Acórdão nº 00183/06.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 19 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO.
ACS, residente no …, inconformado, interpôs recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Braga, proferido em 30 de maio de 2014, que julgou improcedente a ação administrativa especial de pretensão conexa com atos administrativos que intentou contra o MUNICÍPIO DE F...
e o contrainteressado AMM e, em consequência, absolveu a entidade demandada dos pedidos de: (i) declaração de nulidade do despacho de licenciamento do projeto de construção do anexo; (ii) A declaração de caducidade desse ato de licenciamento; (iii) declaração de impossibilidade de legalização do anexo e da sua utilização como cozinha; (iv) declaração de nulidade do despacho de licenciamento da chaminé; (v) condenação do Município de F... a ordenar ao contrainteressado a cessação de utilização e demolição do anexo, muros e chaminé e de (vi) condenação dos titulares do Município de F... responsáveis pela execução da decisão ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória nos termos do art. 169.º do CPTA.
*O RECORRENTE apresentou alegações e formulou as seguintes CONCLUSÕES que aqui se enunciam: «1- A sentença recorrida considerou que não operou a caducidade da licença de construção do anexo, em virtude de não ter existido uma declaração emitida pelo R. Município de F...; 2- No entanto, atenta a factualidade dada como provada, não pode deixar de considerar-se que a licença emitida ao contra-interessado já havia caducado em 08/09/2001, nos termos do disposto nos artigos 23º, nº1, d) e 20, nºs 5 e 6, do Decreto-lei nº 445/91, de 20/11; 3- A caducidade opera por si, sendo desnecessário um acto expresso a declará-la, pelo que, constituindo uma forma de extinção de direitos resultante do seu não exercício durante um determinado prazo, extinto o direito ele deixa de existir, saindo, em virtude da caducidade, da esfera jurídica do seu titular; 4- Caducada a licença, a mesma já não existe, pelo que é juridicamente impossível o R. Município de F... poder suportar - se nela para proceder à legalização das obras em causa; 5- E, de acordo com o disposto no referido artigo 23º do Decreto- Lei nº 445/91, de 20/11, “a licença de construção caduca se as obras não forem concluídas no prazo fixado na licença ou no prazo estipulado pelo presidente da câmara municipal”, pelo que a caducidade opera ope legis; 6- Assim, todos os actos e despachos praticados após aquela caducidade, mormente, a licença de utilização, jamais poderiam ser praticados, uma vez que a “licença primitiva” já havia caducado, sendo certo que, uma vez praticados, não têm qualquer efeito; 7- Devendo, o R. Município de F..., atenta a caducidade da licença, ordenar a sua cassação bem como a demolição da obra; 8- Sendo certo que não existe qualquer conflito de competências entre o poder jurisdicional e a Administração, quando o Tribunal condena aquela a proferir um acto que é legalmente devido; 9- A falta de parecer obrigatório da Direcção Geral dos Serviços de Urbanização prévio à operação do loteamento acarreta a nulidade de todos os actos praticados e respeitantes ao loteamento; 10- Pelo que, dado que a validade do loteamento, bem como as sucessivas alterações dependem daquele parecer, são nulos e de nenhum efeito todos os actos das câmaras municipais respeitantes a operações de loteamento quando não sejam precedidos da audiência da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização (artigo 14º, do Decreto-Lei nº 289/73, de 06/06); 11- No caso dos presentes autos, o R. Município de F... não solicitou qualquer parecer à Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, pelo que o loteamento é nulo, sendo também nulo o despacho de 31/05/2000, que licenciou o projecto de construção do anexo e o despacho de 02/07/2002, que deferiu a construção da chaminé no anexo; 12- O acto de licenciamento é o acto primário que regula pela primeira vez uma realidade com relevância jurídico-administrativa e como acto permissivo que é, permite a adopção de uma conduta ou omissão de um comportamento que de outro modo lhe estariam vedados; 13- O licenciamento da construção do anexo viola o PDM de F..., por ultrapassar a área de construção permitida naquele lote, que correspondia à área original da habitação, dado que apresenta uma área de implantação de 35 m2, a qual ultrapassa a percentagem máxima de ocupação do lote prevista no art.º 53.º, n.º 1 al. c), do regulamento do PDM de F..., que a fixa em 35% da área; 14- É, também, nulo o licenciamento do anexo em virtude de a sua construção violar o regulamento do loteamento, pois este não prevê a construção de anexos nos logradouros dos prédios; 15- E bem assim a respectiva licença de utilização, uma vez que esta não pode ser dissociada da licença de construção, na medida em que se destina a comprovar a conformidade da obra concluída com o projecto aprovado e condições do licenciamento e com o uso previsto no alvará de licença de construção; 16- São nulos os actos de fraccionamento e, bem como a celebração dos negócios jurídicos relativos a terrenos, compreendidos em loteamentos, sempre que, nas respectivas escrituras, instrumentos, títulos de arrematação ou outros documentos judiciais ou notariais, se não indique o número e data do alvará em vigor (artigo 27º, do Decreto-Lei nº 289/73, de 06/06); 17- O loteamento no qual foi edificado o anexo configura uma verdadeira Área Urbana de Génese Ilegal (AUGI), na medida em que se tratam de prédios ou conjuntos de prédios contíguos edificados sem a competente licença de loteamento, a qual é legalmente exigida; 18- A sentença recorrida viola, para além de outros, os artigos 23º, nº1, d) e 20,º nºs 5 e 6, do Decreto-lei nº 445/91, de 20/11, os artigos 1º, 2º, 14º e 27º, do Decreto-Lei nº 289/73, de 06/07 e os art.ºs 93.º, 94.º e 106.º do Decreto-Lei 555/99, de 16 de Dezembro».
