Acórdão nº 00419/13.7BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução24 de Abril de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O ISS.IP/Fundo de Garantia Salarial, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por AMPL, tendente a impugnar o Despacho de 18 de Junho de 2013, do Presidente do Conselho de Gestão do FGS que indeferiu “o requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho apresentado...”, inconformado com o Acórdão proferido em 23 de Junho de 2014, através do qual foi julgada procedente a Ação, mais condenando a “EPD (Entidade Pública Demandada), a apreciar o requerimento do A.” veio interpor recurso jurisdicional do mesmo, proferido em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.

Formula o aqui Recorrente/FGS nas suas alegações de recurso, apresentadas em 13 de Agosto de 2014, as seguintes conclusões: “1. O presente recurso vem interposto da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou a ação administrativa procedente, e, em consequência, decidiu anular o despacho de 18 de junho de 2013, proferido pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, que indeferiu ao A. o requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, condenando o R. a apreciar o requerimento apresentado, com as necessárias adaptações, atendendo à norma “ad hoc” criada pela presente decisão e tendo por referência o Processo Especial de Revitalização, intentado pela entidade empregadora do A. e respetivo despacho judicial em que foi nomeado o administrador judicial provisório; 2. O âmbito objetivo do presente recurso cinge-se à questão de saber se cumpria ao tribunal estabelecer a seguinte norma “ad hoc” para a resolução concreta do caso sub judice “O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo 317º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, nos casos em que o empregador recorra a um processo especial de revitalização e o juiz não recuse a nomeação de administrador judicial provisório”; 3. O Tribunal “ a quo ” considerou que “ o regime jurídico estabelecido nos artigos 317º a 326º do RCT de 2004 ainda não se adaptou aos novos processos de revitalização, no entanto, o legislador dá indicações claras de que não foi sua intenção desproteger os trabalhadores cujas entidades empregadoras recorram ao PER ou ao SIREVE. A integração das lacunas da lei impõe-se face à obrigação resultante do artigo 8º n.º 1 do CC, que estabelece uma obrigação de julgar e dever de obediência à lei, o tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio. Estando o tribunal perante uma situação que merece a tutela do direito, atento o preceituado no artigo 336º citado, as regras jurídicas que subjazem ao PER ou ao SIREVE, os princípios de direito comunitário e a própria exigência comunitária relativa ao FGS, impõe-se a proteção jurídica dos trabalhadores quando os empregadores recorram a um PER”; 4. Ora, salvo o devido respeito pela opinião sufragada pela decisão recorrida, entendemos que o Meritíssimo Juiz “ a quo ” fez uma errada interpretação da lei aplicável ao caso em apreço; 5. O Estado, através da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, veio regulamentar o Fundo de Garantia Salarial, sendo que, nos artigos 318º e 324º, veio definir quais as situações abrangidas, em que são assegurados em caso de incumprimento pelo empregador, ao trabalhador, o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação e quais os meios de prova necessários para a instrução do requerimento; 6. Fazendo apelo ao elemento teleológico, nomeadamente, da norma do artigo 318º nºs 1 e 2, foi preocupação do legislador impor que, o Fundo de Garantia Salarial assegurasse em caso de incumprimento pelo empregador, ao trabalhador, o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, nas situações em que o empregador fosse judicialmente declarado insolvente e igualmente, desde que tenha iniciado o procedimento de conciliação; 7. Não tem a mínima correspondência na letra da lei a interpretação de que o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo 317º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, nos casos em que o empregador recorra a um processo especial de revitalização e o juiz não recuse a nomeação de administrador judicial provisório; 8. Como na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9º nº 3 do Código Civil), no sentido de referir que o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos, nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente e igualmente, desde que, tenha iniciado o procedimento de conciliação; 9. Com, efeito, o Tribunal “ a quo ” ao decidir que deve ser estabelecida a seguinte norma “ad hoc” para a resolução concreta do caso sub Júdice “O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo 317º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, nos casos em que o empregador recorra a um processo especial de revitalização e o juiz não recuse a nomeação de administrador judicial provisório encontra-se a ultrapassar a limitação imposta por Lei; 10. Só é lícito extrair um certo sentido ou alcance às normas contanto que esse mesmo sentido ou alcance tenha um mínimo de correspondência verbal na letra da lei (artigo. 