Acórdão nº 00877/14.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Abril de 2017
Magistrado Responsável | Jo |
Data da Resolução | 07 de Abril de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MMRGM intentou AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO E CONDENAÇÃO À PRÁTICA DE ATO LEGALMENTE DEVIDO contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P. (CGA), peticionando que seja anulado o ato administrativo impugnado e condenada a entidade demandada a praticar um novo acto administrativo, determinando a aposentação da A. ao abrigo de um regime análogo ao que se encontrava previsto na alínea b) do n.º 7 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 229/2005, de 29 de Dezembro, e calculando a pensão com base na fórmula prevista no artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, na redação em vigor em 31 de Dezembro de 2010, mas considerando, para efeitos de cálculo da parcela 1, a carreira completa de 32 anos, prevista naquele diploma legal; subsidiariamente, caso não seja reconhecido o direito da A. à aposentação ao abrigo do referido regime análogo ao da alínea b) do n.º 7 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 229/2005, de 29 de Dezembro, deve o ato administrativo que fixou o montante da pensão ser anulado e condenada a entidade demandada a praticar um novo ato administrativo, nos termos do n.º 2 e 3 do artigo 2.º da Lei n.º 77/2009, de 13 de Agosto, calculando a pensão da A. com base na fórmula prevista no artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, na redação em vigor à data do pedido de aposentação, mas considerando, para efeitos de cálculo da parcela 1, a carreira completa de 34 anos, e procedendo a uma redução proporcional da pensão (de 1,125%) em virtude dos 3 meses de antecipação.
Julgada a causa o TAF proferiu a seguinte decisão: «Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal em julgar procedente a presente ação administrativa especial, anulando-se o ato administrativo que fixou o montante da pensão e condenando a entidade demandada a praticar um novo ato administrativo, que fixe a pensão de aposentação nos termos do n.º 2 e 3 do artigo 2.º da Lei n.º 77/2009, de 13 de Agosto, calculando a pensão da A. com base na fórmula prevista no artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, considerando, para efeitos de cálculo da parcela 1, a carreira completa de 34 anos e procedendo à correspondente penalização.» Inconformadas, Autora e Ré vieram interpor recursos daquele acórdão.
*RECURSO INTERPOSTO PELA RÉ Conclusões da Recorrente CGA: A - A questão de direito prende-se, em síntese, em saber se no cálculo da pensão de aposentação da Autora deve relevar o fator de carreira completa dos 40 anos previsto no regime geral conforme disposto no n.º 3 do artigo 2.º da Lei n.º 77/2009, de 13 de agosto ou o fator 34 anos estipulado no n.º 1 do artigo 2.º da referida Lei n.º 77/2009.
B - Salvo o devido respeito, o Acórdão recorrido, ao concluir que o cálculo da pensão de aposentação da Autora deve basear-se numa carreira completa de 34 anos de serviço, não interpreta nem aplica corretamente o disposto no n.º 1 e 3 do artigo 2.º, da Lei n.º 77/2009, de 13 de agosto.
C - Na presente situação, a Autora não tinha 57 anos de idade à data em que apresentou o seu requerimento de aposentação, nem nos três meses subsequentes, nem tão pouco à data do despacho que lhe reconheceu o direito à aposentação.
E - Ora, embora a Autora reunisse as condições legais para a aposentação, ao abrigo dos Artigos 1.º e n.º 3 do 2.º, da Lei n.º 77/2009, de 13 de agosto, o que foi reconhecido pelo despacho impugnado, no cálculo da pensão foi considerada a carreira completa em vigor na data da aposentação.
F - Assim, o processo de aposentação da Autora está corretamente tratado, devendo improceder todas as conclusões constantes da decisão proferida no Tribunal “a quo”.
*A Recorrida/Autora contra alegou sustentando, em suma, que «Nenhum reparo merece o douto acórdão proferido pelo Tribunal a quo na parte em que condenou a Recorrente a praticar o acto administrativo legalmente devido, calculando a pensão da A. com base na carreira completa de 34 anos.
*RECURSO INTERPOSTO PELA AUTORA Conclusões da Recorrente: 1. Nenhum reparo merece o douto acórdão na parte em que condenou a entidade demandada a calcular a pensão da R. com base na carreira completa de 34 anos, prevista no artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 77/2009, de 13 de Agosto.
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Não obstante, o acórdão é nulo, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d), do n.º 1, do artigo 615.º do C.P.C., em virtude de o Tribunal a quo não se ter pronunciado sobre (i) o pedido de aplicação da fórmula de cálculo em vigor à data do pedido e (ii) o pedido de redução proporcional da pensão (de 1,125%) em virtude dos 3 meses de antecipação (em vez dos 4,5% aplicados pela entidade demandada).
