Acórdão nº 01262/08.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução18 de Dezembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: AVF Recorridos: Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (Instituto de Genética Médica); AMBS, Director do serviço de Genética; FIVICSI – Genética Médica, Ldª.

Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a supra identificada acção administrativa comum, na qual era pedido, designadamente, a condenação dos Réus ao pagamento de indemnização, no valor de 250.000,00€, dos danos não patrimoniais, para si advindos, resultantes da frustração da sua expectativa de vir a poder ter filhos, na sequência da destruição das amostras de esperma que se encontrava crio preservado nos serviços do 1º Recorrido.

O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “1º.

A douta decisão é posta em causa pelo recorrente já que teria de ser outra a decisão a que o Tribunal haveria de chegar face aos elementos de prova, quer testemunhal quer documental, carreados para os autos.

  1. Há matéria de facto que não foi tida em conta pelo Tribunal (art. 9º da p.i.) e incorreções na matéria de facto provada (ponto 5 e 6 da matéria de facto provada, artigos 20º e 21º e documentos 4, 5 e 6 juntos com a p.i.), bem como haveriam de ter sido dados como não provados os factos constantes dos pontos 12, 13, 17 dos factos dados como provados na sentença e provados factos que foram dados como não provados.

    Quanto aos pontos 5 e 6 da matéria de facto provada e aos artigos 20º, 21º e doc. 4, 5 e 6 todos da p.i.: 3º.

    O Tribunal recorrido deu como provado no ponto 5 que “Com data de 28.08.2006, o autor solicitou, por escrito, aos Serviços de Genética Médica, informação sobre o estado das amostras criopreservadas.”.

    E no ponto 6 dá como provado que “Nessa sequência foi informado que as amostras já haviam sido destruídas em 07.06.2005”.

  2. Resulta dos documentos juntos com a p.i. que em 28.08.2006 o autor enviou não só ao Serviço de Genética Médica como ao réu, para a sua clinica privada, cartas a solicitar informação sobre o estado do esperma recolhido (vide artigo 20.º e 21.º da p.i.).

  3. Por isso, o ponto 5 dos factos provados está incompleto e nele devia constar a prova de que também ao réu foi solicitado a informação sobre o estado das amostras, já que o documento não foi pelos réus impugnado (vide nº 4 junto com a p.i.).

  4. O ponto 6 dos factos provados – que refere ter sido na sequência desse pedido de 28.08.2006 que o autor foi informado da destruição das amostras, tal facto está incorreto, já que em 30 de outubro de 2006 o mandatário do autor envia cartas a solicitar informação sobre o estado das amostras (vide doc. n.º 5º e 6º junto com a p.i. e que comportam factos que não foram impugnados pelos réus) e foi na sequência destas cartas, de 30.10.2006, que a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto respondeu ao mandatário do autor, informando-o da destruição das amostras e não na sequência das cartas de 28.06.2006.

  5. Haverão pois de ser dados como provados os seguintes fatos: · “Com data de 28.08.2006 o autor solicitou ao serviço de genética médica e ao Dr. AMBS, por escrito, informação sobre o estado das amostras.” · “A carta enviada ao Dr. AMBS foi devolvida por ausência de reclamação.” · “O autor não obteve resposta às cartas enviadas em 28.08.2006.” · “O mandatário do autor, em 30.10.2006, solicitou informação escrita sobre o estado das amostras ao serviço de genética médica e ao Dr. AMBS.” · “Em 04.12.2006 a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto respondeu ao mandatário do autor informando que as amostras haviam sido destruídas em 7 de junho de 2005.” Quanto ao facto articulado no art. 9º da p.i. – omissão de pronúncia: 8º.

    No artigo 9º da p.i. escreve-se: “Nesse ano de 2000 o autor voltou a contatar o Instituto, em março e junho, tendo realizado testes de fertilidade, a fim de reunir documentação para entregar em organismo do estado”.

  6. O recorrente junta, em sede de julgamento, um documento cujo conteúdo se transcreve: “Declaração, Para os devidos efeitos declara-se que AVF, submetido a quimioterapia há cinco anos, efectuou duas colheitas de esperma, nestes serviços, em 24/10/1994 e 31/07/2000, que revelaram azoospermia. Porto, 31 de julho de 2000, (Dr.ª JS)” (2).

  7. Sobre a deslocação do autor ao Serviço de Genética Médica, em 2000, o autor referiu que se deslocou ao organismo e referiu à pessoa que o atendeu que tinha lá amostras criopreservadas e descreveu a pessoa que o atendeu, conforme depoimento supratranscrito [(m 01:28:47 a m 01:29:40)].

  8. A testemunha MC refere que houve quatro contactos com os serviços; que embora não tivesse acompanhado o recorrente dá explicação cabal dos motivos da ida do recorrente aos serviços da ré e afirma que acompanhou o mesmo durante toda a sua doença, nomeadamente as deslocações a Inglaterra para tratamento, estando a pare de todos os factos aqui vertidos, nomeadamente conhecendo a realização pelos serviços da ré de testes de fertilidade ao recorrente, explicando as circunstâncias em que os mesmos foram realizados e do motivo de possuir comprovativo da realização de tais testes, conforme depoimento transcritos [(m 02:08:19 a m 02:11:10), (m 02:13:01 a 02:13:13), (m 02:13:35 a m 02:15:20)].

