Acórdão nº 02801/16.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução23 de Junho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A BRISA – Concessão Rodoviária, SA, no âmbito do identificado Processo de Contencioso Pré-Contratual intentado contra si pelas ABB – ABB, SA, e Sociedade de Construções SC, SA, inconformada com a Sentença proferida no TAF do Porto em 27/02/2017 que julgou a presente ação procedente, e consequentemente, anulou as deliberações da Ré, de 07/11/2016, pelas quais declarou a caducidade da adjudicação da empreitada a favor das Autoras e adjudicou a empreitada ao concorrente n.º 2, veio interpor Recurso Jurisdicional, no qual concluiu: “1. A Sentença proferida pelo TAF do Porto, pela qual se anulou a deliberação do Conselho de Administração da BCR que declarou a caducidade da adjudicação às Autoras do contrato concursado ― e subsequentemente anulou também a deliberação que adjudicou o contrato ao 2º classificado ― padece de erro de julgamento e é absolutamente inédita.

  1. O que aconteceu foi que o Tribunal entendeu que a Brisa não concedeu audiência às Autoras dentro da “temporalidade devida” (!), é dizer, por a referida audiência, prévia à declaração de caducidade da adjudicação do contrato às Autoras, não ter tido lugar “logo” a seguir ao decurso do prazo para a entrega dos documentos de habilitação e da prestação da caução (!).

  2. Há erro de julgamento porque não decorre da lei ou de qualquer princípio jurídico a existência de qualquer prazo perentório para a promoção e realização da audiência prévia – sobre esse assunto, o que a lei prevê é apenas que a audiência deverá realizar-se após o “facto que determine a caducidade da adjudicação”, o que, no caso da alínea a) do n.º 1 do artigo 86º do CCP, equivale a dizer que a audiência se realizará em momento posterior ao termo do “prazo fixado no programa do procedimento” 4. A audiência prévia prevista no artigo 86º/2 do CCP ocorrerá tempestivamente sempre que se realize após o “facto que determine a caducidade da adjudicação” e em momento que permita cumprir integralmente o único fim para que foi prevista ― perceber se a inobservância pelo adjudicatário do prazo previsto no programa do procedimento para a apresentação dos documentos de habilitação e para a prestação da caução lhe é ou não imputável ―, permitindo ao adjudicatário carrear para o processo tudo quanto considere relevante para esse efeito, permitindo-lhe participar de forma efetiva na formação da decisão final.

  3. E só isto quanto interesse para o bom julgamento do presente recurso, uma vez que, no caso, as Autoras foram notificadas, no dia 10.10.2016, para se pronunciarem, “nos termos e para os efeitos do n.º 2 do Art. 86º do Código dos Contratos Públicos”, tendo-lhes sido concedido para tanto um prazo correspondente ao limite máximo previsto no artigo 86º/2 do CCP: 5 dias.

  4. O que se segue interessa, mas não contribui decisivamente para este recurso.

  5. A essa data, isto é, à data da notificação para a audiência prévia, as Autoras não tinham apresentado ainda vários documentos de habilitação exigidos pelo programa de concurso e não tinham prestado a caução nos termos devidos ― uns só foram mais tarde, outros ainda mais tarde e a caução ainda não foi, até hoje, prestada nos termos legais.

  6. Na deliberação sobre a caducidade da adjudicação, o Conselho de Administração da BCR tomou posição sobre os argumentos invocados pelas Autoras na sua audiência prévia, explicando detalhadamente as razões por que, na sua opinião, não se poderia entender que o atraso na entrega dos documentos de habilitação e na prestação da caução não eram imputáveis ao adjudicatário.

  7. Há erro de julgamento uma vez que a BCR não “descurou” ou “não prestou a devida atenção” ao “requerimento submetido à plataforma pelo adjudicatário [as Autoras], em que alegaram ter dificuldade em apresentar os documentos atinentes à consorciada SC por a mesma ter entrado em regime de PER (CIRE)”, uma vez que ele foi devidamente apreciado e decidido na Deliberação da BCR de 07.11.2016.

  8. Também no que diz respeito ao dever que impenderia sobre a BCR de “de apreciar e decidir” o requerimento apresentado pelas Autoras “em 14 de Setembro de 2016, em que alegaram em torno da necessidade de lhes ser concedido prazo adicional”, o TAF do Porto incorreu em erro de julgamento, na medida em que tal pretensão foi também objeto de apreciação e decisão na Deliberação da BCR de 07.11.2016.

  9. A decisão implícita na Sentença no sentido de que deveria realizar-se novamente uma nova audiência prévia carece de sentido lógico e enferma de erro de julgamento.

