Acórdão nº 00094/06.5BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução11 de Maio de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA veio interpor recurso do acórdão pelo qual o TAF de MIRANDELA, na presente AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL instaurada por LCMTS, julgou procedente a presente ação e, em consequência, anulou o ato impugnado mediante o qual foi aplicada à A. A pena disciplinar de inactividade pelo período de um ano.

*Conclusões do Recorrente: I. O douto Acórdão, de 27JAN14, foi proferido com errado enquadramento jurídico dos factos (cfr. fls. 20 a 24) na medida em que, contrariamente ao que ali se decidiu, os factos provados permitem concluir pela violação dos deveres de imparcialidade, isenção, obediência e lealdade, o que justifica cabalmente a aplicação da pena disciplinar de um ano de inatividade; II. A assinatura e assunção do conteúdo das impugnações judiciais em causa decorreu da qualidade de funcionária da Direcção-Geral de Viação e resultou diretamente da atividade desempenhada e conhecimentos adquiridos na Delegação de Viação de VR; III. A Autora ao serviço da Delegação de Viação de VR apenas deveria realizar atos e operações tendentes a levar a cabo o procedimento instaurado contra arguidos e bastaria a sua própria qualidade de funcionária ao serviço exclusivo do interesse público para a impedir de atuar ao abrigo de qualquer outro mandato e muito menos elaborar impugnações judiciais em defesa de arguidos; IV. A Autora assinou as impugnações judiciais a pedido de um amigo, “alguém da sua esfera de relacionamentos privados” (JAF), que tinha prometido ao infrator (AJMP), que não se preocupasse porque conhecia uma funcionária da Delegação de Viação de VR de nome LT, que o iria ajudar; V. Atenta gravemente contra a dignidade e o prestígio da função a Autora que assinou impugnações judiciais em defesa de um arguido, bem sabendo que o processo contra-ordenacional era proveniente do serviço público onde desempenhava funções; VI. O que torna irrelevante a resposta às questões colocados a fls. 23 do Acórdão recorrido: se interveio em momento anterior nos processos de contraordenação em causa?; se realizou as impugnações no horário de serviço?; ou se utilizou os meios da Delegação de Via Real?; VII. A Autora não atuou com isenção ao ajudar o arguido, por motivo de amizade; não recebeu qualquer ordem superior para elaborar impugnações judiciais em defesa de arguidos; e ao assinar as impugnações judiciais atou contra o interesse do serviço; VIII. O facto de a Autora se encontrar, na data da prática dos factos, em situação de atestado médico (cfr. fls. 132) não afasta a sua responsabilidade disciplinar, já que em nenhum momento se interrompeu ou suspendeu a relação jurídica de emprego público com a Delegação de Viação de VR; IX. Considera-se infração disciplinar o facto, ainda que meramente culposo, praticado pelo funcionário ou agente com violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função que exerce (cfr. o artigo 3.º do ED) – ao utilizar a terminologia “decorrentes da função que exerce” e não “no exercício da função” o legislador não afasta, nem poderia afastar, a responsabilidade disciplinar de um funcionário ou agente em situação de atestado médico; X. Com a conduta adotada a Autora infringiu: a) O dever geral de atuar no sentido de criar no público confiança na ação da Administração Pública, em especial no que à sua imparcialidade diz respeito (cfr. o artigo 3.º, n.º 3, do Estatuto Disciplinar); b) O dever de isenção (cfr. o artigo 3.º, n.ºs 4, alínea a), e 5 do Estatuto Disciplinar); c) O dever de obediência (cfr. o artigo 3.º, n.ºs 4, alínea c), e 7 do Estatuto Disciplinar); e d) O dever de lealdade (cfr. o artigo 3.º, n.ºs 4, alínea d), e 8 do Estatuto Disciplinar).

XI. A pena de inatividade, prevista no artigo 25.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), atento o preceituado nos artigos 28.º, 29.º, alínea a), 31.º, n.º 1, alínea g), 12.º, n.º 5, e 25.º, alínea c), todos do Estatuto Disciplinar, é adequada à gravidade das infrações disciplinares cometidas, que atentaram gravemente contra a dignidade e o prestígio da função.

