Acórdão nº 580/14.3TVLSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA
Data da Resolução05 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – AA instaurou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra a Cooperativa de Habitação BB, CRL, alegando, em síntese, que: Na qualidade de cooperador/fundador da Ré, realizou parte do capital social desta, através da subscrição de títulos nominais de capital, e, ainda no cumprimento dos seus deveres estatutários, fez sucessivas entregas de dinheiro, totalizando €62.493,89.

Foi, entretanto, excluído de cooperador, mas não obteve o reembolso das importâncias que lhe são devidas.

Com tais fundamentos, concluiu por pedir a condenação da Ré a restituir-lhe o montante dos títulos de capital realizados segundo o seu valor nominal, a quota parte dos excedentes e reservas não obrigatórias repartíveis na proporção da sua participação e ainda os respectivos títulos de participação, em montante não inferior a € 62.493,89, acrescido de juros de mora desde 8/05/2002.

A Ré contestou, sustentando que não lhe cabe restituir qualquer importância ao Autor, desse modo, pugnando pela improcedência da acção e a consequente absolvição do pedido.

Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar a afirmar a regularidade da instância, seguido da identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas de prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença que, na parcial procedência da acção, «condenou a Ré a restituir ao Autor a quantia que se vier a liquidar correspondente à redução do valor de €27.452,34 na proporção das perdas acusadas no balanço da Ré do exercício de 1998, quantia essa acrescida de juros à taxa legal desde 8 de Maio de 2002».

Discordando dessa decisão, apelaram ambas as partes, tendo a Relação de … determinado a ampliação da base factual (cfr. fls. 380 a 394), e, realizada nova sessão da audiência, foi proferida a sentença de fls. 525 a 531 que rematou com idêntico dispositivo condenatório, ou seja, «condenou a Ré a restituir ao Autor a quantia que se vier a liquidar correspondente à redução do valor de €27.452,34 na proporção das perdas acusadas no balanço da Ré do exercício de 1998, quantia essa acrescida de juros à taxa legal desde 8 de Maio de 2002».

Continuando inconformada, a Ré apelou, com parcial êxito, tendo a Relação de … revogado parcialmente a sentença e «condenado a Ré a restituir ao Autor a quantia que se vier a liquidar correspondente à redução do valor de €249,39 na proporção das perdas acusadas no balanço da Ré do exercício de 1998, quantia essa acrescida de juros moratórios, à taxa legal desde 6 de Maio de 2014».

Agora inconformado, interpôs o Autor recurso de revista, finalizando a sua alegação, com as conclusões que se transcrevem: A) O Acórdão Recorrido assenta numa premissa errada porquanto afirmar que, no caso em apreço, os títulos de investimento obrigatoriamente realizados pelo Recorrente são instrumentos diferentes dos títulos de participação previstos no art. 20º do DL n.º 502/99, porquanto, na realidade, tratam-se de uma e da mesma coisa, sucedendo apenas - há que admiti-lo! - que a terminologia utilizada nos Estatutos da Recorrida para designar o que materialmente constituem títulos de participação e de realização obrigatória - ao designá-los como "títulos de investimento" obrigatório - foi, porventura, infeliz. Nada mais. Na verdade, B) Tal como sucede nos contratos, em que o nomen iuris ou a qualificação que as partes lhes emprestem não devem tolher o intérprete na indagação do figurino jurídico que se lhe apresente, antes relevando o conteúdo das relações contratuais acordadas entre as partes e o modo como, na prática, essas mesmas partes lhes deram corpo e execução, também neste caso não nos devemos deixar confundir pela semelhança de nomes ou qualificativos dos títulos em presença, ficando reféns de um critério puramente formal e literal, mas antes atender à sua natureza material.

  1. Resulta do art. 20º do DL n.º 502/99 que a subscrição de títulos de participação consiste na entrega obrigatória de determinadas quantias por parte dos cooperadores com vista à amortização do valor total do custo do fogo, sendo essa, exatamente, a natureza e a finalidade das quantias aqui reclamadas, entregues pelo Recorrente à Cooperativa Recorrida sob a forma dos denominados títulos de investimento obrigatório (como decorre claramente quer do art. 10º dos Estatutos da Cooperativa Recorrida quer, igualmente, do "Escalonamento Previsional da Amortização do Terreno pelos Cooperadores", previsto no Anexo II ao documento n.º 14 junto com a Petição Inicial, onde se encontram descritas todas as quantias objeto de entregas obrigatórias pelo Recorrente e demais cooperadores com vista à amortização do valor global do respetivo terreno); D) Decidiu corretamente o Tribunal de primeira instância ao considerar que "o montante do título de capital realizado pelo A., acrescido do valor dos títulos de participação por ele realizados, ascende a € 27.452,34" e, ainda, que "...os títulos de investimento realizados pelo A. são equiparáveis aos títulos de participação mencionados no art. 20º do DL n. 502/99, atento o art. 10º dos estatutos da Ré".

  2. No caso concreto, os títulos de investimento previstos no art. 10º dos Estatutos da Recorrida - de realização obrigatória pelos cooperadores no valor global necessário à cobertura dos encargos para a aquisição do terreno destinado à construção das respetivas habitações - não se confundem, senão no nome, com os títulos de investimento previstos nos arts. 26º e segs. do Código Cooperativo, constituindo estes últimos verdadeiras obrigações, com natureza de títulos de dívida, supondo uma remuneração, integrando uma promessa de pagamento, não podendo exceder a importância do capital realizado e existente, de subscrição voluntária pelos cooperadores e podendo ser subscritos inclusive por terceiros não cooperadores.

  3. De resto, ao decidir como decidiu, o Acórdão recorrido encontra-se em contradição com os Acórdãos do mesmo TRL de 14-07-2011, processo n.º 7613/10.0TBOER.L1-2, e de 30-10-2014, processo n.º 3588/12.0YXLSB.BL1-8, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

  4. Os títulos de investimento obrigatório...

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