Acórdão nº 02545/14.6BEBRG-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Abril de 2016
Magistrado Responsável | Rog |
Data da Resolução | 08 de Abril de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Centro de Estudos Judiciários veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 21.04.2015, pelo qual foi julgada procedente a providência cautelar intentada pela ora recorrida ICSGC e se determinou, em consequência, que a requerente fosse “provisoriamente admitida à frequência da formação teórico-prática do III Curso de formação de magistrados para os Tribunais Administrativos e Fiscais”.
Invocou para tanto, em síntese, que: a ausência de factos concretos bastantes susceptíveis de demonstrar, mesmo que perfunctoriamente, o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que a requerente, ora recorrida, pretende ver reconhecidos no processo principal, prejudica, necessariamente, a análise do balanceamento dos seus interesses e dos riscos incorridos pelo interesse público, devendo logo por aí ser indeferida a providência; ainda assim, e quanto à ponderação dos interesses em confronto, tendo sido efectuada uma análise dos interesses da requerente, ora recorrida, o mesmo não sucedeu quanto aos interesses do Centro de Estudos Judiciários, ora recorrente, que foram incorrectamente ponderados; o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, incorreu em erro de julgamento grosseiro, ao fazer tábua rasa do alegado pelo ora recorrente em sede de oposição.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. Os factos concretos alegados pela requerente, ora recorrida – sobre quem recai o ónus de alegação e prova (ainda que indiciária) –, não são susceptíveis de demonstrar o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação: não indica, concretiza ou quantifica quaisquer prejuízos; não se vislumbrando, assim, quaisquer razões para recear que a sentença a proferir no processo principal se torne inútil no caso de não ser concedida a providência, por se ter consumado, entretanto, situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos dificilmente reparáveis para quem dela deveria beneficiar.
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Perante a evidente insuficiência da matéria de facto trazida aos autos pela requerente, ora recorrida, para demonstrar a verificação do requisito do periculum in mora, o mesmo não pode deixar de sucumbir.
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Acresce que o objectivo da ora recorrida é frequentar o (um) curso de formação para magistrados dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o que poderá suceder em próximo curso, como aliás, numa situação similar, sucede nos casos de adiamento previstos no n.º 4 do artigo 28.º da Lei n.º 2/2008, de 14 de Janeiro.
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A realização de um próximo curso de formação é, de facto, um acontecimento futuro, mas, contrariamente à premissa da decisão recorrida, não é incerto, nem único e nem irrepetível.
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De facto, estamos longe de atingir uma situação de facto consumado, como erradamente se sustenta na decisão impugnada, por reporte aos sucessivos concursos de ingresso nos cursos de formação teórico-prática para magistrados (não só para os Tribunais Administrativos e Fiscais, mas, em geral, para os Tribunais Judiciais).
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Como é sobejamente conhecido, os concursos são periódicos, periodicidade que decorre da circunstância de uma Lei da Assembleia da República – Lei n.º 2/2014, de 14 de Janeiro – a prever e de existir uma entidade pública, o Centro de Estudos Judiciários, ora recorrente, que tem por missão institucional e permanente assegurar garantir a sua realização periódica.
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Se incertezas se podem suscitar a propósito do momento em que um próximo curso se irá realizar, em virtude dos, sobejamente conhecidos, constrangimentos financeiros, nenhuma incerteza se coloca quanto à sua realização, ou seja, quanto à sua permanência e repetição no tempo.
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Enfermando a sentença recorrida em erro sobres os pressupostos de facto, não assiste razão à Juiz a quo quando refere: “E não se diga que a Requerente pode sempre ingressar no próximo curso de formação, já que esse acontecimento não só é futuro, mas também é verdadeiramente incerto, tanto mais que, até à presente data, não foi aberto novo curso. Por isso, temos como notório que a não frequência e respectiva avaliação da Requerente no Curso que está actualmente a ser ministrado põe em risco a efectividade da sentença a proferir no processo principal.
” (cfr. a fls. 28 da sentença recorrida).
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Acresce que a frequência do ou de um próximo curso não acarretaria para a requerente, ora recorrida, quaisquer danos, tendo em conta que é trabalhadora em funções públicas pertencente ao mapa de pessoal da Inspecção-geral da Defesa Nacional, a exercer funções, por último e em comissão de serviço, na Câmara Municipal de Viana do Castelo; ou seja, não se vislumbra uma situação de ausência e ou perda de emprego e ou remuneração.
