou anual, sobre o valor da facturação da entidade que a utiliza, estando, assim, a R. obrigada a pagá-la à A.

Regularmente citada, a R.

contestou, por excepção e impugnação, propugnando pela improcedência da acção.

Foi requerida e deferida a intervenção espontânea de FF, GG e HH, como AA. na acção.

Os AA. desistiram da instância relativamente ao pedido indemnizatório formulado, supra identificado como c), desistência que foi homologada por sentença.

Foi dispensada audiência prévia, e proferido despacho saneador, no qual, para além do mais, se conheceu do mérito, julgando a acção procedente por provada, reconhecendo aos AA o direito de revogarem a autorização do uso do nome de seu pai pela R., devendo esta abster-se de usar o nome de “CC” na sua “firma”, condenando, ainda, a mesma a retirar esse nome da sua designação social e promover junto da Ordem dos Advogados o registo da sua firma sem o nome de família “CC”, o que deverá fazer após trânsito em julgado da sentença.

Inconformada com tal decisão, a R.

recorreu a título principal e a A. subordinadamente, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa proferido acórdão a julgar procedente a apelação da R. e improcedente a da A.

Inconformados, os AA vieram recorrer para este Supremo Tribunal de Justiça, alegando com as seguintes conclusões: 1ª. A disposição legal constante do nº 3 do artº. 10º do DL nº 229/2004, de 10 de Dezembro, expressa e literalmente ordena que o nome possa ser mantido na firma de uma empresa “mediante autorização escrita destes ou dos seus herdeiros.” 2ª. Logo, os herdeiros que podem, em qualquer momento, conceder a autorização, podem, do mesmo modo, revogá-la em qualquer momento.

  1. O prazo de 20 anos não estava esgotado, quando os herdeiros do apelido CC, em 29 de Dezembro de 2011, revogaram a autorização anteriormente dada por seu pai.

  2. Decorre do DL nº 513-Q/79 que só podem constar da firma da Empresa Vendedora de Serviços Jurídicos nomes dos sócios.

  3. Por isso, o apelido CC não podia constar da firma, a partir do momento em que o Dr. EE deixou de ser sócio da empresa, em 31 de Dezembro de 2003.

  4. Também não podia constar de tal designação, porque a sociedade só podia adquirir “os bens necessários à actividade que constitui o seu objecto social”, não constituindo o apelido de um ex-sócio um bem necessário à actividade da empresa.

  5. No acórdão recorrido decidiu-se contra o direito, quando se considerou legítima a continuação do uso do apelido CC na firma da empresa, a partir do momento em que este deixou de ser seu sócio.

  6. O nº 4 do artº. 10º do DL nº 229/2004, de 10 de Dezembro, ordena um regime jurídico sobre “o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem”, nada especificando sobre “condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos”. Por isso entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos. Isto é, a primeira parte do nº 2 do artº. 12º do CC exclui, expressa e literalmente, a possibilidade do nº 4 do artº. 10º do DL 229/2004 ser aplicado de forma a abranger “as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.

  7. O nº 2 do artº. 12º do CC rejeita o que no acórdão recorrido se denominou por retroconexão.

  8. O prazo de 20 anos só se começa a contar a partir da entrada em vigor do nº 4 do artº. 10º do DL 229/2004.

  9. A lei criou um prazo novo de usucapião do direito a um apelido, pelo que, nos termos dos artºs. 296º e 297º do CC, o prazo só pode ser contado a partir da entrada em vigor do diploma, 9 de Janeiro de 2005.

  10. A R. contra alegou, pugnando pela negação da revista e confirmação do acórdão recorrido.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    Estão provados os seguintes factos: 1) A R. tem por objecto exclusivo o exercício em comum pelos sócios da profissão de advogado, com o fim de repartirem entre si os respectivos resultados (cfr. doc. de fls. 12 a 20) – (artigo 1º da petição inicial - não impugnado); 2) A A., AA, é cidadã nacional, tendo nascido na data de … de … de 19…, sendo sua mãe DD e seu pai EE, ou, com o nome completo, EE, falecido na data de 18 de Fevereiro de 2006 (cfr. Docs. de fls. 42 a 43) – (artigo 2º da petição inicial - não impugnado); 3) O pai da A...

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