Acórdão nº 00481/10.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução13 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Stal-Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, em representação e defesa do seu associado MFS, instaurou acção administrativa especial contra o Município de Sernancelhe, todos melhor identificados nos autos, com vista à impugnação da deliberação da Câmara Municipal de Sernancelhe, aprovada em reunião ordinária de 08/06/2010, que lhe aplicou a pena disciplinar de despedimento por facto imputável ao trabalhador.

Concluiu pedindo «…deve ser julgada procedente por provada a presente acção e em consequência:

  1. Ser a deliberação impugnada declarada nula por desrespeitar a garantia de audiência e defesa assegurada ao arguido, nos termos do que decorre do artigo 37.º, n.º 1 do ED e também dos arts. 269.º, n.º 3 e 32º nº 3 da Constituição da República Portuguesa uma vez que no caso dos trabalhadores com contrato em funções públicas, essa garantia de audiência e defesa goza da protecção constitucional; Ou caso assim se não entenda, b) Ser a deliberação impugnada anulada por violar de forma grosseira os princípios da proporcionalidade e da adequação consagrados nos arts. 266.º n.º 2 da CRP e 5º, nº 2 do CPA, bem como o princípio da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos consagrado no art 266.º, n.º 2 da CRP e 3.º do CPA, pelos quais se deveria pautar e bem assim o art. 18º nº 1 als. a), b) e c) do ED, por ter enquadrado incorrectamente os factos dados como provados na previsão deste preceito legal; Ou caso ainda assim se não entenda, c) Ser a mesma deliberação impugnada anulada por assentar em erro nos seus pressupostos de facto, uma vez que não são verdadeiros os factos apurados no processo disciplinar pelos quais o A foi condenado, fazendo-se por esta via uma errada aplicação do art. 18º nº 1 als. a), b) e c) do ED; E, em qualquer caso, d) Ser o R condenado a readmitir ao serviço o A, para o exercício das funções que competem à sua categoria e carreira, uma vez que o A opta pela sua reintegração; e) Ser o R condenado a pagar ao A. as remunerações que teria auferido caso se encontrasse ao seu serviço efectivo desde a data em que deixou de lhe ser paga a sua remuneração mensal até à data em que for readmitido ao serviço fruto da procedência da providência cautelar de suspensão de eficácia ou, na hipótese de improcedência desta, até à data em que for declarada nula ou anulada a deliberação impugnada objecto dos presentes autos, remunerações essas acrescidas dos competentes juros de mora a contar da data em que as mesmas devessem ser pagas ao A. caso não lhe tivesse sido imposta a pena de despedimento, até efectivo e integral pagamento; f) Ser declarado que o período de tempo cumprido efectivamente pelo A em consequência da pena de despedimento que lhe foi aplicada, releva para todos os efeitos legais, designadamente, promoção, mudança de posição remuneratória, aposentação e benefícios sociais; g) Ser o R condenado a pagar ao A. a quantia de € 8 000, 00 a título de danos não patrimoniais acrescidos de juros de mora à taxa legal a contar da sua citação para a presente acção até efectivo e integral pagamento.».

    Por acórdão proferido pelo TAF de Viseu foi julgada procedente a acção, declarada nula a deliberação impugnada e condenada a Entidade Demandada: - a readmitir o associado do A., nos termos por si peticionados em d) do petitório.

    - no peticionado na alínea e) do petitório, ao abrigo do disposto no artigo 64º, nº 1, alínea b) e nºs 2 a 5 do ED.

    - no peticionado na alínea f) do petitório, que resulta da reconstituição da situação atual hipotética do associado do A., nomeadamente para efeitos de contagem do tempo de serviço e sem prejuízo das medidas legislativas entretanto ocorridas e aplicáveis à situação do seu associado.

    - ao pagamento da quantia de € 8.000,00, a título de danos não patrimoniais.

    Deste vem interposto recurso.

    Alegando, o Município formulou as seguintes conclusões: 1. O Acórdão a quo entendeu que a pena aplicada ao associado do Recorrido não foi precedida da perscrutação de facto que permitiria fundar e suportar o juízo de inviabilidade previsto no artigo 18º, nº 1, do ED. E que por isso é nula. Porém, muito se estranha este entendimento do Tribunal a quo, porquanto, no Processo n.º 480/10.6 BEVIS, num caso muito semelhante, relativo ao mesmo “pedaço de realidade”, com as mesmas partes, embora respeitante a outra associada do Recorrido, no caso, a irmã do associado do Recorrido a que se referem os presentes autos, o entendimento foi diametralmente oposto; 2. Nesse caso, entendeu o Tribunal a quo que, na Acusação, a Sr.ª Instrutora, depois de descrever pormenorizadamente os factos imputados à associada do A., procedeu ao enquadramento jurídico dos mesmos (ponto B.) e que, nesse enquadramento jurídico, consta expressamente, que esses factos são subsumíveis no âmbito da previsão do art. 18º, n.º 1, alínea a) e b) e c) do Estatuto Disciplinar, e que a arguida incorria na respectiva pena de despedimento por facto imputável ao trabalhador prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 9º caracterizada no n.º 6 do art. 10º e cujos efeitos estão previstos no n.º 4 do art. 11º da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro.

