Acórdão nº 01187/15.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução11 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO APM, menor, legalmente representado pelos seus pais, identificados nos autos, veio interpor recurso da sentença do TAF do Porto que julgou improcedente a presente INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, Lisboa; contra a DIRECÇÃO GERAL DOS TRANSPORTES DOS ESTABELECIMENTOS ESCOLARES; e contra a DIRECTORA DO AGRUPAMENTO ESCOLAR IH, Porto, peticionando o provimento do presente meio processual por forma a serem “…intimados os requeridos a admitirem e a absterem-se de criar qualquer entrave físico ou de qualquer espécie à entrada e permanência do APM na sala de aulas ou na escola em geral, admitindo imediatamente o aqui A. à frequência das aulas neste terceiro período …”*Em alegações o RECORRENTE formulou as seguintes CONCLUSÕES: I - A sentença enferma de nulidade porque nela não foram elencados os factos não provados, limitando-se o tribunal a escrever a este propósito que “nada mais releva” o que viola o estabelecido nos artigos do 607º, nº 4 e 615º, nº 1, b) do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA, sendo a sentença nula por falta/insuficiência de fundamentação.

II – A sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia uma vez que o Tribunal a quo não atentou - e, por isso não apreciou - na amplitude do pedido de intimação formulado, o qual compreendia não só a intimação à abstenção da requerida a criação de qualquer entrava físico ou de outra espécie à entrada e permanência do APM na sala de aulas, mas também do mesmo modo a intimação da requerida a abster-se de criar qualquer obstáculo à entrada ou permanência do aluno na escola, pelo que ficou, assim, violado o artigo 615º, nº 1 b) do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA.

III - A sentença é nula nos termos previstos no artigo 615º, nº 1 c) do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA porque, considerados os fundamentos da mesma (o tribunal julga que um aluno de ensino doméstico não pode ser impedido de ir à escola, uma vez que tem de poder aceder à mesma para tomar refeições ou para confraternizar com os seus colegas, mesmo em festividades) o juiz não poderia ter decidido em coerência a improcedência total do pedido de intimação formulado, dado que o mesmo peticionou que a demanda fosse intimada a abster-se de praticar atos que impedissem o recorrente de aceder à escola.

IV- O tribunal a quo errou ao julgar a intimação totalmente improcedente por não ter dado como provado - como devia - que o recorrente não foi apenas impedido de assistir às aulas, mas também de aceder ao espaço da escola em causa, sendo que se o tivesse feito, e face à compreensão jurídica que o próprio Tribunal manifestou no esgrimir da fundamentação jurídica da decisão (o aluno em regime de ensino doméstico não pode ser impedido de aceder às instalações da escola e de nela permanecer) só poderia ter concluído pela censurabilidade do comportamento da demanda que, efetivamente – como se deu conta supra - impediu o recorrente de aceder à mesma e, consequentemente, deveria, em vez da decisão proferida, ter julgado parcialmente procedente a intimação, pelo menos na parte em que esta se reportava ao pedido de intimação da recorrida na abstenção na criação de obstáculos de acesso à escola.

V - A opção pelo ensino doméstico é uma concretização legal do direito à liberdade de aprender porque o mesmo permite o respeito pelo ritmo de aprendizagem do aluno, o qual aprende sem estar sujeito à estandardização na administração de conhecimentos presente no ensino regular o qual sem poder ter totalmente em conta as diferenças entre alunos é ministrada aos mesmos no contexto da sala de aula pelo professor responsável pela turma.

VI - O ensino básico é de natureza obrigatória, o que significa que, mesmo no regime de ensino doméstico e, apesar do respeito pela liberdade de aprender constitucionalmente consagrada, o Estado nunca poderá ficar totalmente desonerado de colaborar na formação do aluno.

VII - O Tribunal a quo erra no seu julgamento quando reduz a possibilidade da intervenção da escola a um mero apoio ou auxílio indireto aos pais ou tutores, desenvolvido sem qualquer contacto coma criança e erra porque a antítese entre a prestação desse apoio em contexto de aula pelo professor diretamente ao aluno no regime de ensino doméstico é meramente aparente e artificial.

VIII - O Tribunal a quo errou o seu julgamento ao entender que a compatibilização do regime do ensino doméstico com a obrigatoriedade do ensino básico não pode ir além do que aqui ficou registado, ou seja, não pode ultrapassar um serviço de apoio indireto e à distância prestado pela escola aos pais e dos tutores do menor que estudo segundo esta modalidade.

IX – O direito em causa nos autos é um direito, liberdade e garantia que por isso só pode ser restringido por lei e a lei ordinária – minimalista como é, e tirando os escassos nichos de regulação que foram detetados - não regula em mais nada o ensino doméstico ou mesmo o ensino individual, designadamente não prevê qualquer norma que proíba o aluno de ensino doméstico de assistir às aulas, querendo, e onde a lei não restringe um direito, liberdade e garantia a administração não pode faze-lo legitimamente, sem violar a Constituição.

X - O que individualiza este tipo de ensino doméstico é o facto de o percurso de ensino ser da responsabilidade dos pais e não da escola, dado que à partida são estes ou alguém por estes escolhido para o efeito que ministra os conteúdos programáticos aos alunos que estudam segundo este modelo, mas admitir isto não impede de estabelecer um nível de compatibilidade lógica e jurídica com a reclamada possibilidade e direito de o aqui Recorrente assistir às aulas, sendo certo que se tal incompatibilidade não existe em geral, muito menos existe no caso concreto, atenta a fundamentação do pedido por parte do recorrente.

XI - Em abono da tese na inexistência da incompatibilidade entre o ensino doméstico e a possibilidade de frequência das aulas pelo aluno em causa e, sobretudo, se a finalidade do pedido for prestação de apoio direto para a realização dos exames nacionais, está próprio funcionamento administrativo o qual indicia não existir qualquer impossibilidade ou paradoxo: por isso, como se alegou e também não foi contrariado pelo recorrido, o APM é aluno inscrito na turma do 4º B da escola em causa.

XII - Se não o fosse já pelos argumentos precedentes, a inscrição dos alunos de ensino doméstico numa dada escola e numa dada turma é um indício claro de que a incompatibilidade apontada pelo tribunal a quo não existe de todo e permite, até, concluir o contrário do que ficou decidido: a inscrição dos alunos deste tipo de ensino numa turma é um convite à inclusão do mesmo na turma e na escola e o apoio pode ser prestado diretamente ao aluno cada vez que ele o solicite.

XIII -...

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