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Antes da entrada em vigor da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, estabelecia o n.º 1 do artigo 43.º do EA:Artigo 43.º Regime da aposentação1. O regime da aposentação voluntária que não dependa de verificação de incapacidade fixa-se com base: a) Na lei em vigor e na situação existente na data indicada pelo interessado como sendo aquela em que pretende aposentar-se; b) Na lei em vigor à data em que seja recebido o pedido de aposentação pela CGA, sem prejuízo do disposto no n.º 7 do artigo 39.º, e na situação existente à data em que o mesmo seja despachado, se o interessado não indicar data a considerar.
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Quanto à lei aplicável à aposentação, a referida norma estabelecia duas soluções: (i) sempre que o subscritor indicasse uma data na qual se pretendesse aposentar, aplicava-se a lei em vigor nessa data; (ii) nos restantes casos, aplicava-se a lei em vigor na data do pedido de aposentação.
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No que concerne à situação relevante (idade e tempo de serviço), em ambos os casos considerava-se a situação existente à data do despacho.
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O referido regime permitia aos subscritores da CGA determinar, com um elevado grau de certeza, as regras aplicáveis à sua aposentação e, com base nelas, calcular a pensão que lhes seria atribuída.
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Quando um subscritor apresentava um pedido de aposentação sabia antecipadamente que não seria abrangido por eventuais alterações legislativas (invariavelmente prejudiciais ao subscritor) posteriores à data do pedido.
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O n.º 1 do artigo 43.º do EA assegurava, por isso, o respeito escrupuloso pela segurança jurídica e pela confiança dos cidadãos (subscritores da CGA).
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Com a entrada em vigor da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, procedeu-se à alteração do n.º 1 do referido artigo 43.º do EA, que passou a dispor o seguinte:Artigo 43.º Regime da aposentação1. O regime da aposentação voluntária que não dependa de verificação de incapacidade fixa-se com base na lei em vigor e na situação existente na data em que se profira despacho a reconhecer o direito à aposentação.
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Com a alteração operada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, os subscritores da CGA deixaram de poder prever quais as normas aplicáveis à sua aposentação, bem como calcular a sua pensão.
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Ao determinar que a aposentação se fixa com base na lei em vigor à data do despacho, o subscritor passou a estar sujeito a eventuais alterações nos pressupostos da aposentação (idade e tempo de serviço), bem como na fórmula de cálculo, com as quais não pode contar à data do pedido e que lhe podem frustrar as legítimas expectativas de obter a pensão que havia calculado.
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Com a actual redacção do n.º 1 do artigo 43.º do EA, o Estado passa a ter um instrumento para reagir a pontuais aumentos dos pedidos de aposentação, retendo os pedidos pendentes e alterando as regras de aposentação de forma a reduzir os encargos da CGA .
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O n.º 1 do artigo 43.º do EA, ao determinar a aplicação da lei em vigor à data do despacho, viola os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos, ínsitos no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, sendo materialmente inconstitucional.
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Como afirma Gomes Canotilho, «O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida».
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A segurança jurídica está directamente relacionada com elementos objectivos da ordem jurídica, tais como a garantia de estabilidade jurídica, a segurança da orientação e a realização do direito, ao passo que a protecção da confiança se prende com as componentes de ordem subjectiva da segurança, tais como a previsibilidade e a calculabilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos dos poderes públicos.
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Acrescenta o Ilustre Professor que «a segurança e a protecção da confiança exigem, no fundo: (1) fiabilidade, clareza, racionalidade e transparência dos actos do poder; (2) de forma que em relação a eles o cidadão veja garantida a segurança nas suas disposições pessoais e nos efeitos dos seus próprios actos» .
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A actual redacção do n.º 1 do artigo 43.º do EA não permite qualquer previsibilidade ou calculabilidade dos subscritores em relação aos actos do poder público, pois, após a apresentação do pedido de aposentação, o Estado pode alterar as regras num sentido desfavorável ao subscritor, frustrando as suas legítimas expectativas de obter uma pensão determinada.
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Foi precisamente isso que aconteceu à R., que apresentou o pedido de aposentação em Agosto de 2013 e viu o despacho de aposentação ser proferido em Setembro de 2014 (pontos 4) e 5) dos factos provados).
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Entre a data do pedido e a data do despacho, o legislador, através da Lei n.º 11/2014, de 6 de Março, alterou a idade da aposentação (que passou a ser de 66 anos) e as regras de cálculo da pensão (artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro) num sentido desfavorável à R..
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No que concerne à idade de aposentação, o problema foi resolvido pela via legislativa, pois a Assembleia da República, através da Lei n.º 71/2014, de 1 de Setembro, veio repor a situação anterior, configurando o artigo 2.º da Lei n.º 77/2009, de 13 de Agosto, como uma excepção à regra segundo a qual os subscritores da CGA só podem pedir a aposentação ordinária quando completarem 66 anos.
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Já quanto à fórmula de cálculo, o problema...
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