  10. Por um lado (na parte da lógica), a admitir-se que a audiência prévia do dia 10.10.2016 ocorreu tardiamente, que sentido faz considerar que a reposição da legalidade se há-de processar através de uma nova audiência prévia a realizar bem mais tarde, por exemplo, em Março de 2017, se a BCR se resignasse com o teor da Sentença e optasse pelo seu cumprimento? 13. Por outro lado (na parte do Direito), qualquer ilegalidade que pudesse existir pelo facto de a audiência ter sido tardia (!) deveria degradar-se em formalidade não essencial ou numa mera irregularidade, insuscetível de produzir qualquer efeito invalidante dos atos do procedimento, pois, como tem sido jurisprudência dominante de todos os tribunais superiores, não será de decretar a anulabilidade do ato, por ilegalidade formal (vg, preterição de audiência prévia), sempre que se possa dizer que, apesar da ilegalidade, a formalidade cumpriu integralmente a sua função, de chamar o adjudicatário a oferecer os factos demonstrativos da inimputabilidade, à sua pessoa ou condição, do atraso verificado, como aconteceu no caso.

  11. Mesmo que tardia, a audiência prévia cumpriu a sua função, em termos juridicamente idênticos ao que sucederia se ela tivesse tido lugar “logo” a seguir ao decurso do prazo para a apresentação dos documentos de habilitação.

  12. Há também erro de julgamento porque a decisão é ao adjudicatário, claro, que cabe o ónus de alegar e demonstrar perante a entidade adjudicante que o incumprimento do prazo estabelecido para a apresentação dos documentos de habilitação não lhe é imputável, não havendo na lei qualquer dever instrutório específico que obrigasse a entidade adjudicante nesta matéria, nem a lei estabeleceu que devesse existir uma fase instrutória prévia à própria audiência prévia (!) onde a entidade adjudicante tivesse de fazer uma “avaliação em articulação com o adjudicatário” sobre os motivos para o atraso.

  13. A apreciação sobre a imputabilidade, ou não, do incumprimento do prazo para a apresentação dos documentos de habilitação e para a prestação da caução não pode deixar de tomar em consideração o facto de se estar perante um momento ainda competitivo do procedimento, uma vez que há outros concorrentes que têm um interesse legalmente protegido na obtenção da adjudicação subsequente.

  14. No caso em apreço, a imputabilidade às Autoras da falta de apresentação dos documentos de habilitação e do comprovativo de prestação de caução não suscita dúvidas, nem o TAF do Porto considerou que suscitasse ― sobretudo tendo em consideração que os últimos documentos de habilitação apresentados diziam respeito a declarações das próprias Autoras, sem intervenção de terceiros.

    Nestes termos, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., que se roga, deve ser dado provimento ao presente recurso, e consequentemente, revogar-se a Sentença recorrida, com todas as demais consequências de lei.” A ABB – ABB, SA e Sociedade de Construções SC, SA vieram a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso, tendo simultaneamente apresentado Recurso Subordinado, no qual concluíram: “I Nos presentes autos, vem a Recorrente apelar da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a ação de contencioso pré-contratual determinando: - A anulação das deliberações da Recorrente, datadas de 07 de novembro de 2016, pelas quais declarou a caducidade da adjudicação da empreitada a favor das Recorridas [que havia sido decidida em 19 de Setembro de 2016], e adjudicou a empreitada às Contrainteressadas; II. Ora, salvo o devido respeito, as Recorridas discordam em absoluto da Recorrente, considerando, pois, que bem andou o douto Tribunal a quo, devendo ser mantida, nesta parte, a decisão; III. Desde logo, a Recorrente assenta a sua construção argumentativa selecionando os factos que melhor servem a sua tese, omitindo (e deturpando até) outros; Senão vejamos, IV. É falso que tenha existido, apenas, um projeto de ato de declaração de caducidade adotado pelo Administrador Delegado, existiu, isso sim, uma decisão de caducidade para a qual aquele administrador não dispunha de poderes; V. É falso que essa decisão não houvesse sido notificada aos concorrentes; VI. Tal como resulta do ponto 15 da factualidade dada como provada – que a Recorrente não contesta nem pede que seja alterada –, este suposto projeto consubstancia uma decisão e, de facto, foi notificado aos Concorrentes “15 – No dia 27 de outubro de 2016, foi emitida certidão no seio da Ré, pela qual, em suma, é certificada cópia de uma decisão emitida por ML, na qualidade de Administrador Delegado da Ré, dela constando [certidão], que a decisão foi colocada na Plataforma Pública de Contratação a 19 de setembro de 2016 – Cfr. certidão emitida pela Ré, emitida em 27 de outubro de 2016, que constitui fls. 707 a 711 do Processo Administrativo;” VII. Ou seja, não só trata-se de uma verdadeira decisão de caducidade emitida por quem não detinha os necessários poderes para o efeito (não um projeto de decisão como refere a Recorrente), como, também, foi notificada aos concorrentes; VIII. Em virtude da decisão que já havia sido proferida e notificada às Recorridas em 19.09.2016 “Independentemente dos entendimentos posteriores que a Ré veio a assumir”, certo é que pela decisão do seu Administrador Delegado, datada de 19 de Setembro de 2016 foi declarada a caducidade da adjudicação...

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