Acórdão nº 01999/07.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução05 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: CP de Computadores e Sistemas de Informação, S.A.

veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 20.06.2011, pelo qual foi julgada improcedente a acção administrativa especial deduzida contra o Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, IP, para impugnação do acto que ordenou a restituição de verbas, alegando a Autora que tal acto incorre em violação de decisão judicial transitada em julgado e consequentemente padece de nulidade.

Invocou para tanto que a decisão recorrida viola a decisão com trânsito em julgado proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo no seu acórdão de 30.06.1998.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1- O IGFSE, substituto do DAFSE, pede à mesma apelante a restituição da mesma quantia com fundamento na não elegibilidade das mesmas despesas sendo, contudo, que a decisão de não elegibilidade não deriva, neste segundo acto, da apelada, mas antes da Comissão das Comunidades Europeias.

2- O STA, já em 30 de Junho de 1998, havia, no entanto, decidido, que o acto que ordena a restituição daquela quantia é ilegal por constituir uma revogação ilícita de um acto constitutivo de direitos que foi a aprovação das despesas por parte do DAFSE, ou seja, que o acto de aprovação das despesas praticado pelo DAFSE não tinha carácter provisório no âmbito do procedimento de concessão de ajudas, mas antes, constituía um acto constitutivo de direitos.

3- O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias proferiu em 25 de Janeiro de 2005 decisão de sentido precisamente oposto ao do STA, considerando, claramente, que o acto de aprovação das despesas efectuado pelo FSE é meramente preparatório e que a competência definitiva para a aprovação daquelas despesas pertence à Comissão das Comunidades Europeias.

4- A apelada pretende e a decisão recorrida permitiu fazer retroagir os efeitos daquela decisão judicial comunitária a um litígio já anteriormente julgado pelos tribunais portugueses, no ano de 1998.

5- Por muito forte que a integração na comunidade europeia condicione a soberania dos estados membros, designadamente de Portugal, o certo é que não podem deixar de ficar, inelutavelmente, salvaguardadas as situações já definitivamente acertadas judicialmente.

6- O acto impugnado põe, precisamente, em causa, a certeza e a paz social que o caso julgado visa proteger e incrementar.

7- A partir do momento em que ficou definitivamente julgado que a aqui apelada não teria que restituir aquela quantia, porque o acto de verificação contabilística praticado pelo DAFSE era um acto constitutivo do direito ao subsídio naquele valor pela apelante – e que por via disso não poderia ser revogado após o prazo máximo de recurso contencioso ter decorrido – não pode mais o IGFSE repetir junto desta aquele pedido só pelo facto de estar na iminência de ter de restituir à CE aquela mesma quantia em virtude de um erro de avaliação que só àquela entidade (agora apelada) pode ser imputado e, pelo qual, em face da decisão proferida no Acórdão de 30 de Junho de 1998, só aquela e mais ninguém, muito menos a aqui apelante tem de responder.

8- Se alguma entidade tem de devolver aquela quantia à CE, essa entidade é a apelada e não a apelante e deve aquela encarar essa obrigação de devolução, ainda, como um efeito (aliás, o único com relevo económico) da decisão proferida definitivamente pelo STA no seu acórdão de 30 de Junho de 1998.

9- Pois que nem a superioridade do direito comunitário ao direito interno, mesmo ao Constitucional, nem o cumprimento do princípio da colaboração previsto no art. 10º do TE, pode sobrepor-se à violação do espaço sagrado da certeza e da segurança jurídica e social construídos pelo instituto do caso julgado.

10- É preciso aqui ter presente que o destinatário do acto comunitário em causa é o estado português e não a aqui apelante. E por mais operações de cosmética que se tentem, a verdade é que esta é uma verdade incontornável. A comissão não pediu à CPCIS para devolver as ajudas que pensa ter dado a mais. Pediu essa devolução ao Estado Português.

11- A aqui apelante não impugnou o acto da Comissão Europeia – como, aliás, e de resto não poderia directamente impugnar, como é sabido.

12- Este acto, aliás, não lhe foi destinado, tendo, antes impugnado o acto impugnado o acto emanado pela apelada que, muito tendo natureza executiva de uma outra decisão da Comissão é, para si, o acto lesivo e impugnável que determinou a legitimidade e o interesse na propositura da presente acção, e que é exclusivamente o objecto da presente demanda com exclusão de qualquer outro.

13- E se este acto, apesar de executivo, foi considerado lesivo e tal legitimou a apreciação do pedido de impugnação efectuado, são irrelevantes as considerações que a decisão judicial em recurso faz sobre os limites subjectivos do caso julgado, designadamente sobre a circunstância de o acórdão emanado há mais de uma década pelo STA não vincular a Comissão Europeia por esta não ter sido parte na acção (como não o poderia ter sido).

