Acórdão nº 01854/10.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução13 de Novembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório “L..., LDA.”, melhor identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 28/06/2011, que julgou improcedente a impugnação judicial contra a liquidação adicional de IVA do 4° trimestre de 2007 e respectivos juros, no valor total de 24.969,28€.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: 1.

A douta Sentença ora impugnada é nula, de harmonia com o preceituado no artigo 125.º, n.º 1 do C.P.P.T., na medida em que o M.mo Juiz do Tribunal “a quo” não procedeu à discriminação dos factos não provados, sendo que a tanto está obrigado, nos termos do n.º 2 do artigo 123.º do mesmo código.

  1. Ora, a falta de indicação dos factos não provados equipara-se, para efeitos da nulidade prevista no citado artigo 125.º, n.º 1 do C.P.P.T., e como nos diz o Venerando Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, à falta de indicação da matéria de facto provada.

  2. Ainda que assim doutamente se não entenda, o que apenas como mera hipótese académica se aventa, a verdade é que a douta sentença de que ora se recorre assenta numa insuficiência notória da fundamentação de facto, 4.

    nomeadamente no que respeita à questão essencial da legalidade do procedimento de inspecção que esteve na base das liquidações adicionais em IVA, referentes ao período de 2007/12T, que foram objecto de impugnação pela ora Recorrente.

  3. Com efeito, compulsado o elenco dos factos provados, constata-se que este é totalmente omisso quanto à forma como se desenvolveu a acção inspectiva, quais os motivos que a determinaram ou como teve dela conhecimento a contribuinte, 6.

    sendo que, no nosso modesto entendimento, a simples inclusão das conclusões exaradas no relatório da inspecção nesse elenco, que se dão, aliás, como reproduzidas na íntegra, não permite ultrapassar essa deficiente fundamentação.

  4. Não obstante, não se exime o M.mo Juiz do Tribunal “a quo” de se pronunciar e decidir quanto a essa natureza e fundamentos, circunstância que inevitavelmente conduz à necessidade de anular a decisão final no processo de impugnação.

  5. Não prescindindo, mais se dirá que na decisão ora sindicada o M.mo Juiz da primeira instância incorre em vício de interpretação e aplicação da lei, nomeadamente dos artigos 13.º, 37.º, 49.º e 50.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e ainda dos artigos 17.º e 21.º, n.º 1 c) da Sexta Directiva IVA e 19.º do C.I.V.A.

  6. Quanto ao procedimento de inspecção, a primeira consideração que se impõe é a de que a recolha de elementos junto do sujeito passivo, ainda que se tratasse de averiguar a legitimidade de um reembolso, nunca poderia preceder a emissão da ordem de serviço que a permitisse, 10.

    sendo ademais inquestionável que o carácter interno ou externo de uma inspecção se encontra legalmente definido no artigo 13.º do RCPIT, não estando dependente da qualificação dada pela Administração Tributária, em cada caso.

  7. Mais se entende que no caso em apreço se impunha a notificação prévia do contribuinte, relativamente ao início da acção inspectiva, a qual, ao não se verificar, conduz à invalidade do procedimento, 12.

    não sendo aplicável ao caso de verificação dos pressupostos de um reembolso a dispensa prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 50.º do RCPIT.

  8. Por outro lado, ao efectuar duas inspecções ao sujeito passivo, em prazo inferior a dois anos, a uma mesma situação de facto, incorreu a Administração Tributária numa violação do princípio da proporcionalidade, previsto nos artigos 5.º e 7.º do RCPIT e 63.º, n.º 3 da LGT.

  9. Também essa violação conduz à invalidade da acção inspectiva, com as legais consequências, designadamente a anulação das liquidações impugnadas.

  10. No que respeita à invocada necessidade de a ora Recorrente dever ter recorrido ao mecanismo de regularizações previsto no artigo 78.º do CIVA, impõe-se considerar que tal mecanismo assume natureza meramente facultativa e que, para a sua aplicação, sempre se encontraria a Recorrente dependente da vontade de terceiros em agir de um modo determinado, 16.

    pelo que, com vista a alcançar o objectivo supremo da neutralidade fiscal, não deve a Administração Fiscal deixar de admitir a possibilidade de a beneficiária das facturas recorrer ao mecanismo da dedução, a fim de lhe ser restituído um valor que lhe foi indevidamente liquidado 17.

    e cuja retenção, por parte do Estado Português constitui, para todos os efeitos, um enriquecimento ilícito.

  11. Tal solução não se opõe às regras e princípios estruturantes do Sistema Comum de IVA, nomeadamente no que concerne ao exercício do direito à dedução.