Termos em que, nos melhores de Direito e com o mui douto suprimento de Vossa Excelência, deverá ser julgado PROCEDENTE o presente Recurso e REVOGADO o Acórdão, de 27JAN14, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela.

*Em contra alegação a Recorrida concluiu: 1ª - À data dos factos, a Recda. encontrava-se ausente do serviço, em situação e baixa médica por doença; 2ª - Como resulta de 2), in fine, do probatório, não existe qualquer prova de que a Recda. tivesse retirado qualquer benefício pecuniário através da prática dos factos que lhe são imputados; 3ª - Os recursos de impugnação foram elaborados não a pedido dos infractores, mas de um terceiro; 4ª - Os recursos de impugnação em causa não visaram contrariar, ou pôr em causa a legalidade das respectivas decisões, mas tão-só a substituição das sanções acessórias de inibição de conduzir pela prestação de caução de boa conduta; 5ª - A mera apresentação de uma impugnação judicial não constitui, em si, qualquer ilícito, já que consubstancia o exercício de um direito constitucionalmente consagrado e legalmente regulado; 6ª – Os recursos em apreço visavam substituir um sacrifício imposto ao infractor (a inibição de conduzir) por um outro sacrifício (a prestação de uma caução e adopção de um comportamento inibitório por um determinado período de tempo); 7ª - Nada consta nos autos que em tais requerimentos tivesse sido usado algum argumento, ou invocado algum vício, que escapasse ao comum dos interessados, e que fosse do conhecimento da Recda por via do exercício das suas funções; 8ª - Os funcionários ou agentes não estão proibidos de impugnar judicialmente as decisões que emanam das entidades onde exercem as suas funções, e também não estão proibidos de ajudar terceiro a elaborar essas impugnações; 9ª - A Recda não actuou directamente a solicitação do infractor, mas antes a pedido de um terceiro, com quem se relacionava pessoalmente, logo, não é verdade que a Recda tenha ajudado o arguido, por motivo de amizade; 10ª - A Recda não recebeu, nem poderia ter recebido, qualquer ordem superior para elaborar impugnações judiciais em defesa de arguidos, e, por isso, não poderia contrariar tal ordem, simplesmente porque, à data dos factos, não se encontrava em efectividade de funções; 11ª - A impugnação dos actos do Recdo ou do serviço onde a Recda se integrava não pode ser vista como um obstáculo à sua acção, antes pelo contrário, deve ser vista como um reforço, ou a confirmação da lisura dos seus actos, por conformes à lei; 12ª – A impugnação judicial não pode, assim, ser vista nem como um acto contra o respectivo serviço, bem pelo contrário, já que a confirmação da legalidade do acto servirá para reforçar a legalidade dos procedimentos, e a declaração de ilegalidade dos mesmos actos servirá para corrigir procedimentos futuros; 13ª – Ao decidir como decidiu, o douto acórdão fez correcta interpretação e aplicação dos atinentes normativos legais, pelo que não merece qualquer censura.

*O Ministério Público, nos termos do artigo 146º do CPTA, emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

*FACTOS Consta no acórdão recorrido: II.1 – Factos Provados Com interesse para a decisão da causa consideram-se como provados os seguintes factos: 1) A autora é funcionária da Direção Geral de Viação, com a categoria de Assistente Administrativa Especialista, a desempenhar funções na Delegação de Viação de VR (fls. 347 do P.A.); 2) Por Ofício n.º 001008 de 06.02.2001, sob o assunto «Recursos de impugnação judicial dos autos de contra-ordenação n.

os 210839384 e 209184973», o Delegado de Viação de VR comunicou ao Diretor Regional de Viação do Norte, o seguinte (fls. 125 e 126 do P.A.): 1) O arguido no processo supra referenciado, não se conformando com a decisão administrativa, proferida pelo Governo Civil de VR, apresentou recurso de impugnação judicial, em 06/06/2000; 2) No recurso, o arguido, solicita a substituição da sanção acessória de inibição de conduzir, pela suspensão da sua execução mediante prestação de caução de boa conduta, nos termos do n.° 2, do...

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