Acórdão nº 00486/12.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução10 de Outubro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Instituto dos R e N, I. P.

(… Lisboa), interpõe recurso jurisdicional de decisão proferida pelo TAF de Viseu, que, em acção administrativa especial, intentada por CSSC (…) anulou “o acto administrativo que considerou injustificada a falta dada pela Autora em 13 de Março de 2012 e, consequentemente, condenando a Entidade demandada à prática de acto administrativo consubstanciado na justificação da falta dada pela Autora”.

O recorrente formula as seguintes conclusões de recurso: 1ª) Ao julgar procedente a presente ação, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu incorre em erro de julgamento da matéria de facto (visto que não faz uma adequada seleção e fixação da matéria de facto relevante e faz uma errada apreciação da prova), bem como em erro de julgamento da matéria de direito (porquanto, faz uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso em apreço).

  1. ) A questão subjacente à ação sub judice é a de saber se o ato impugnado, ao julgar injustificada a falta dada pela A. no dia 13/03/2012 viola a lei, nomeadamente a alínea f) e d) do nº 2 do artigo 185º do RCTFP, pelo que, e nessa conformidade, não revestem de qualquer interesse para a sua apreciação e decisão os factos constantes dos pontos 1), 2), 5), 6), 17) e 18) da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo.

  2. ) Ademais, os factos constantes dos pontos 4), 15) e 16) da matéria de facto nunca poderiam ser dados como provados, atenta a prova efetivamente produzida.

  3. ) Dos documentos 2 e 3 juntos com a petição inicial não resulta que não exista no arquipélago dos Açores a especialidade de cirurgia reconstrutiva (mas tão somente que essa especialidade não existe no Hospital da H, nem na Ilha do Pico).

  4. ) E dos documentos 9 e 10 juntos pela ora recorrida, resulta que a falta respeita ao dia 23/12/2009, ao passo que o teor do documento 11 evidencia que as faltas que foram consideradas justificadas ao abrigo da alínea f) do nº 2 do artigo 185º do RCTFP se referem a meio dia, no período da tarde, do dia 3 de novembro de 2009 e aos dias 4, 5, 6, 9, 10, 11 e 12 de novembro de 2009 (resultando ainda, do aludido documento 11 que tais faltas foram consideradas justificadas por despacho 11/12/2009 do Diretor do Departamento, e não “em 15/01/2010 por despacho da Coordenadora do Setor” como, erradamente, se deu por provado).

  5. ) O cerne da questão em apreço é aferir se a deslocação da A. a Coimbra e a sua ausência ao serviço durante todo o período normal de trabalho do dia 13/03/2012 eram ou não imprescindíveis para que esta pudesse ser consultada na especialidade de “cirurgia reconstrutiva”, pois, do estatuído na alínea f) do nº 2 do artigo 185º do RCTFP resulta que são requisitos da justificação da ausência do trabalhador que esta seja motivada pela necessidade de realização de consulta médica, que tal consulta não se possa realizar fora do período normal de trabalho, bem como que tal ausência se verifique apenas pelo tempo estritamente necessário (à realização da consulta).

  6. ) O facto de ser impossível realizar a consulta fora do período normal de trabalho e o facto da ausência no local de trabalho durar apenas o tempo estritamente necessário, são factos constitutivos do direito do trabalhador em ver justificada a sua falta.

  7. ) Nessa medida - atento o disposto artigo 342.º do CC, aplicável ex vi artigo 90º/2 do CPTA, - cabe a quem invoca um direito o ónus da prova dos respetivos factos, pelo que caberia à ora recorrida alegar e comprovar tais factos, o que não sucedeu! 9ª) E, conforme resulta do previsto no artigo 344º do CC a eventual dificuldade que a parte possa ter em provar o facto negativo não é relevante para determinar uma inversão do ónus da prova – assim, e por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Processo:0327/08) de 17 de dezembro de 2008, 10ª) Acresce que a decisão recorrida incorre, outrossim, no vício de erro no julgamento da matéria de direito, porquanto, e desde logo, seguindo acriticamente o alegado pela A. assume que o ato impugnado assenta na premissa de que o R. pretende que a A. utilize dias de férias para efetuar consultas /ou exames – cfr. página 11 do aludido aresto.

  8. ) Tal não corresponde à verdade, visto que o que resulta do ato impugnado é que, não sendo possível subsumir a falta dada pela aqui recorrida no dia 13/03/2012, ao estatuído nas alíneas nas alíneas d) e f) do artigo 185º/2 do RCTFP, tal falta é considerada como injustificada.

  9. ) O ora recorrente, apenas admite, com vista a possibilitar à A. subtrair-se aos efeitos legais decorrentes de tal injustificação, permitir àquela que - caso assim o entenda - possa requerer a substituição desse dia de falta por dia de férias, ao abrigo do disposto no artigo 193º/2 do RCTFP.

  10. ) O que, de todo, não equivale a pretender que a A. utilize as suas férias para a realização de consultas ou outros exames médicos.

  11. ) A ora recorrida não demonstrou (pois nem sequer alegou) que não era possível efetuar a consulta em apreço fora do período normal de trabalho, ou que era impossível reduzir o tempo de ausência no local de trabalho durante esse mesmo período.

