Acórdão nº 00449/06.5BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução02 de Julho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Na presente Ação Administrativa Comum sob a forma de processo ordinário intentada por ATF e mulher, MGRMLF demandaram o MUNICÍPIO DE A... peticionando a condenação deste a pagar-lhes, a titulo de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 226.800,00, bem como dos juros de mora vencidos e vincendos contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, pedido que fundam na responsabilidade extracontratual por facto ilícito que imputam àquele Município.

O TAF DE AVEIRO julgou a ação parcialmente procedente, condenando o Réu MUNICÍPIO DE A... a pagar, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros) a cada um dos Autores, acrescidos dos juros de mora à taxa legal contados desde a data de citação do Réu (27-03-2006 – cfr. fls. 83 dos autos) até integral pagamento, absolvendo no mais o Réu.

RECURSO INTERPOSTO PELOS AA Inconformados, os AUTORES vieram interpor recurso da sentença, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1 - A douta sentença recorrida faz uma incorrecta interpretação dos artigos 483.º e 496.º do CC.

2 - Não é possível a reconstituição natural no presente caso, pois aquilo que neste momento é proposto aos autores é uma possibilidade de terem um outro lote desde que para tal desencadeiem um projecto de loteamento.

3 - Acresce que o lote que poderia resultar dum novo loteamento nunca seria igual antes tendo grandes diferenças relativamente ao lote que os autores compraram não só em área bem como em privacidade, segurança e tipo de construção aí possível de erigir.

4 - Não sendo possível a reconstituição natural, devem os autores ser indemnizados a título de danos materiais no valor que actualmente teria o seu ex-lote e que é de, pelo menos, 82.040,00€.

5 - O valor do lote será, pelo menos o valor encontrado pelo senhor perito indicado pelo tribunal.

6 - Havendo diferenças entre os valores indicados pelos peritos deve preferir-se o valor indicado pelo perito indicado pelo tribunal, pelo que deve a resposta ao quesito 21.º ser alterada para: “o valor dum lote com idênticas características será actualmente de 140,00€ por metro quadrado”.

7 - Na fixação do montante a pagar por indemnização deve o julgador ter em consideração o comportamento do réu que gerou este imbróglio, obrigando os autores a suportar 23 anos de indefinições com uma censurável apatia em tentar resolver o problema que criou e sem ter sequer a preocupação em publicitar através do registo predial a sua decisão de declarar nulo o loteamento.

8 - Mesmo que se considerasse que a possibilidade de se efectuar um novo loteamento constituía a reconstituição natural, sempre tal geraria prejuízos passíveis de indemnização, já que para haver loteamento era necessário os autores gastarem dinheiro com novos projectos quer para o loteamento quer para a casa, no que gastariam 8.000,00€ e 5.000,00€ respectivamente, acresce que o seu novo lote teria a sua área diminuída, pelo que deveria o réu por tal pagar o valor dessa área (14.422,80€) e ainda a desvalorização desse novo lote decorrente da implantação dumas escada publicas que privam o lote da privacidade e sossego que tinha e bem assim da segurança, o que deve ser computado em pelo menos 33.808,60€, pelo que a indemnização global a esse título (danos materiais) se deveria computar em 61.231,40€. A douta sentença violou ainda o disposto no artº 62º-2 da CRP ao não ter fixado tais danos.

9 - Os danos morais são gravíssimos pela sua extensão e por se traduzirem no esfumar dum sonho para o qual os autores trabalharam uma vida longe da sua terra. Devem assim ser fixados em pelo menos 23.000,00€ para cada um dos autores.

TERMOS EM QUE DEVE SER JULGADO PROCEDENTE O RECURSO E ASSIM SEREM FIXADOS OS DANOS MATERIAIS EM 82.040,00€ OU, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, EM PELO MENOS 61.231,40€. E OS DANOS MORAIS EM 23.000,00€ PARA CADA UM DOS AUTORES.

* Contra-alegando o RÉU formulou as seguintes CONCLUSÕES: I - É possível a reconstituição natural, que o recorrido se dispõe a efectivar com um novo projecto de loteamento que já elaborou e se propõe aprovar.

II - Os recorrentes, apesar de terem inicialmente solicitado que o recorrido procedesse à alteração do loteamento declarado nulo têm-se recusado a colaborar nas diligências necessárias à sua aprovação, o que significa que estão a inviabilizar a reconstituição natural por parte do Município.

III - Não lhes assiste, assim, o direito à pretendida indemnização em dinheiro.

IV - Nem mesmo quanto aos danos morais, na medida em que a solução para reconstituição natural disponibilizada pelo Município compensa claramente quaisquer danos sofridos.

V - Não existe suporte legal para alteração a matéria de facto.

VI - Devem improceder todas a conclusões das alegações dos recorrentes.

Termos em que, deve negar-se provimento ao recurso, com as legais consequências.