9º n.º 2 do Código Civil), pois, caso contrário, não se interpreta a lei, outrossim se altera a lei por via jurisprudencial; 11. A norma do artigo 318º nºs 1 e 2 da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, não pode ser aplicada analogicamente, ou interpretada extensivamente, de forma a abranger situações que extravasam a sua previsão legal, que é assegurar o pagamento dos créditos, nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente e, igualmente o pagamento dos créditos, desde que se tenha iniciado o procedimento de conciliação; 12. Na verdade, não é possível, face à proibição decorrente do princípio da legalidade (Cfr. artigo 266º da Constituição da República Portuguesa) e da tipicidade, recorrer-se às regras gerais de interpretação e integração da lei, designadamente à reconstituição do espírito ou intenção legislativa, à unidade e harmonia do sistema jurídico, à analogia (cfr. artigo 10º, nº 3, do Código Civil) ou à “norma” que o próprio intérprete criaria, se houvesse que legislar dentro do espírito do sistema (id. artigo 10,º, nº 3, do Cód. Civil); 13. Em resultado da consagração legal do princípio da legalidade, nem o arbítrio judicial, nem a analogia, nem os princípios gerais de direito, nem a moral, nem o costume, poderão, em quaisquer circunstâncias, suprir lacunas que o sistema apresente, cabendo à lei, e só à lei a responsabilidade de o fazer; 14. No caso referido no artigo 318º n.º 1 e 2 da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, o legislador estabeleceu uma disciplina jurídica própria no que respeita aos casos em que o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos, pelo que inexistindo qualquer lacuna, não há que fazer apelo à analogia, designadamente aplicando a esses casos o disposto no artigo 10.º nºs 1 e 2 do Código Civil; 15. Não existe qualquer omissão de regulamentação para cujo preenchimento haja necessidade de fazer uso dos princípios decorrentes do artigo 10.º do Código Civil, sendo que, o legislador delimitou o âmbito das situações em que há lugar ao pagamento dos créditos em caso de violação ou cessação do contrato de trabalho e não em situações como a que se discute nos presentes autos; 16. A interpretação que é feita pelos Tribunais, vulgo interpretação judicial, está sujeita às regras legais sobre interpretação, não lhe cabendo, por princípio, sob a aparência da simples interpretação, o poder de criar normas; 17. Da mesma forma, considerar a posteriori, que as normas que regulamentam o Fundo de Garantia Salarial, nomeadamente, a que faz referência o artigo 318º n.º 1 e 2 da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho se aplicam a outras situações, constituiria violação do principio da igualdade, pois, caso assim não se entendesse estar-se-ia a permitir, quiçá, que as entidades empregadoras que, nomeadamente, não tenham recorrido a um processo especial de revitalização o pudessem vir a fazer agora; 18. O referido princípio aludido no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa seria violado com a aplicação retroativa da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, na medida em que permitiria, agora, que situações idênticas fossem tratadas de forma diferente, sendo certo que tal princípio impõe o tratamento das situações iguais de forma igual e das diferentes de forma diversa, na justa medida da diferença; Acresce que 19. Seria, igualmente inconstitucional a interpretação da norma do artigo 318º nºs 1 e 2 no sentido de que abrangerá, igualmente, o caso em que o empregador recorra a um processo especial de revitalização, por violação do Princípio da Separação de Poderes (artigos 2.º e 111.º n.º 1 da CRP), já que corresponderia a uma substituição do Poder Legislativo, devidamente expresso e exercido de forma consciente pelos Tribunais; 20. Não basta pois sentenciar, como se fez na decisão judicial proferida, que ao tribunal cumpre estabelecer a seguinte norma “ad hoc” para a resolução concreta do caso sub Júdice “O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo 317º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, nos casos em que o empregador recorra a um processo especial de revitalização e o juiz não recuse a nomeação de administrador judicial provisório”; 21. A sentença recorrida deve assim, ser revogada por errada interpretação da lei, nomeadamente, dos artigos 317º e 318º n.º 1 e 2, da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho; artigos e 10.º do Código Civil, artigo 3.º do Código de Procedimento Administrativo e artigos 2.º, 13º...

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