Acórdão nº 00077/10.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2015
Data | 30 Setembro 2015 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1998_01 |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: L...
interpõe recurso da sentença proferida no TAF de Coimbra que julgou totalmente improcedente a impugnação deduzida, na qualidade de responsável subsidiária, contra as liquidações de IVA de 2003, 2004 e 2005.
Conclui as alegações com as seguintes conclusões:
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Verificando-se uma errada indicação das possibilidades de reacção à actuação administrativa – meios de defesa – acoplada à falta de notificação para dedução de pedido de revisão, a procedência da excepção da inimpugnabilidade jamais pode assentar no entendimento de que a irregularidade mencionada se encontra sanada, porque não arguida dentro do prazo referido no artigo 102.º do CPPT.
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Se o pedido de revisão se configura como um meio de reacção e, no mais, como condição de impugnação judicial nos termos do artigo 86.º da LGT, a omissão da sua referência na indicação dos meios de defesa e a falta de notificação do responsável subsidiário para esse procedimento traduz-se numa errada indicação dos meios de defesa, a qual não fica sanada nos termos julgados pelo tribunal.
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Se a recorrente, não notificada, como responsável subsidiária, para apresentar pedido de revisão segue o caminho indicado pela AT quanto aos meios de defesa, não podia o Tribunal deixar de assentar a sua decisão nos termos e para os efeitos referidos no artigo 37.º, n.º 4, do CPPT, no reconhecimento de errada indicação dos meios de reacção ao dispor da ora recorrente, errando ao considerar sanada a citada “irregularidade”.
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A admitir-se que a possibilidade de recurso a um critério não constante do elenco normativo do artigo 90.º, n.º 1, da LGT, não pode aceitar-se, como o fez o Tribunal recorrido, que a AF possa recorrer a qualquer outro critério objectivo, “à escolha”, sem ter que demonstrar a sua aptidão e idoneidade para o resultado pressuposto na lei e que é a determinação do rendimento que o sujeito passivo presumivelmente obteve...
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Quer isto significar que, nos casos em que a AF pretenda socorrer-se de qualquer critério praeter legem ou “fora-da-lei”, no sentido de não previsto expressamente, terá forçosamente que demonstrar, que o mesmo é válido e apto para os fins da avaliação.
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Na verdade, se quanto aos critérios elencados expressamente, esse juízo é feito a priori pelo legislador quanto aos factores que considerou idóneos para a determinação presumida do rendimento tributável, e por isso os previu na norma, já quanto aos critérios não expressamente previstos, a AF não pode deixar de justificar, como pressuposto para a sua mobilização, que o critério que utiliza é igualmente apto e idóneo à produção do resultado pretendido pelo legislador, sendo que este resultado não é tout court, o da fixação do rendimento, ou de um qualquer rendimento, outrossim o estabelecimento do rendimento que o contribuinte presumivelmente obteve.
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Ora, da justificação administrativa, na pequena parte em que a mesma é perceptível, resulta precisamente que o critério utilizado rácios nacionais para a actividade de “comércio por grosso de sucatas e desperdícios” não é idóneo para a determinação global indirecta da matéria tributável na qual esteja também incluída a actividade de comércio de viaturas usadas e peças, pelo menos, sem que sejam demonstradas razões objectivas e controláveis de onde resultem inequivocamente justificada a existência de uma simetria entre as margens de um sector (comércio de sucata) e de outro (comércio de viaturas usadas e peças), sendo manifesto que a própria forma de comercialização de uns e de outros e os lucros associados têm diferenças abissais: compra-se/vende-se sucata ao quilo ou tonelagem, mas não se compra/vende viaturas usadas ao peso, como é consabido.
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Na ausência de um discurso administrativo, objectivamente fundado, que permitisse justificar a aplicação global de um rácio sectorial a uma actividade que aí não está abrangida, só se pode concluir pela inidoneidade e consequente ilegalidade de aplicação de um rácio que nada tem a ver – nem o contrário é demonstrado – com uma parcela dos rendimentos que acaba por ser determinada com base nesse critério inidóneo.
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Por outro lado, no que diz respeito aos critérios de quantificação, fosse em abstracto, fosse em concreto, o discurso administrativo é completamente omisso quanto à indicação dos preceitos legais habilitadores da quantificação concretamente operada, não sendo possível a um destinatário normal – medianamente capaz e, por isso, desprovido de formação jurídica especializadas – localizar e compreender os fundamentos da actuação administrativa, tanto mais que os mesmos resultam de uma interpretação – que não é pacífica – de uma norma (art. 90.º, n.º 1, da LGT) que tão-pouco se referenciou.