  12. ) E estatuindo a alínea f) do nº 2 do artigo 185º do RCTFP que são consideradas faltas justificadas “As motivadas pela necessidade de (...) realização de consultas médicas (...) que não possam efetuar-se fora do período normal de trabalho e só pelo tempo estritamente necessário”, recaía sobre aquela o ónus de comprovar tais factos.

  13. ) Sem embargo de assim ser, e em clara violação do estatuído no artigo 342.º do Código Civil, o aresto impugnado assume que seria o ora recorrente que deveria comprovar o contrário (entenda-se, provar que era possível realizar tal consulta fora do período normal de trabalho, ou noutro local que permitisse à trabalhadora em apreço reduzir o tempo de ausência) – cfr. 2º § da pág. 15 do acórdão impugnado.

  14. ) Visto que a fundamentação para a exigência, feita pelo recorrente à A., no sentido de esta demonstrar a imprescindibilidade da sua deslocação ao continente para realização de consulta decorre diretamente do estatuído na citada alínea f) do nº 2 artigo 185º do RCTFP e das regras gerais da repartição do ónus da prova (nomeadamente, no artigo 342.º do CC), só uma errada interpretação de tais preceitos legais, pode ter conduzido o Tribunal a quo a decidir que tal exigência “carece de sustentação”.

  15. ) Não se nega à recorrida a liberdade de escolher os locais e médicos especialistas em que entenda ser consultada e acompanhada, todavia, o que não pode é aquela pretender que essa sua liberdade de escolha - quando não respeite os condicionalismos prescritos na alínea f) do nº 2 do artigo 185º do RCTFP - obtenha a tutela do direito, designadamente o benefício de considerar justificada essa sua ausência no local e período normal de trabalho! 19ª) Pelo que, ao determinar que: “(...) o ato impugnado, ao considerar como falta injustificada a dada pela Autora no dia 13 do mês de Março de 2012, violou, nomeadamente a al. f) e d) do nº 2 do artigo 185º do RCTFP, bem como os artigos 86º e segts. do CPA e o princípio da boa-fé consagrado no 6º A do CPC e no 266, nº 2 do CRP:” o aresto impugnado faz uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso em apreço, em clara violação do estatuído no artigo 185º/2 do RCTFP (em particular na sua alínea f)) em conjugação com o disposto no artigo 342º do CC, aplicável ex vi artigo 90º/2 do CPTA.

    20º) Com efeito, não tivesse o aresto impugnado incorrido nos vícios de erro no julgamento da matéria de facto e de direito, teria forçosamente concluído pela improcedência da presente ação, porquanto, a ora recorrida não logrou comprovar a verificação dos requisitos de que dependia a possibilidade de justificação da sua falta nos termos legais, nomeadamente ao abrigo do estatuído nas alíneas d) e f) do artigo 185º/2 do RCTFP.

  16. ) Contrariamente ao que pretende a recorrida e admite o próprio acórdão impugnado, não é a atuação do ora recorrente que é violadora do princípio da boa-fé, mas antes, a atitude da recorrida, que, reiteradamente e desde 2010 – vejam-se artigos 36º, 37º, 38º, 39º, da contestação – vem fazendo uso do expediente de intercalar a realização de consultas médicas no continente, com a marcação de dias de férias.

  17. ) Bem andou, portanto, o ora recorrido ao considerar tal falta injustificada, não padecendo, pois, tal decisão de nenhum dos vícios que lhe imputa a recorrente e o acórdão recorrido.

    A recorrida apresentou contra-alegações, onde concluiu: 1.

    O Acórdão recorrido, tendo considerado procedente a pretensão da Autora/Recorrida, procedeu a uma correcta aplicação do direito aos factos, não tendo a menor razão a recorrente nas suas alegações.

    1. Estava em causa na presente acção o despacho da Vice-Presidente do Réu que considerou injustificada a falta da Autora no dia no dia 13 do mês de Março de 2012.

    2. Ausência que, como o Recorrente nunca colocou em causa, não lesou o interesse público e/ou a "organização do serviço" já que foi devidamente acautelada e compensada pelo trabalho da Autora.

    3. A informação 188-A/2012-SARH de 30-12-2011 (cfr.

      Doc. 1) que fundamentou o acto impugnado não atendeu às razões invocadas pela Autora e/ou às declarações do Médico da Unidade de Saúde da Madalena Pico e do Prof. Doutor AN.

    4. Sendo que, tal é feito sem qualquer referência à razão pela qual não se consideraram tais declarações ou sem ser feita prova em sentido oposto.

    5. O que, desde logo, se revela inaceitável e ilegal por violação não só das normas que regulam a instrução de um procedimento administrativo (cfr. os artigos 86º e segts do CPA) como também da boa-fé legal e constitucionalmente prevista (cfr. Art. 6º-A do CPA e 266º nº2 da CRP).

    6. O recorrente, abstraindo do facto de estar aqui em consideração a impugnação de um acto administrativo em que um dos vícios apontados ao longo do procedimento administrativo era a...

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