Acórdão nº 4247/11.6TBBRG-B.G1-A.S3 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelHENRIQUE DE ARAÚJO
Data da Resolução17 de Abril de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

PROC. N.º 4247/11.6TBBRG-B.G1-A.S2 REL. 22[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Nos autos de Reclamação de Créditos apensos à Insolvência de “AA, S.A.”, foi proferida sentença, nos termos do disposto no art.º 140.º do Código da Insolvência e de Recuperação de Empresas (CIRE), a qual, no segmento do reconhecimento dos créditos, decidiu nestes termos: “A lista a que alude o art. 129º do CIRE junta aos autos a fls. 1531 a 1541 inclui já as alterações resultantes das decisões proferidas nos incidentes das impugnações oportunamente apresentadas, sejam sentenças ou sentenças homologatórias … Nestes termos, e para além dos créditos reconhecidos nos apensos F) e G) e da rectificação antes determinada, homologo a lista de credores reconhecidos apresentados pelo Sr. AI que faz fls. 1531 a 1541 do presente apenso B) nos montantes e com as características aí referidas”.

Na parte atinente à graduação de créditos, graduou como “crédito garantido” por direito de retenção: i) o crédito de BB e CC, “sob condição do cumprimento do contrato-promessa”, relativamente ao bem imóvel descrito no auto de apreensão e arrolamento sob a verba n.º 14; ii) e o crédito da “DD, Ld.ª”, relativamente ao bem imóvel descrito no mesmo auto sob a verba n.º 18.

Relativamente ao crédito da sociedade “EE, Lda.”, graduou-o como crédito comum, relativamente ao bem imóvel descrito sob a verba n.º 16. Notificados os Credores, veio a “FF” interpor recurso daquela decisão, pedindo a sua revogação e que o seu crédito seja graduado em primeiro lugar no que respeita aos bens imóveis descritos nas verbas n.º 14 (fracção autónoma designada pela letra “…”, descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..., e inscrita na matriz no artigo ...) e n.º 18 (fracção autónoma designada pela letra “…”, descrita na mesma Conservatória sob o n.º … e inscrita na matriz no artigo ...), quanto à primeira por estar já extinto o direito de retenção do qual eram beneficiários os promitentes-compradores BB e CC, uma vez que o Sr. GG já cumpriu a promessa de venda e, quanto à segunda, por não assistir o direito de retenção à promitente-compradora, sociedade comercial “DD, Ld.ª”, visto não caber no conceito de “consumidor”, atenta a interpretação que foi acolhida pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência (AUJ) do S.T.J. n.º 4/2014, de 22 de Maio de 2013.

A Credora “DD, Lda.” contra-alegou, pugnando pela confirmação da decisão, na parte em que reconheceu e graduou o seu crédito como garantido, por gozar do direito de retenção sobre o imóvel. Subsequentemente à notificação do Sr. GG, foi junta aos autos a escritura pública de compra e venda da fracção autónoma prometida vender aos Credores BB e esposa, informando aquele que “inexiste nos autos crédito a favor” destes uma vez que ele, GG, “optou pelo cumprimento do contrato-promessa de compra e venda”. No mesmo processo a Credora “EE, Lda.”, notificada da sentença referida, veio aos autos requerer a sua reforma, corrigindo-se o que considera ter sido um “lapso manifesto” por o seu crédito não ter sido graduado, nos termos em que foi reconhecido, como crédito garantido face ao seu direito de retenção sobre a Fracção Autónoma designada pela letra “…”.

Opôs-se a credora “FF” e a Meritíssima Juiz indeferiu o pedido de reforma entendendo que o seu fundamento não se enquadra na previsão legal, sendo a decisão apenas sindicável pela via do recurso, por se encontrar esgotado o seu poder jurisdicional.

Inconformada, a referida credora recorreu desse despacho, pedindo que fosse declarada a sua nulidade e se ordenasse a sanação do vício de omissão de pronúncia de que enferma a sentença.

O Tribunal da Relação de ... julgou improcedente a apelação da recorrente “EE, Lda.” e procedente a apelação da FF, decidindo: “1. Eliminar da lista de credores os nomes de BB e esposa CC.

  1. Graduar os créditos que incidiam sobre o bem imóvel descrito na verba n.º … – Fracção “…” - do seguinte modo: 1º - crédito privilegiado do Estado relativo ao IMI de 2010; 2º - os créditos da “FF (credora n.º 26) garantidos por hipoteca registada a favor do “HH, S.A.”; 3º - do remanescente dar-se-á pagamento aos créditos comuns (incluindo os créditos laborais); 4º - se sobras houver pagar-se-ão os créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art.º 48.º do CIRE.