    3. Mais disse o Tribunal a quo, nesse caso, que a arguida tomou conhecimento dos factos que lhe eram imputados e que os mesmos podiam determinar a aplicação de uma pena expulsiva, e quais os fundamentos que podiam ser invocados para sustentar uma eventual inviabilização da manutenção da relação funcional; Nesse sentido, entendeu não se verificar a alegada nulidade insuprível; 4. Este acertado juízo, num caso cujos pressupostos de facto e de Direito são directamente sobreponíveis aos dos presentes autos, deveria, salvo o devido respeito, ser mantido no caso vertente; 5. Porém, sem que se encontre fundamento suficiente para tal, o Tribunal a quo entendeu mudar radicalmente de posição, no que constitui um manifesto erro de julgamento, em claro prejuízo da estabilidade do ordenamento jurídico, da benéfica constância das decisões judiciais e, ainda, da igualdade e equidade no tratamento dos cidadãos perante a Justiça; 6. Tal como é reconhecido pelo Tribunal a quo relativamente ao Processo n.º 480/10.6 BEVIS, nos presentes autos, na Acusação, a Sr.ª Instrutora, depois de descrever pormenorizadamente os factos imputados ao associado do Recorrido, procedeu ao enquadramento jurídico dos mesmos (ponto B.)); 7. Nesse enquadramento jurídico consta expressamente, que esses factos são subsumíveis no âmbito da previsão do art. 18º, n.º 1, alínea a) e b) e c) do Estatuto Disciplinar, e que o arguido incorria na respectiva pena de despedimento por facto imputável ao trabalhador prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 9º caracterizada no n.º 6 do art. 10º e cujos efeitos estão previstos no n.º 4 do art. 11º da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro; 8. O associado do Recorrido passou, assim, a saber que os factos que lhe eram imputados podiam conduzir ao despedimento, por inviabilizarem a manutenção da relação funcional, passando ainda a contar com a referência expressa das alíneas do artigo 18.º do Estatuto Disciplinar que a Sr. Instrutora pretendia mobilizar para, caso a prova a produzir e o contraditório a realizar o determinassem, propor a aplicação de uma pena expulsiva, por estar inviabilizada a manutenção da relação funcional; 9. Estavam criadas todas as condições para o exercício pleno da defesa do associado do Recorrido, tanto no plano dos factos, como no plano do Direito!; 10. Como é de elementar ciência, não podia na fase da Acusação discorrer-se alargadamente sobre a inviabilização da manutenção da relação funcional, pois a existência ou não desse juízo concreto estava dependente do contraditório e da instrução que se iam seguir; 11. Aliás, fazer esse excurso nessa sede seria, isso sim, contrário aos direitos do arguido, por poder significar uma condenação prematura e não influenciada pela instrução; 12. Uma coisa é insofismável: o arguido sabia os factos que lhe eram imputados, que os mesmos podiam determinar a aplicação de uma pena expulsiva, e quais os fundamentos que podiam ser invocados para sustentar uma eventual inviabilização da manutenção da relação funcional; O arguido pôde defender-se relativamente a todos esses aspectos de facto e de Direito, e assim se defendeu como quis; 13. Mas ainda que assim não fosse, o que por mero exercício de raciocínio se admite, ou seja, ainda que a Acusação tivesse fragilidades, convém ter presente o acertado entendimento que se retira do seguinte aresto do Supremo Tribunal Administrativo: - “Os processos disciplinares não estão sujeitos às férreas exigências de rigor técnico-jurídico dos processos criminais, não só devido à distinta natureza dos interesses em presença, mas também porque seria excessivo impor aos instrutores daqueles processos uma proficiência pensada para a magistratura. Consequentemente, a circunstância de a acusação carecer de referências expressas ao conhecimento, por parte do arguido, das circunstâncias que rodearam a acção e à sua vontade de realizar as condutas que lhe eram atribuídas não acarretava a conclusão automática de que a respectiva responsabilidade disciplinar seria necessariamente indetectável, por falta do seu necessário elemento subjectivo. E, exactamente ao invés, deverá considerar-se que a imputação dessa responsabilidade foi suficientemente feita se os termos da acusação, ainda que através de juízos implícitos, inequivocamente a revelarem.” - Ac. do STA de 11/12/2002 (Processo 38/892) in www.dgsi.pt; 14. Como será fácil de admitir, por maioria de razão, esta jurisprudência teria de aplicar-se a qualquer eventual falha (que inexiste todavia in casu) no discurso pormenorizado do Instrutor acerca da inviabilização da manutenção da relação funcional, matéria que pressupõe a realização de prova e do contraditório; 15. Veja-se, ainda, que, num...

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