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Já para o ora recorrente decorrem danos da admissão provisória à frequência do III Curso de Formação de Magistrados para os Tribunais Administrativos e Fiscais, porquanto foram autorizadas e orçamentadas 40 vagas, pelo que a admissão de uma candidata nestas condições acarreta constrangimentos financeiros difíceis de ultrapassar face à natureza jurídica do Centro de Estudos Judiciários que, para o que ora nos interessa, se consubstancia na falta de autonomia financeira (cfr. artigo 90.º da Lei n.º 2/2008, de 14 de Janeiro). E sem que este dispêndio financeiro a cargo do Centro de Estudos Judiciários/Ministério da Justiça/Estado Português possa corresponder a um efectivo incremento da resposta judicial, pois, tendo em conta a tutela cautelar concedida, a formação será interrompida no momento imediatamente anterior ao do início do estágio.
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Pelo que enferma de erro o vertido na sentença recorrida a propósito do requisito de decretamento das providências cautelares periculum in mora, circunstância que sai reforçada atendendo ao vertido na própria decisão (cfr. a fls. 32): “Diferentemente, não se afigura indispensável acautelar a realização do estágio na magistratura. Primus: a nomeação como juiz em regime de estágio pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais pode ser efectuada a qualquer momento; secundus: há formas de acautelar todas as consequências negativas que derivem de uma nomeação tardia do auditor como juiz em regime de estágio; tertius: o regime de estágio – que precede a nomeação em regime de efectividade – visa detectar casos em que se verifica falta de adequação para o exercício da função, pelo que esse juízo deverá ser realizado tanto mais próximo quanto possível do exercício efectivo de funções; quartus: no regime de estágio, os magistrados exercem – com a assistência de formadores, mas sob responsabilidade própria – as funções inerentes à respectiva magistratura, com os respectivos direitos, deveres e incompatibilidades. É certo que [a] lei prevê – ainda hoje – a figura dos substitutos dos magistrados, mas também é certo que “administrar a justiça em nome do povo” não se afigura compatível com o exercício de funções a título provisório.
” 12. Ora, como decorre da própria sentença a formação de magistrados constitui-se como uma unidade incindível, com um encadeamento lógico – sendo que a formação teórico-prática prepara os auditores de justiça para a fase de estágio –, que visa (no seu todo) formar/preparar para a prática de actos de soberania, que importa acontecer “tanto mais próximo quanto possível do exercício efectivo de funções” e sem carácter de provisoriedade, seja em que momento for e, muito menos, a todo o custo. Efectivamente, para que importa obter a formação teórico-prática se, entretanto, não prossegue com o estágio? Que efeito útil então se retira da frequência desta formação específica para o exercício de funções de magistrado? Será de admitir a realização de um estágio no tribunal, por exemplo, cinco ou dez anos após a conclusão da fase teórico-prática? 13. Tudo por uma “(…) interessada [posicionada] no 88.º lugar da via profissional.” (cfr. a fls. 26 da sentença recorrida), muito além das 40 vagas postas a concurso e sem que a sentença recorrida discorra uma única palavra, a propósito da probabilidade da procedência da acção principal, sobre tal matéria.
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De facto, a decisão recorrida, não obstante o alegado no requerimento inicial sobre a classificação atribuída a outro candidato, nada reflecte do pensamento do julgador – rectius, aliás, se algum pensamento verdadeiramente lógico se pode descortinar na decisão recorrida, é o que aponta, inequivocamente, no sentido de que nenhum efeito invalidante do ato impugnado se alcança na comparação com a classificação atribuída a outro candidato –, caindo no erro de decidir no sentido da concessão da providência sem atentar no posicionamento da requerente, ora recorrida.
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O ora recorrente não se conforma com o entendimento seguido pela Juiz a quo (designadamente quando a fls. 29 da sentença recorrida: “Ponto é que, de uma apreciação perfunctória, verificamos que há uma aparência do bom direito quando a Requerente sustenta a ilegalidade do acto de homologação na inexistência – agora, entendido, como desconhecimento da Candidata, ora Requerente, da existência – de factores que integraram a avaliação curricular.
”), o qual soçobra porquanto não encontra sustentação na factualidade apurada (elencada nas págs. 3 a 24 da sentença recorrida), na documentação inserta nos autos, no processo administrativo e nos conceitos a atender, lavrando, assim, em erros essenciais.
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Efectivamente, dificilmente se poderá aceitar que a aparência do bom direito (sustentada na ilegalidade do ato homologatório) resulte de uma...
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