  12. A decisão ora sindicada, ao restringir ao mecanismo das regularizações, previsto no artigo 78.º do CIVA, a possibilidade da Recorrente recuperar o valor do imposto sobre o valor acrescentado indevidamente entregue ao Estado Português consubstancia uma errónea interpretação e aplicação dos artigos 17.º e 21.º, n.º 1 c) da Sexta Directiva IVA e do artigo 19.º do CIVA.

    TERMOS EM QUE considerado procedente o presente recurso deve a douta Sentença recorrida ser revogada, proferindo-se, em conformidade, decisão que determine a anulação das liquidações adicionais em sede de IVA, referentes ao período de 2007/12T, assim se actuando em conformidade com a lei e se fazendo JUSTIÇA!****A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

    ****O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 110, no sentido da improcedência do recurso.

    ****Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

    ****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir: - Nulidade da sentença, por não discriminação dos factos não provados; - (I)legalidade do procedimento de inspecção tributária; - (I)legalidade das correcções efectuadas - possibilidade de recuperação do IVA.

    1. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância, com relevância para a decisão da causa, foram considerados provados os seguintes factos: 1. Na sequência de uma acção inspectiva desenvolvida pela Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Viana do Castelo, ao abrigo da ordem de serviço n.° OI200800196, de 2008/11/28, relativa ao exercício de 2007 (iniciada em 2008/12/04 e terminada em 2008/12/09), determinada por irregularidades em sede de IVA, detectadas no âmbito de outra acção inspectiva, de carácter externo, efectuada à contribuinte, emitiu a D.G.I. as seguintes liquidações adicionais referentes ao período de 2007/12T, ambas datadas de 2009/01/29 e devidamente notificadas ao contribuinte: - Liquidação de imposto n.º 09006404, no valor de € 24.108,00 - Liquidação de juros n.° 09006405, no valor de € 861,28.

  13. Não aceitando como válidas tais liquidações, a Impugnante não procedeu ao seu pagamento voluntário, razão pela qual lhe foi entretanto instaurado procedimento executivo para cobrança coerciva, o qual foi autuado com o n.° 2348200901012541 e corre termos no Serviço de Finanças de Viana do Castelo, encontrando-se actualmente suspenso o procedimento, em virtude de prestação, pela contribuinte, de garantia idónea; 3. Mais procedeu a aqui impugnante à apresentação de reclamação graciosa, a qual, considerada improcedente pela Administração Fiscal, motivou a interposição de recurso hierárquico; 4. As liquidações reclamadas foram emitidas com fundamento nas conclusões de uma acção inspectiva, que constam do respectivo relatório final de inspecção tributária junto aos autos (e que aqui se dá por integralmente reproduzido) e de onde consta o seguinte: - A ora Recorrente solicitou o reembolso de IVA, no montante de €27.424,28, com referência ao período 2007-03T, o qual lhe veio a ser pago em 2007-08-30; - A coberto de despacho interno, foi apreciado o aludido reembolso, tendo sido detectadas algumas irregularidades ao nível da dedução de imposto; - Face a tais anomalias, procedeu-se a acção inspectiva interna, no âmbito da qual se apuraram correcções, nos montantes de €2.390,20, €21.924,00, €2.184,00, com referência aos períodos de tributação de, respectivamente, 2004-12T, 2006-12T e 2007-03T. O imposto corrigido foi pago; - Tais correcções assentaram no facto dos documentos não possuírem os elementos constantes do artigo 35° (actual artigo 36), do CIVA, e Ofício-Circulado n.° 181044, de 1991-12-06, do Gabinete do Subdirector-Geral dos impostos para a área do IVA, além do facto de tais operações não estarem sujeitas a IVA, por serem praticadas em Espanha sobre bens imóveis, em conformidade com o disposto na alínea a), do nº 5, do artigo 6.º, do CIVA (na redacção em vigor até 31 de Dezembro de 2009); - No período de tributação de 2007-12T a ora Recorrente declarou, no campo 40 (regularizações a favor do sujeito passivo), do quadro 06, da respectiva declaração periódica, o montante de €24.108,00, o qual contribuiu para um crédito de imposto de €26.231,28, relativamente ao qual solicitou o reembolso, o qual lhe foi pago, em 2008-05-30; - Dos elementos recolhidos, verificou-se que o montante declarado, no aludido campo 40, respeita ao imposto que lhe havia sido corrigido relativamente aos períodos de 2006-12T e 2007-03T e tem por base facturas de substituição e autos de medição que lhes foram anexos; - Embora os respectivos prestadores de serviços tivessem procedido à emissão de segundos vias de facturas, com vista a corrigir as omissões constantes das inicialmente processadas, o imposto constante em tais documentos não se mostra dedutível, dado que foi liquidado relativamente a operações não sujeitas a IVA, em território nacional; - Nos termos do artigo 6.°, nº 5, alínea a), do CIVA (na redacção em vigor até...

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