* RECURSO SUBORDINADO O RÉU interpôs recurso subordinado formulando as seguintes CONCLUSÕES: I - Deve modificar-se a resposta dada ao facto 41 da base instrutória, que constitui o ponto 53 da matéria de facto da sentença nos moldes seguintes: Não provado o primeiro segmento “E tal lote ficará sem possibilidade de construir garagem e anexos no exterior da casa …” e não escrito o segmento “… constituirá uma devassa para o prédio e consequentemente uma desvalorização”, este por se tratar de matéria conclusiva e o primeiro pelas conclusões que seguem.

II - Resulta do artº 3º, al. b), do Regulamento do Plano Geral de Urbanização de A..., aprovado por Resolução do Conselho de Ministros nº 107/2007, publicado no DR, 1ª Série, nº 158, de 17 de Agosto, que se entende por “Área bruta de construção a área correspondente ao somatório das áreas de todos os pisos de edificação, medidos pelo exterior das respectivas áreas cobertas, com excepção dos beirais de cobertura dos edifícios, das áreas de cave quando para uso complementar dos pisos superiores, das escadas exteriores de acesso aos pisos, das varandas, dos terraços descobertos e pequenos telheiros de protecção às entradas dos edifícios e, bem assim, das garagens de apoio e anexos que não integrem o edifício principal e não ultrapassem no seu conjunto 20% da área bruta do edifício principal”. (sublinhado nosso).

III - Assim, para o caso concreto, à luz da referida norma regulamentar, tendo presente o que se encontra provado no facto nº 55 (parte final) e o estudo apresentado pelo R. e que constitui o Processo Administrativo “G”, é possível construir no “lote” dos AA., para além de um edifício de cave e dois pisos, cada um destes com 117 m2, (ou superior se tiverem varandas, terraços, escadas exteriores e pequenos telheiros de protecção das entradas), garagem de apoio e anexos no exterior desde que, no seu conjunto, não ultrapassem a área total de 46,8 m2 (20% x (117 m2 x 2).

IV - Ora, face ao que dispõe o referido regulamento do Plano de Urbanização de A..., é irrelevante o que, sobre a matéria, pudesse resultar de outros elementos, nomeadamente da apreciação dos peritos e da prova testemunhal, pois estamos em face da mera (e simples no caso) interpretação da norma legal, matéria que está vedada à prova testemunhal ou pericial, sendo que a solução regulamentar não pode ser postergada por essa espécies de provas.

V - Sem prejuízo disso, o que resulta do relatório pericial e dos esclarecimentos prestados pelos peritos em audiência de julgamento é que “Face ao estudo da Câmara Municipal (que constitui o referido Processo Administrativo G) fica prejudicada a possibilidade de construção de uma garagem no exterior da casa atendendo a que o mesmo aponta para o piso da cave a localização da garagem”, o que não é correcto, pois da simples leitura do referido estudo/projecto nada permite concluir que a cave se destinaria obrigatoriamente a garagem (face à mencionada norma regulamentar a cave pode destinar-se a uso complementar dos pisos superiores) e mesmo que se destinasse a garagem nada impediria os AA. de usar o anexo exterior para esse (uma segunda garagem) ou outro fim.

VI - Por outro lado, do depoimento das testemunhas mencionadas na motivação (bem como das demais) também não resulta, nem poderia resultar, o contrário, sendo que a testemunha EMA confirmou expressamente essa possibilidade de construção de garagem e anexo exteriores ao edifício principal.

VII - Finalmente, de fls. 14 do Processo Administrativo “B” nada resulta que permita dar resposta positiva à referida matéria de facto.

VIII - Assim, o facto 41 da base instrutória, que constitui o ponto 53 da matéria de facto da sentença deve ficar com a seguinte redacção: “E tal lote ficará com um arruamento de peões ao longo de toda a estrema nascente”.

IX - Consequentemente, deve eliminar-se, também, a expressão “e ficando sem a possibilidade de construir garagem e anexos no exterior da casa” que consta na fl. 36 da sentença impugnada.

X – Por outro lado, o Município recorrente assegura aos AA a reconstituição natural dos eventuais prejuízos decorrentes da impossibilidade da construção decorrente da invalidade do loteamento inicialmente aprovado, oferecendo um novo loteamento (factos 47e 48) que, embora reduza a área do seu lote, lhe aumenta significativamente a área de construção, de que resulta uma clara compensação por qualquer prejuízo moral sofrido que, aliás, a existir se deve à recusa dos AA. em aceitar a solução proposta pelo Município, optando, antes, pela pretensão indemnizatória em dinheiro pedida na presente acção.

XI - Assim sendo, estando os AA. a contribuir decisivamente para a verificação e/ou manutenção dos mencionados prejuízos de ordem moral, não pode ser-lhes arbitrada qualquer indemnização, por abuso de direito, na modalidade do “venire contra factum próprio”, violando, nomeadamente, o disposto no artº 334, do CC.

XII - Mesmo que assim se não entendesse, face ao circunstancialismo dado como provado, é excessivo o...

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