Acórdão nº 0912/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução13 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP (IEFP, IP), devidamente identificado nos autos, recorre para este Supremo Tribunal do Acórdão do TCAS, de 20.04.17, que decidiu “negar provimento ao recurso, e manter a sentença recorrida”.

Na origem do recurso interposto para o TCAS esteve uma decisão do TAF de Sintra, de 22.07.16, que decidiu “anular a decisão impugnada, de revogação total do apoio financeiro concedido pelo Réu à Autora no valor de 5.760€; devendo manter-se na totalidade o apoio financeiro concedido, o que se traduz no pagamento do valor remanescente de 1440€” (cfr. fl. 84).

  1. O R., ora recorrente, apresentou alegações, concluindo do seguinte modo (cfr. fls. 165 a 172): “Da admissibilidade do presente recurso de revista 1ª Salvo o devido e elevado respeito, os fundamentos da decisão (que nem sequer foi unânime) contida no douto Acórdão recorrido suscitam a necessidade premente da sua apreciação não só com vista a uma melhor aplicação do direito, como também por a questão se revelar de importância fundamental no plano jurídico e social, reunindo o presente recurso de revista os pressupostos previstos no n.º 1 do art.º 150º do CPTA para ser decidida a sua admissão nos termos do n.º 5 da mesma disposição legal.

    1. A admissão da presente revista revela-se ser necessária para se obter uma melhor interpretação e aplicação do direito das medidas activas de emprego, em concreto no âmbito da Medida Estímulo 2013, criada pela Portaria n.º 106/2013, de 14 de Março, face à interpretação errada do disposto no art.º 4.º deste diploma que está subjacente no entendimento que obteve vencimento no douto Acórdão recorrido.

    2. Segundo o entendimento do douto Acórdão recorrido não houve incumprimento por parte do empregador da obrigação de proporcionar formação profissional, sem atentar na obrigação de resultado concreto ínsita no n.º 4 do art.º 4.º da Portaria, que exige que seja entregue, no termo da formação, cópia do respectivo certificado de formação.

    3. Com efeito, ao contrário do douto Acórdão recorrido, bem como do douto Parecer do M.P. citado no mesmo, o legislador da medida activa de emprego em causa não concebeu a obrigação do empregador de proporcionar formação profissional ao trabalhador apoiado, definida no n.º 1 do art.º 4.º da Portaria n.º 106/2013, como uma mera obrigação de 'meio' ou de simples 'formalidade', independentemente do trabalhador a frequentar ou não, ou até do resultado obtido.

    4. O legislador concebeu tal obrigação de proporcionar formação profissional como uma obrigação de 'resultado', implicando que, nos termos do n.º 4 do art.º 4.º da Portaria, no termo da formação, o empregador deve entregar ao IEFP, I.P. o relatório de formação elaborado pelo tutor, em conformidade com o modelo definido por regulamento específico, ou a cópia do certificado de formação emitido pela entidade formadora certificada [sublinhado nosso].

    5. O cumprimento dessa obrigação não se basta, pois, com a mera formalidade da empregadora declarar ter proporcionado, facultado, ou colocado à disposição da trabalhadora a formação profissional a que se obrigou, já que o legislador não se abstraiu da sua realização e frequência efectivas, bem como do respectivo resultado.

    6. O legislador nem sequer condicionou a sua exigência de entrega da cópia do certificado de formação a qualquer evento não imputável ao empregador: seja a hipótese de recusa ou de impedimento do trabalhador em frequentar a formação profissional, seja a falta de conclusão ou de aproveitamento da formação.

    7. Ao contrário, pois, do douto Acórdão recorrido, a Recorrida não satisfez, de facto, o desiderato a que se aponta no preâmbulo e no artº 1º da Portaria n.º 106/2013.

    8. Ora, face ao disposto nos n.ºs 1 e 4 do art.º 4.º da Portaria n.º 106/2013, não podia o douto Acórdão recorrido considerar que a entidade empregadora cumpriu a obrigação de proporcionar formação à trabalhadora apoiada, apenas com base na "vontade" da trabalhadora de não frequentar a formação, mas com a qual se conformou, sem nunca ter comunicado por escrito ao IEFP, I.P. tal situação, como também era sua obrigação.

    9. Na interpretação e aplicação do disposto no art.º 4.º da Portaria n.º 106/2013 subjacente ao douto Acórdão recorrido é claramente olvidado o que se encontra disposto no n.º 4 do preceito legal sobre a verificação do cumprimento ou não da obrigação de proporcionar formação profissional, pois a falta de entrega do certificado de formação obtido pelo trabalhador apoiado não pode deixar de constituir incumprimento da obrigação.

    10. É, pois, manifesta a necessidade da intervenção do Supremo Tribunal Administrativo nos presentes autos para obtenção de uma melhor aplicação do direito.

    11. Acresce que, também o muito douto voto de vencido da Veneranda Juíza Desembargadora do TCA Sul vem demonstrar a premente necessidade da admissão da presente revista para uma melhor aplicação do direito.