  2. Graduam-se os créditos que incidem sobre o bem imóvel descrito na verba nº 18 – Fracção “…” – pela ordem seguinte: 1º - o crédito privilegiado do Estado - IMI, 2010; 2º os créditos da “FF” (credora n.° 26), garantidos por hipoteca registada a favor do “HH, S.A.”; 3º do remanescente dar-se-á pagamento aos créditos comuns (incluindo aqui os créditos laborais - artigo 47.°, n.º 4, al. c), do CIRE e incluindo o crédito do credor n.º 157, “DD, Ld.ª”).

    1. do remanescente dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art. 48° do CIRE. No mais mantém-se a decisão proferida.

    Custas da apelação pela Apelada “DD, Ld.ª”, mas apenas na proporção do seu crédito (parte em que saiu vencida)”.

    As credoras reclamantes “DD, Lda.” e “EE, Lda.” interpuseram recursos de revista excepcional, com fundamento na contradição de julgados, nos termos do artigo 672º, n.º 1, alínea c), do CPC.

    A Formação, considerando não se verificar o requisito da dupla conformidade, rejeitou as revistas excepcionais, mas determinou que fosse apreciada a admissibilidade dos recursos como revistas normais.

    A “DD” concluiu as suas alegações de recurso do seguinte modo: 1. Dispõe a al. c), n.º 1, art. 672º do CPC que “excepcionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando: (…) o acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme”.

  3. O acórdão, ora em crise, está em contradição com um outro proferido pelo Tribunal da Relação de ..., no âmbito do processo n.º 1803/09.6TJVNF-D.G1, datado de 30.11.2010, publicado em www.dgsi.pt, pela relatora Maria Luísa Ramos, já transitado em julgado, cuja cópia, obtida no sítio da internet www.dgsi.pt, se junta.

  4. Entendeu o Venerável Tribunal da Relação de ... que a lista de créditos reconhecidos apresentada pelo Administrador da Insolvência nomeado, homologada por sentença de verificação e graduação de créditos, nos termos nela constantes, não obstante não ter sido impugnada quanto a determinado crédito por qualquer dos demais credores, não tem efeito vinculativo para o juiz, nem efeito preclusivo para o credor que não impugnou o crédito controvertido.

  5. Por sua vez, pugnou o mesmo Tribunal, no acórdão-fundamento, por tese oposta, designadamente no sentido de que não havendo impugnação da lista dos credores reconhecidos com fundamento na indevida qualificação, inclusão ou exclusão de créditos, ou na incorrecção dos respectivos montantes, é de imediato proferida sentença de verificação e graduação em que se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador da insolvência e se graduam os créditos, sendo que, decorrido o prazo legal para a impugnação, precludiu o direito de reclamação em relação a ele, não havendo lugar à admissão de tal acto por via do recurso da sentença.

  6. Os acórdãos em confronto foram prolatados no domínio da mesma legislação: Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, na redacção originária, constante do DL 53/2004, de 18 de Março.

  7. Os acórdãos em análise versam sobre a mesma questão fundamental de direito: os efeitos da falta de impugnação da lista definitiva de créditos apresentada pelo administrador da insolvência nomeado, ou seja, se apresentada a lista dos créditos reconhecidos pelo administrador da insolvência nomeado e decorrido o prazo legal para a impugnação sem que sobre o crédito controvertido tenha recaído reclamação, precludiu tal direito em relação a ele pelo interessado, não havendo lugar à admissão de tal acto por via do recurso da sentença de verificação e graduação em que se homologa a lista dos credores reconhecidos, à luz do disposto no art. 130º, números 1 e 3 do CIRE.

  8. Sobre a matéria controvertida inexiste acórdão de uniformização de jurisprudência conforme com o aresto recorrido.

  9. Não havendo impugnação da lista dos credores reconhecidos com fundamento na indevida qualificação, inclusão ou exclusão de créditos, ou na incorrecção dos respetivos montantes, é de imediato proferida sentença de verificação e graduação em que se homologa a lista de credores reconhecidos, elaborada pelo administrador da insolvência e se graduam os créditos, sendo que, decorrido o prazo legal para a impugnação, precludiu o direito de reclamação em relação a ele, não havendo lugar à admissão de tal acto por via do recurso da sentença.

    Por sua vez, a credora “EE” rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso do douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de ... que julgou a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida que indeferiu a alteração da sentença de verificação e graduação de créditos, não reconhecendo à recorrente o direito de retenção e, consequentemente, a natureza de ‘garantido’ do seu crédito.

    II. O acórdão recorrido faz uma errónea interpretação do direito aplicável, designadamente dos artigos 619º, 620º, n.º 1, 628º do CPC, 136º, nºs 3 e 7 do CIRE, arts. 595º, 596º e 599º do CPC, arts. 755º, n.º 1, al. f) e 442º do CC.

    III. São questões a decidir (às quais se imputa erro de julgamento): violação do caso julgado; nulidade por preterição de formalidades essenciais; a aplicação do artigo 755º, n.º 1, al. f) não depende de o promitente-comprador ser ou não um consumidor.

    IV. É entendimento unânime na jurisprudência e doutrina que tem força e autoridade de caso julgado material a decisão que...

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