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A falta de indicação das normas relativas à quantificação por métodos indirectos, enquanto preceitos legais que permitem uma determinada actuação administrativa, corresponde a uma falta de fundamentação porque impossibilita a um destinatário normal a percepção da validade do agir administrativo em confronto com a normatividade que não tem obrigação de conhecer por extravasar claramente da esfera de normalidade dos conhecimentos atribuíveis ao cidadão médio/normal.
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Também todo o discurso administrativo relativo aos “critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso aos métodos indirectos” é de tal forma técnico e complexo que um destinatário normal, ou mesmo um destinatário relativamente qualificado, não consegue acompanhar as operações aí [não] “explicitadas”.
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Concede-se, em abono da verdade, que no meio do discurso técnico há frases que são mais ou menos perceptíveis, como aquela transcrita na sentença e que começámos por aqui também evidenciar: “será utilizada a mediana dos respectivos rácios, por representar os rácios do sujeito passivo mais central entre o número de declarantes”.
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Contudo, mesmo essa justificação é parca, redundante, “la palissiana” e não permite que o contribuinte se aperceba das razões determinantes da concreta actuação da AT, principaliter quanto ao critério de quantificação adoptado.
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Efectivamente, o que a AT afirma na justificação “supra” transcrita não é mais do que uma proposição do género: “será utilizada a mediana [que é o valor que representa a posição central entre o número de sujeitos passivos declarantes] por representar os rácios do sujeito passivo mais central entre o número de declarantes”. Ou seja: utiliza-se a mediana, porque é a mediana...
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A forma como um valor é encontrado não justifica, de “per se” a utilização desse valor sem a ponderação de quaisquer razões que permitam concluir que o sujeito passivo, em concreto, deve ocupar aquele lugar. Dizer-se que se aplica a mediana porque é a mediana não aporta ao discurso justificador o mínimo de cognoscibilidade relativamente à actuação administrativa.
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Mais, encontrando-se a AT a utilizar um critério não expressamente previsto, a fundamentação teria que incluir a explicitação das razões pelas quais se mobiliza aquele em concreto e não outro, dentro dos mesmos rácios. Por exemplo, porque não se utilizou o rácio nacional da rentabilidade fiscal das vendas nesse sector? q) Ainda quanto a este problema, se não há qualquer ponderação dos motivos que determinam a colocação do sujeito passivo devedor originário numa “posição intermédia”, não há qualquer razão compreensível – par além da mera subjectividade, que o dever de fundamentação visa controlar – para excluir a consideração dos valores mínimos e máximos da amostra, ou seja para preferir a “mediana” à “média”, sendo que esta é precisamente a medida que funciona como ponto de equilíbrio de um conjunto de dados, sendo o seu cálculo efectuado a partir de todos os valores de uma população.
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Ora, “in casu”, sendo os valores médios inferiores em mais de 50% aos valores da “mediana”, com maior propriedade se imporia que o discurso fundamentador desse a conhecer as razões pelas quais se optou por esse indicador tanto mais que o mesmo não reflecte a totalidade dos valores declarados, tratando-se de um “valor” que é encontrado a partir de uma posição intermédia, estatisticamente indiferente ao valor médio da amostra globalmente considerada.
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Partindo-se de um determinado rácio para quantificar os rendimentos e resultando desse rácio um conjunto de indicadores cuja mobilização se afigura possível em abstracto, não é admissível que seja o mero voluntarismo subjectivista do funcionário a determinar o porquê da aplicação de um indicador e não de um outro sem que essa escolha seja justificável e justificada perante o caso concreto, no sentido de desvelar as razões pelas quais se decide como se decidiu.
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O valor da posição central de uma amostra – mediana – não reflecte mais do que uma divisão dessa amostra, sendo, pois, um mero valor posicional, que, em rigor, corresponderá a um sujeito determinado e que irreleva os valores de conjunto na sua expressão quantitativa (ex. na amostra 1,2,10 ou 1,2,1000, o valor da mediana é o mesmo...).
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Ora, estando em causa a quantificação de rendimentos a partir de um rácio e não a posição que um sujeito ocupe na amostra, apenas os valores da média permitem dar a conhecer a expressão quantitativa dos rendimentos declarados por toda a amostra e não apenas por um sujeito.
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Pelo que, consequentemente, se se pretender afastar esse indicador em detrimento de outro, terão que ser explicadas as razões desse concreto proceder, quais sejam: os motivos pelos quais se coloca o sujeito passivo na posição correspondente à do sujeito que ocupa o lugar intermédio/central na amostra e, correspondentemente, as razões pelas quais se ignora a expressão quantitativa dos rendimentos declarados na sua globalidade por todo o universo que a compõe, dado que, para efeitos de quantificação, a posição central referida pela AT, face à globalidade dos rendimentos declarados/amostra, é dada quantitativamente pela média e não por um valor...
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