Termina requerendo o não provimento do recurso, com a consequente revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que julgue a ação procedente.
*O RECORRIDO apresentou contra alegações, no sentido da improcedência do recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: «I – A douta sentença recorrida, está bem fundamentada, quer de facto, quer de direito, sendo assim, formal e materialmente, uma sentença justa.
II – A cujo teor se adere, o que, por si só, infirmará os fundamentos do recurso, já analisados e decididos pelo Tribunal recorrido».
*O Contrainteressado AMM contra alegou, mas não formulou conclusões, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido, por ter feito uma correta avaliação dos factos e aplicação do direito.
* A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal, notificada nos termos e para os efeitos previstos no artº 146º do CPTA, pronunciou-se sobre o mérito do recurso, nos termos que constam do parecer de fls.461 a 463 dos autos, pugnando pelo seu não provimento.
*Os autos foram submetidos à Conferência para julgamento, depois de colhidos os respetivos vistos.
*II. QUESTÕES A DECIDIR Tendo em conta as proposições conclusivas com que o Recorrente remata as suas alegações, as questões que nesta instância recursiva se colocam passam por saber se: (i)A invocação do erro de julgamento da decisão recorrida traduzido na alegada não consideração de que o loteamento no qual foi edificado o anexo configura uma verdadeira AUGI sem a competente licença de loteamento, a qual é legalmente exigida, constitui uma questão nova.
(ii) Se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de direito por considerar, que nos termos do disposto nos artigos 23.º, n.º1, al. d) e 20.º, n.ºs 5 e 6, ambos do D.L. n.º 445/91, de 20/11, não se verifica a caducidade da licença de construção referente ao anexo do contrainteressado; (iii) Se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de direito por ter considerado não verificada a nulidade de todos os atos praticados [despacho de 31/05/2000, que licenciou a construção do anexo e de 02/07/2002, que deferiu a construção da chaminé no anexo] e respeitantes ao loteamento por falta do parecer obrigatório da Direcção Geral Dos Serviços de Urbanização, por assim violar o disposto no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 289/73, de 06/06; (iii) Se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de direito por ter considerado que o licenciamento da construção do anexo não viola o PDM de F...; (iv) Se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de direito por ter considerado que o licenciamento da construção do anexo e a emissão da licença de utilização não viola o regulamento do PDM;* III.FUNDAMENTOS III.1. MATÉRIA DE FACTO Da decisão judicial recorrida resultam assentes os seguintes factos: «1. No ano de 1977 a Câmara Municipal de F... (doravante CMF) adquiriu um conjunto de prédios rústicos sitos S. J…, destinados à construção de habitações de caráter social. - fls. 52 e ss., 66 e ss., 76 e ss.. – cfr. do p.a. Bairro de S. J…/Urbanização de C… junto aos autos.
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A Câmara Municipal de F..., através do Gabinete de Apoio Técnico do Alto Ave, elaborou projeto de urbanização para a realização da Urbanização Monte de S. J… – C..., incluindo planta de loteamento cujo teor aqui se dá por reproduzido.- cfr. doc. de fls. 74 do p.a. Bairro de S. J.../Urbanização de C... junto aos autos.
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Do projeto referido no ponto anterior resulta o emparcelamento dos prédios referidos em 1. e a sua posterior divisão em lotes, com vista à construção de moradias unifamiliares geminadas, identificadas por números. – cfr. docs. de fls. 1 e ss. do p.a. Bairro de S. J.../Urbanização de C... junto aos autos.
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Do referido projeto de loteamento consta que a casa n.º 4 tem a área de 237 m2. – cfr. doc. de fls. 1 e ss. e 101 do p.a. Bairro de S. J.../Urbanização de C... junto aos autos.
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Não foi emitido alvará de loteamento respeitante à Urbanização Monte de S. J... – C.... – cfr. doc. de fls. 132 do pa Bairro de S. J.../Urbanização de C... junto aos autos.
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O processo de Urbanização Monte de S. J... –...
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