Acórdão nº 00023/01-Coimbra de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelPaula Moura Teixeira
Data da Resolução26 de Março de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A Fazenda Pública recorre da sentença proferida em 25.05.2011, que julgou procedente a impugnação referente ao IRS do ano de 1993 e 1995, nos montantes globais de Esc. 1.407.752$00 e de Esc. 2.162.605$00 respetivamente incluindo juros compensatórios.

A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…) CONCUSÕES: 1 – Os impugnantes alicerçaram a sua impugnação, alegando, em síntese, a preterição de formalidades legais, por a impugnante mulher (não sócia) não ter sido notificada do despacho de fixação da matéria colectável, apurada por métodos indirectos à sociedade de transparência fiscal de que o marido era sócio.

2 – O Tribunal a quo” julgou procedente a impugnação, nos autos acima identificados, alegando a preterição de formalidades legais, porquanto os impugnantes não foram, como pessoas singulares, notificados do despacho de fixação da matéria colectável apurada por métodos indirectos, relativos à sociedade.

3 – Existe claramente um desfasamento entre a pretensão deduzida (a falta de notificação do não sócio) e o decidido pelo Tribunal (a falta de notificação dos sócios individualmente considerados).

4 – Quem tem legitimidade para apresentar a reclamação da decisão que fixe a matéria colectável com fundamento na sua errónea quantificação por métodos indirectos e discuti-la é a sociedade e não os seus sócios.

5 – Não podendo os sócios discutir de forma individual a fixação dos rendimentos à sociedade, a notificação individual dos fundamentos de tal fixação, resultaria num acto inútil.

6 – O impugnante marido foi notificado em representação da sociedade e apresentou em nome desta o pedido de revisão, uma vez que exerce as funções de gerência.

7 – Se os sócios de modo individual não podem discutir a fixação dos rendimentos, também não podem os não sócios, pelo que nesta fase a notificação da esposa (não sócia) seria também um acto inútil.

Nestes termos e com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que julge a inexistência daquela preterição de formalidades legais, assim se fazendo, JUSTIÇA(…)” Os Recorridos contra alegaram tendo formulado as seguintes conclusões: (…) conclusões:

  1. Nos presentes autos, está em causa uma liquidação de IRS feita aos ora recorridos, por força do facto de o ora recorrido marido, sendo advogado, fazer parte de uma sociedade profissional de advogados, a qual está sujeita ao regime de transparência fiscal, sendo certo que, sobre quem recai a obrigação de pagamento de imposto é sempre e só sobre os sócios e seus cônjuges, pelo que qualquer alteração da matéria tributável lesaria não a sociedade de transparência fiscal que não paga impostos, por estar isenta, mas os seus sócios individualmente considerados e, no caso dos cônjuges dos sócios, nem intervenção têm na vida da sociedade.

  2. Como se escreve ainda na sentença recorrida “…………importa ter presente que, as liquidações em causa têm na sua génese uma inspecção à sociedade de Advogados e a matéria tributável apurada para as liquidações foi através de métodos de apuramento indirectos, pelo que teriam os sujeitos passivos obrigados ao pagamento de imposto (neste caso os sócios individualmente considerados) que ser notificados do despacho que fixou a matéria tributável, para querendo fazer uso do procedimento de revisão (artigos 84.° e seguintes do CPT).

  3. Entendimento contrário teria como consequência que, os sujeitos passivos obrigados ao pagamento de imposto ficassem impedidos, em sede de impugnação judicial, de questionar a quantificação da matéria tributável, por não terem sido regularmente notificados do despacho de fixação da matéria tributável (pois que, conforme dispõe o n.°3 do artigo 84.° do CPT o procedimento de revisão é condição da impugnação judicial com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável por métodos indiciários)”.

  4. Houve preterição de formalidades legais, pela não notificação das liquidações adicionais, quer aos sócios, individualmente considerados, quer aos seus cônjuges, únicos e exclusivos responsáveis pelo pagamento do imposto que resultasse dessas liquidações adicionais.

  5. Contra este entendimento, se insurge a Fazenda Pública, entendendo que, quer os sócios, individualmente considerados, quer os seus cônjuges, únicos e exclusivos responsáveis pelo pagamento do imposto que resultasse dessas liquidações adicionais, não tinham, apesar disso, que intervir no processo administrativo prévio, por não serem, nos termos da lei por ela invocada, os titulares da relação jurídica tributária, o que constitui uma visão manifestamente redutora, a da Fazenda Pública.

  6. A relação tributária que se estabelece desde o início é entre a Fazenda Pública, credora dos impostos e os sócios e seus cônjuges, devedores dos mesmos, sendo o montante desses impostos, ao menos parcialmente, resulta da actividade da sociedade de transparência fiscal, a qual determinada pela respectiva contabilidade, fornece a matéria tributável, pelo que os titulares da obrigação fiscal são desde o início os sócios e seus cônjuges, não sendo necessário que ocorra outro acto para que resulte essa obrigação pessoal, como ocorre com a responsabilidade subsidiária, não a responsabilidade dessas pessoas é solidária com a da sociedade de transparência fiscal, que está isenta de impostos.

  7. Mas este entendimento da Fazenda Pública esbarra no conceito de legitimidade activa conferida aos cidadãos em sede de contencioso administrativo e fiscal, pois tem sido entendido pela jurisprudência que os “recursos só podem ser interpostos pelos titulares de um interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso, ou seja na declaração de invalidade ou na anulação de um acto lesivo, sendo o interesse assim juridicamente qualificado constitui pois pressuposto da legitimidade activa.

    Interessado é aquele que espera ou pode obter, através da exercitação do seu direito de impugnar, um determinado benefício, utilidade ou vantagem de natureza pessoal.

    Os efeitos decorrentes da anulação do acto têm de repercutir-se, de forma directa e imediata, na esfera jurídica do próprio impugnante, que não na de terceiro e o interesses a tutelar terão de ser protegidos pela ordem jurídica.

  8. Como bem refere a sentença recorrida, esta legitimidade activa para efeitos de recurso contencioso terá necessariamente de existir também para aqueles procedimentos administrativos que são antecedente necessário do recurso contencioso, sob pena de o recorrente contencioso ver impedida a apreciação do seu recurso, por falta de preenchimento da reclamação necessária prévia.

  9. Por isso, a falta de notificação das liquidações adicionais, quer aos sócios, individualmente considerados, quer aos seus cônjuges, únicos e exclusivos responsáveis pelo pagamento do imposto que resultasse dessas liquidações adicionais, nos termos do artº. 67º. do CIRS, na redacção vigente ao tempo, que corresponde à redacção actual do artº. 66º. do mesmo Código.

  10. Mas mesmo que se entenda que o direito subjectivo à reclamação é exclusivo da sociedade de transparência fiscal, como o faz a Fazenda Pública (conclusão 4), esse, eventual e não real, direito subjectivo não retira à Fazenda Pública a obrigação de notificação dos cidadãos lesados com o acto de liquidação adicional, pois como decidiu o Ac. do STA (Pleno) de 14-6-1989, publicado no AP-DR, de 7-9-1990, pág. 485, “a legitimidade em contencioso administrativo afere-se pelo interesse na declaração de invalidade ou anulação deste, e não pela titularidade de um direito subjectivo”.

  11. Mesmo que houvesse um direito subjectivo da sociedade de profissionais à...

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