14- Aliás, começa-se desde já por dizer que apenas em momento ulterior à entrada da presente acção foi introduzido um fundamento adicional do recurso extraordinário de revisão previsto na alínea f) do art. 771º do CPC.

15- É que só a partir da entrada em vigor da alteração legislativa operada nos recursos é que passou a poder constituir fundamento de revisão a inconciliabilidade da decisão com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português.

16- Ora, o recurso extraordinário de revisão e, designadamente, o acrescento proporcionado pelo art. 771º f) apenas pôde ser usado para processos iniciados depois da entrada em vigor da alteração legislativa e não a processos que como o presente estivessem pendentes em 01/01/2008 (art. 11º nº 1 do DL nº 303/2007).

17- Mesmo que como alguma doutrina entendesse aquele preceito pudesse ter aplicação imediata aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, sempre se dirá que se a apelada tinha por certo que a decisão proferida pelo STA estava errada à luz da interpretação que o TJUE faz do Direito da União, então, deveria ter sido interposto em tempo – pelo menos nos cinco anos seguintes à entrada em vigor da alteração legislativa que lho permitia – ter pedido a revisão do acórdão do STA em causa nos presentes autos.

18- Não o tendo feito, é manifesto que a jurisprudência constante do TJUE em que assenta o pedido de restituição efectuado pela Comissão e executada pela apelada e que passa a considerar quer os actos que consideram despesas como elegíveis são meramente preparatórios e não constitutivos de direitos ou do direito à ajuda, não pode pôr em causa uma decisão definitivamente tomada pelos Tribunais desse Estado, a propósito de um acto de restituição de ajudas.

19- É a própria jurisprudência emanada pelo TJUE a propósito da restituição dessas ajudas que sustenta e defende em interpretação do artigo 10º do Tratado CE (na redacção anterior à entrada em vigor do Tratado de Lisboa e a que corresponde o nº 3 do artigo 4º do TUE) que o princípio da colaboração vertido naquele tratado não impõe a um juiz nacional a desaplicação das normas processuais internas com a finalidade de se proceder ao reexame ou a anulação de uma decisão judicial transitada em julgado mesmo quando resulte que essa mesma decisão viola o direito comunitário. Neste sentido, cfr. Ac. do TJUE 13/1/2004 Kunhe e Heitz (processo C-453/00, nº 23); o processo Kempter de 12.2.2008 (Processo C-2/06, nº 59 e 60) e, ainda, o processo Kapferer 16.3.2006 C/234, nºs 20 e 21).

20- Por isso, a decisão proferida e da qual vem interposta a presente apelação errou no julgamento que fez de direito ao não considerar que o acto impugnado viola o caso julgado da decisão proferida pelo STA e que ordenava precisamente a restituição da mesma quantia com os mesmos fundamentos, violando directamente o artigo 133º do CPA na parte em que dispõe que os actos administrativos (executivos e não executivos) que violem o caso julgado são nulos.

21-Mas se dúvidas subsistirem sobre o sentido da jurisprudência do TJUE quanto ao respeito do princípio do caso julgado, afigura-se útil e necessária ao julgamento da causa a colocação de uma questão prejudicial ao TJUE nos termos do art. 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

A questão prejudicial a devolver ao TJUE seria esta: Devem a Decisão da Comissão dirigida ao Estado Português (identificar a parte relativa à apelante) e o art. 4º nº 3 do TUE, ser interpretados no sentido de prevalecerem sobre uma sentença judicial nacional proferida por um Supremo Tribunal Administrativo transitada em julgado que declarou judicialmente a nulidade de um acto administrativo – que ordenou a um particular em virtude de acto da Comissão dirigido ao Estado Português a devolução de ajudas que no entendimento da Comissão foram indevidamente atribuídas, por violação do caso julgado -, sentença essa transitada em julgado entre as mesmas partes desta acção e que se havia pronunciado pela natureza constitutiva do acto que considerou as despesas elegíveis e que havia mandado devolver precisamente a mesma quantia que é objecto dos presentes autos? Complementarmente: Devem os acórdãos do TJUE identificados serem interpretados no sentido de uma Decisão da Comissão dirigida a um Estado e que obriga a restituir montantes indevidamente pagos ao abrigo de Decisão da Comissão anterior prevalecer sobre uma decisão judicial transitada em julgado que se pronunciou sobre a nulidade do acto nacional de restituição da mesma quantia objecto dos presentes autos? Conclui pedindo que o...

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