  9. A testemunha JS trabalha para o réu na sua clinica privada e trabalhou no serviço de ginecologia do Hospital de São João até maio de 2005. A testemunha afirma que o Dr. DS entrou em 1994 e se manteve em funções, na unidade de ginecologia, pelo menos até 2005, sendo, desde 1995, o responsável pela criopreservação e quem atendia os utentes [(m 00:29:41 ao m 00:29:50), (m 00:31:42 ao m 00:32:42), (m 00:32:42 ao m 00:34:02)].

  10. Do depoimento da testemunha, que não exercia qualquer função no banco de esperma do Serviço de Genética Médica á data dos factos, nem era funcionária da ré, cujo depoimento é confuso e não acaba os raciocínios, revela-se tendenciosa, não respondendo diretamente a grande parte do que lhe é perguntado, conclui-se o seguinte: que a testemunha confessa ter assinado a declaração suprarreferida; que não é normal os serviços da ré passarem aquele tipo de declaração; que não se recorda de ter assinado aquela declaração; que não sabe porque a assinou, adiantando que poderá ter sido o responsável pelo banco de esperma do Serviço de Genética Médica que lhe pediu para o assinar (Dr. DS); que não tem conhecimento do exame feito pelo autor que revelou azoospermia; que a declaração, na parte que refere que o autor revelou azoospermia em 1994, se trata de um erro; que em que 2000, o responsável pelo banco de esperma era o Dr. DS [(m 00:39:19), (m 00:39.10 ao m 00:43:49)].

  11. A testemunha dá uma explicação pouco crível para o facto de não ter sido anotado na ficha clinica do autor a sua infertilidade aquando da ida do autor aos serviços: “Seria natural se de facto o paciente disse que eu venho e tenho uma criopreservação e quero renovar essa criopreservação” [(m 00:45:32 ao m 00:45:44) ].

  12. Ora, o autor só se desloca aquele serviço porque mantinha lá uma criopreservação, já que não fosse no âmbito da criopreservação feita nenhum motivo haveria para fazer espermograma naquele serviço. Por outro lado a testemunha deveria saber ao assinar a declaração em que consta a data da criopreservação que tal data se referia à colheita de esperma e mesmo que agora não se recordasse teria que sabê-lo à data em que passou a declaração.

  13. E por este documento fica evidente que não eram anotados os contatos dos utentes com o serviço, ou que, pelo menos, não eram anotados todos os contatos relevantes dos utentes.

  14. Face à prova produzida haveria o Tribunal que dar como provado este facto, quer face ao documento junto, quer á prova testemunhal produzida.

    Factos incorretamente dados como provados - Pontos 12 e 13: 18º.

    Trata-se de matéria de exceção com a qual os réus pretendiam ilidir a presunção de culpa que sobre eles recai, mas que, pela análise crítica da prova devem ser dados como não provados, conforme resulta da prova documental e testemunhal que foi incorretamente valorada, nomeadamente o auto de destruição e fichas dos utentes.

    Do auto de destruição e fichas dos utentes: 19º.

    A fls. 689 a ré junta, pretendendo provar a destruição das amostras, uma página escrita à mão, por punhos diferentes, a data da destruição está rasurada no número 6.

    , a assinatura é ilegível e não está datado.

  15. Nas 1.200 fichas dos utentes juntas aos autos não há nenhuma anotação de destruições ocorridas em junho de 2005.

  16. A ré junta 1.223 documentos, e pela análise desses fica demonstrado que não havia qualquer procedimento uniforme ou uniformizado de destruição das amostras e de contactos e por isso não havia qualquer “protocolo de actuação”, antes as decisões eram tomadas “ad hoc”, em função das necessidades, senão vejamos: 22º.

    Da análise dos documentos de fls. 1 a 38 (documentos relativos aos anos próximos da recolha do autor) constata-se que se trata de registos avulso, sem qualquer ordem que não a numeração, em folhas soltas, sem timbre, umas folhas pautadas outras lisas, com páginas rubricadas de forma ilegível e que dá a ideia de a assinatura ter sido feita na mesma data. As anotações contidas são apenas nome, proveniência, situação clinica, número de tubos, mobilidade e data da recolha e nem em todas as recolhas constam a totalidade desses dados.

  17. A fls. 13, um tal Décio, cuja colheita foi realizada em 12.07.1993, tem uma anotação com os dizeres “telefonou dia 20/01/2010 mas tubos já destruídos”.

    Note-se que da “ficha” não consta qualquer anotação de destruição (há anotações de destruições em algumas fichas). A anotação demonstra que não havia por parte dos serviços da ré qualquer procedimento uniforme, nomeadamente prazo para a renovação.

    Se houvesse por que razão telefonaria um utente passados mais de 16 anos quando não podia ignorar que os tubos estavam disponíveis apenas por cinco...

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