Acórdão nº 01705/12.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Na acção administrativa comum, com processo sumário, em que é Autor DASC, Ré, “Auto Estradas Norte Litoral-Sociedade Concessionária AENL, S.A.” e Interveniente Acessória “Companhia de Seguros ZI”, todos já melhor identificados nos autos, veio aquele pedir a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 12 494,03, acrescida de juros, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada parcialmente procedente a acção e condenada a Ré a pagar ao Autor a soma de € 6.813,83, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Desta vem recorrer a Ré.

Alegando, formulou as seguintes conclusões: A) O nº 1 do artigo 12º da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho, estatui que o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança em caso de acidente rodoviário cabe à concessionária; B) Trata-se de presunção indirecta porque não se diz que se presume o incumprimento mas, antes, que se deve provar o cumprimento das obrigações de segurança; C) Tendo em consideração a formulação legal a obrigação que é cometida à concessionária é de meios e não de resultado; D) Sendo obrigação de meios compete à concessionária envidar esforços com vista a acautelar a segurança da circulação, obrigação essa que não passa pelo impedimento de ocorrências danosas; E) Na esteira do entendimento da obrigação de meios a satisfação do ónus que impende sobre a concessionária passa pela demonstração de terem sido respeitados os deveres do comportamento exigíveis segundo o padrão do bónus pater famílias, sem que seja necessário provar o facto estranho que desencadeou o sinistro, uma vez que tais deveres fixam a medida do risco permitido; F) Segundo a decisão recorrida a ré para afastar a presunção de incumprimento que sobre si impende deveria provar, em concreto, que o canídeo surgiu de forma incontrolável para si ou aí foi colocado na autoestrada negligente ou intencionalmente, por outrem; G) Esta prova é totalmente inatingível; H) Se, porventura, o animal tivesse sido colocado na autoestrada com toda a probabilidade que o seu autor só o faria com a certeza antecipada de que não estava a ser visto; I) Também não se descortina a possibilidade de o canídeo ser colocado na autoestrada de forma negligente; J) O canídeo é um animal irracional, o que explica a forma imprevisível e incontrolável da sua intromissão na via; K) O cumprimento da exigência que a decisão recorrida coloca à concessionária só seria alcançável se esta tivesse dotes premonitórios e de omnipresença; L) Não é possível que a concessionária exerça uma vigilância total, implacável e infalível a toda a extensão da via ao mesmo tempo; M) Terá necessariamente de haver um hiato temporal relativamente à última passagem do vigilante na via; N) Neste particular, ficou provado que os vigilantes em cada dia passam doze vezes pelo mesmo local, o que se afigura razoável e que satisfaz plenamente a obrigação de meios cometidos à concessionária; O) A presença dos vigilantes na via é permanente e ininterrupta, todos os dias do ano; P) A vedação é vigiada com regularidade e também ficou provado que após o acidente foi inspecionada numa extensão de 6,800km, nos dois sentidos da via, e nenhuma anomalia foi detectada; Q) A A28 no percurso compreendido entre Sendim e Viana do Castelo tem vinte nós; R) Esses nós são dotados de entradas e saídas; S) É sabido que os nós não podem ser vigiados permanente e ininterruptamente, porquanto tal implicaria a disponibilidade permanente de número muito significativo de vigilantes, superior à centena; T) Tendo em conta que a obrigação que impende sobre a ré é de meios e a matéria de facto provada a ré cumpriu cabalmente a sua obrigação; U) Outra conduta ou condutas em termos de exequibilidade não lhe podem ser exigidas; V) Está provado que a ré tudo fez para identificar o proprietário do canídeo; W) A sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do nº 1 do artigo 12º da Lei 24/2007, de 18 de Julho, não obstante estar respaldada na jurisprudência que invoca; X) Tal interpretação obrigaria a concessionária a ter um domínio total, absoluto, permanente e implacável sobre a via concessionada para poder estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe permitiu evitar a entrada do canídeo na via; Y) Estamos perante a chamada “probatio diabólica”, totalmente incompatível com a obrigação de meios.

Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, absolvendo-se a ré, como é de inteira e esperada JUSTIÇA.

Não foram juntas contra-alegações.