    12. De facto, com a devida vénia, o acto administrativo de concessão de subsídio está sujeito a cláusula modal por determinação legal, a qual consiste na obrigação da entidade patronal proporcionar formação profissional ao trabalhador, cujo incumprimento (do modo) determina a revogação de tal concessão, nos termos expressamente previstos no art.º 8.º, n.º 3, al. c) da Portaria n.º 106/2013.

    13. Daí que, tal como doutamente constata o voto de vencido, que o trabalhador queira ou não queira frequentar o curso de formação profissional é irrelevante no contexto do exercício de poderes revogatórios da Administração por incumprimento da cláusula modal, na medida em que se a entidade patronal aceitou a vontade do trabalhador em não frequentar o dito curso, do ponto de vista jurídico aceitou o não cumprimento da obrigação associada ao efeito jurídico do acto administrativo de concessão do subsídio.

    14. Além de que, afirma-se ainda o douto voto de vencido, o poder de direcção da entidade patronal nos termos plasmados no Código de Trabalho não se mostra suspenso quanto a este factor de formação profissional originária de [concessão] de subsídios públicos.

    15. A invocada recusa da trabalhadora em frequentar a formação profissional não pode, pois, exonerar a entidade patronal da obrigação assumida, na dimensão prevista no n.º 4 do art.º 4.º da Portaria n.º 106/2013, nem constituir causa excludente da revogação do acto de concessão do apoio financeiro por incumprimento.

    16. Por conseguinte, das doutas razões constantes do voto de vencido do Acórdão recorrido também sobressai uma clara necessidade da admissão da presente revista para uma melhor aplicação do direito.

    17. Por outro lado, no âmbito das medidas activas de emprego, definidas pelo Governo e executadas pelo IEFP, I.P., a questão de saber se o incumprimento da cláusula modal a que está sujeito o acto de concessão dos apoios financeiros previstos pode ou não ser afastado ou excluído por eventual recusa ou outra razão imputável ao trabalhador apoiado, assume uma grande relevância social e jurídica, sendo de importância fundamental na área das políticas de emprego, o que justifica plenamente que a mesma seja apreciada pelo Supremo Tribunal Administrativo.

    18. A manter-se o entendimento do douto Acórdão recorrido, os seus reflexos negativos nas medidas activas de emprego, em geral, e na Medida Estímulo 2013, em particular, seriam de tal monta que a sua continuidade estaria em causa.

    19. De facto, a manter-se aquele entendimento, estaria encontrada a fórmula para a subversão completa dos fins prosseguidos pelo legislador com a criação da Medida Estímulo 2013, pois bastaria a invocação por parte das entidades empregadoras, após a verificação do incumprimento e só em sede de audiência prévia, alegadas recusas dos trabalhadores em frequentar a formação profissional como justificação para o incumprimento da respectiva obrigação ou cláusula modal.

    20. Daí que, face a toda a potencial frustração do desiderato do legislador com a concessão do apoio financeiro em causa, sujeita a cláusula modal, resultante da eventual confirmação do entendimento do douto Acórdão recorrido, bem como a dimensão quantitativa e qualitativa das situações susceptíveis de ocorrer, com o seu inegável reflexo num desígnio prioritário do país como é o combate ao desemprego, demonstra a importância manifesta e fundamental da admissão da presente revista.

    21. As questões suscitadas pelo douto Acórdão recorrido, além de revelarem uma clara necessidade de apreciação pelo Venerando Supremo Tribunal Administrativo com vista a uma melhor aplicação do direito, não só extravasam o âmbito do caso concreto, como também assumem especial relevância social e jurídica no contexto das medidas activas de emprego como eixo de fundamental importância para o país no combate ao desemprego.

    22. Pelo que, verifica-se que estão cumpridos, cabalmente, os requisitos de admissão do recurso de revista previstos no art.º 150.º, n.º 1 do CPTA.

      Da procedência do presente recurso de revista 24ª O douto Acórdão recorrido enferma de vários vícios, traduzidos em erros de julgamento, que postulam a clara necessidade da sua revogação.

    23. Tal como muito melhor consta do douto voto de vencido, a invocada recusa da trabalhadora em frequentar a formação não basta ou não releva para a verificação do cumprimento da obrigação de proporcionar profissional à trabalhadora contratada no âmbito da Medida Estímulo 2013, pelo que o entendimento que obteve vencimento no douto Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento.

    24. Com efeito, como refere, com a devida vénia, o douto voto de vencido, o acto administrativo de concessão de subsídio está sujeito a cláusula modal (art.º 121.º do CPA/1991) por determinação legal (art.ºs 1.º e 4.º da Portaria n.º 106/2013, de 14 de Março), a qual consiste na obrigação da entidade patronal proporcionar formação profissional ao trabalhador, cujo incumprimento (do modo) determina a revogação de tal...

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