O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1) A R. é concessionária do Estado para a construção, conservação e exploração das auto-estradas que lhe foram concessionadas por lei, de entre as quais conta-se a A28.

2) A GNR elaborou a participação de ocorrência de trânsito no dia 27/8/2011, relativa a colisão com animal na via, que integra o doc. 7 junto com a p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

3) Nesse dia estava bom tempo e o piso seco.

4) O A., através do seu mandatário, remeteu à R. o e-mail que integra o doc. 8 junto com a p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

5) A R. respondeu nos termos do doc. 9 junto com a p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

6) O A., através do seu mandatário, voltou a remeter à R. um e-mail que integra o doc. 10 junto com a p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

7) A R. respondeu nos termos do doc. 11 junto com a p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

8) A R. elaborou o registo de operações de socorro que consta do doc. de fls. 56 a 62 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

9) O cão foi recolhido já sem vida pelo funcionário da R., FJPM.

10) Com data de 26/7/2011 a R. elaborou o registo que integra o doc. que consta de fls. 63 a 65 dos autos, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

11) Desse registo consta que: “ No sentido Sul/Norte entre os km 28,500 e 28,700 foram colocados 16 metros de rede roubada; - No sentido Norte/Sul entre o km 26,250 e 26,260 foi reparada a rede que se encontrava rebentada” 12) A R. transferiu a responsabilidade pelos danos causados a terceiros, enquanto concessionária da A28 para a “ZI plc — Sucursal em Portugal”, pelo contrato de seguro titulado pela apólice n° 005735168 — doc. de fls. 56 a 77, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

13) O A. é proprietário do veículo da marca Citroen, modelo C3, com a matrícula **-DX-** – doc. de fls. 159 (proc. físico).

14) No dia 27.08.2011, cerca das 00.20h, na A28, no sentido Porto/Valença, ou seja, no sentido Sul/Norte, ao km 23,9, na localidade de Mindelo, concelho de Vila do Conde, distrito do Porto, ocorreu um acidente de viação em que foi interveniente o veículo ligeiro de passageiros da marca Citroen, modelo C3, com a matrícula **-DX-**.

15) Veículo este que era conduzido, no momento do acidente, pelo A. seu proprietário.

16) O A. seguia no A28 no sentido Porto/Valença pela metade esquerda da faixa de rodagem atento o seu sentido de marcha na sequência de uma ultrapassagem.

17) Ao km 23,9 surgiu à frente do DX e em plena faixa de rodagem um cão de grande porte em movimento de atravessamento da estrada – cfr. doc. fls. 56 registo de operações de socorro da R.

18) ...tendo atravessado toda a estrada surgindo da faixa de rodagem da direita.

19) O A. perante o aparecimento súbito do animal accionou de imediato os travões mas não conseguiu evitar o atropelamento.

20) Por isso perdeu o controlo do DX não conseguindo evitar a colisão com as rails do seu lado esquerdo respeitantes ao separador central.

21) O que fez o veículo entrar em despiste.

22) Acabando por se imobilizar na esquerda da estrada atento o seu sentido de marcha.

23) Em virtude do acidente, o veículo sinistrado ficou danificado na parte da frente, por baixo e em toda a zona lateral esquerda e a carroçaria ensanguentada.

24) O animal era de grande porte.

25 A sua reparação está orçada em € 6.813,83.

27) O DX ultrapassou o 82-FU-46 conduzido por CSMA.

28) O A. sofreu canseiras, incómodos e dispêndio de tempo.

29) Em face da recusa do R. em assumir responsabilidades o A. não deu ordem imediata de reparação do DX.

30) Ficou bastante tempo sem poder utilizar o seu automóvel.

31) Sofreu com o sucedido angústia e ansiedade, quer durante o acidente, quer depois.

32) O A. é estudante e jogador de andebol.

33) É atleta federado da Associação Desportiva Académica da Maia.

34) Treina diariamente e tem jogos aos sábados.

35) Durante todo este período esteve dependente de familiares e amigos para se deslocar quer para treinos, quer para jogos.

36) Às quartas-feiras os treinos acabam cerca das 23 horas.

37) A hora tardia de saída do pavilhão provocou-lhe inúmeros transtornos para regressar a casa tendo de pedir a amigos e colegas de equipa para o...

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