Acórdão nº 00426/10.1BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução18 de Novembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO MCPF vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, datada de 29 de Março de 2016, e que julgou improcedente a presente acção administrativa comum intentada contra as Estradas de Portugal SA, actualmente Infraestruturas de Portugal SA e onde era solicitado que devia : “Ser a Ré condenada a pagar à A. a quantia de € 5.857,66 a título de indemnização, acrescida de juros moratórios legais, contados a partir da citação até ao efectivo e integral pagamento da quantia peticionada, e ainda, nas custas do processo”.

Em alegações a recorrente concluiu assim: 1ª – Devia ter sido dado como provado que, Pouco antes do acidente, encontravam-se na referida via trabalhadores, a mando da Recorrida, a efetuarem obras de conservação na mesma; 2ª - Tal conclusão deriva do depoimento do Testemunha MS que o Tribunal “a quo” reputou como credível 3ª - No mesmo sentido depôs a testemunha SAAF que, não obstante ser pai da Recorrente, o Tribunal reputou tal depoimento como credível 4ª - Tais depoimentos (e apenas estes, uma vez que, foram as únicas testemunhas que presenciaram o acidente), demonstram que no local do acidente, a Recorrida, diretamente, ou por subcontratação, tinha no local uma equipa de limpeza, na zona onde sucedeu o acidente.

  1. - Estando tal equipa a efetuar limpeza, seria crível que, se a mesma a visse faixa de rodagem, a tivesse retirado do local, o que não sucedeu; 6ª - Pelo que houve uma conduta que se revelou de alguma incúria, pois não seria expectável que a mesma surgisse pouco tempo depois da referida equipa ter saído do local.

  2. - Tal facto ter-se-á de dar como provado, e por conseguinte, ser aditado à matéria de facto provada, sendo que, não obstante não ter sido alegado pelas partes em qualquer um dos seus articulados, ao abrigo dos Princípios do Inquisitório, contido na alínea b) e c) do n.º 2 do artigo 5.º do NCPC, bem como da aquisição, processual, contido no artigo 413.º do mesmo diploma, os mesmo deveriam constar da matéria de facto assente, na medida em que influem na boa decisão da causa.

  3. –No que tange à inexistência do pressuposto da ilicitude pela Recorrida, que o Tribunal recorrido desconsiderou, a Recorrida entende ter opinião contrária.

  4. –Com efeito, se quanto às condições do piso de estrada, não existem duvidas sobre o bom estado da mesma, já quanto à iluminação publica da mesma, tal não carece de outra alegação da recorrente, pois para alem de se ter dado como provado que a mesma, no local do acidente, não estava iluminada, não obstante possuir um poste de iluminação, tal obrigação de iluminação decorre da lei, designadamente da Base 35 n.º 3 do Decreto-Lei n.º 110/1009, de 18 de Maio, que rege o contrato de concessão entre o Estado e a Recorrida; 10ª Assim, duvidas não restam que tal falta de iluminação constituiu, por si só uma violação objetiva do contrato de concessão celebrado entre o Estado e a Ré, pelo que, a alegação da Recorrente, de que a mesma não estava iluminada, deu-se como provada, tratando-se por isso de uma omissão ilícita por parte da Recorrida, pelo que ter-se-ia de dar como provada ilicitude da Recorrida, por violação de um dever objetivo de cuidado, por omissão.

  5. – Por outro lado, dando-se como provado que que a Recorrida, na altura dos factos, tinha uma equipa a efetuar manutenção e limpeza da referida via, competia à mesma através da equipa que se encontrava no local, em zelar pelas boas condições da mesma, devendo ter o cuidado necessário de verificar se a faixa de rodagem se encontrava desimpedida; 12ª - Assim, entende a Recorrente que, existe, também nesta parte, ilicitude da Recorrida, por omissão de conduta.

  6. - Provando-se os demais pressupostos da responsabilidade civil (a culpa, por negligencia da Recorrida, o dano – os estragos causados no veículo e o dano de imobilização, bem como o nexo de causalidade- a conduta omissiva da Ré o dando provocado no veículo), dúvidas não restam que a sentença recorrida terá de ser necessariamente alterada, 14ª – A Sentença recorrida violou ou fez errada interpretação do artigo 483.º do Código Civil, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 347/2007, de 07 de Novembro, e das Bases 2, Base 28 e Base 35.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 110/1009, de 18 de Maio.

A recorrida, notificada para o efeito, contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões: I. Após devida análise de todo o conteúdo do recurso, é nosso entendimento que a matéria de facto alegada no recurso não deverá proceder, por não ser aquela que se extrai dos autos, na medida em que o seu sentido e alcance são diversos.

  1. A douta sentença enquadra devidamente os factos, tidos como relevantes, após toda a prova produzida, conjugada com toda a documentação disponível, não merecendo qualquer reparo e que se reafirma na presente resposta.

III.

O recorrente alega que a sentença deveria ter dado como provado que se encontravam na referida via trabalhadores, a mando da Recorrida, a efetuarem obras de conservação na mesma.

IV.

O recorrente funda-se em declarações de 2 testemunhas: MS e SAAF (pai da Autora).

V.

Só que, desses depoimentos, não se pode retirar tal conclusão, como se segue VI.

Das declarações destas testemunhas fica-se com a ideia de que, a existirem esses trabalhadores, estariam fora do local da pedra, algo distante (lá para baixo) e não são identificados, isto é, ao serviço de quem estavam a trabalhar; VII.

Mas, sem conceder, mesmo que, eventualmente, fossem trabalhadores da Ré, estariam a fazer trabalhos de conservação e manutenção das devidas condições da via. Estariam a limpar valetas. Não estariam a pôr pedras na estrada… VIII.

A reforçar a improcedência da matéria de facto alegada pela Recorrente, verifica-se que a eventual existência de pedra seria fortuita, não tendo qualquer relação com pertences da a estrada ou relacionada com ela. Temos as declarações do próprio condutor, SAAF, que disse que, ao passar para baixo, por volta das 16 horas, não viu qualquer pedra.

Portanto, a menos de 2 horas do acidente (que terá sido pelas 18 horas), não havia qualquer pedra na estrada, o que mostra que, pelo menos até aí, a estrada estava minimamente cuidada.

IX.

Certo é tratar-se duma simples EN206. Não é uma autoestrada ou via rápida com 2 faixas de rodagem com separador.

Atentas as rotinas de passagens das UMIA,S (Unidades Móveis de Apoio e Inspeção), com uma frequência regular, tida como adequada e referida nos autos, para manter as boas condições de circulação e segurança da via, não seria expectável que lá passassem a todas as horas ou com uma frequência de hora em hora, frequência que não acontece nem nas autoestradas.

X.

Refere-se ainda que o local do acidente integra uma zona da estrada plana e com pavimento regular, com ligeira pendente e, em perfil transversal misto, tendo talude de aterro de um lado e talude de escavação do outro lado.

Ora, o talude de escavação era, essencialmente, em terra e revestido com vegetação, não contendo pedras e/ou tendente a desmoronar-se.

XI.

E o mesmo condutor, SAAF, dizia ainda que a pedra não era da estrada. E, claro, não era do talude. É que chegaria à faixa de rodagem se, eventualmente, a pedra fosse ou caísse do talude. É o que se retira do seu depoimento (passagem da gravação do minuto 52:57 a 54:00).

XII.

Isto é, seria um elemento isolado que poderia ter caído de algum transporte que, naquela altura, teria passado por ali, constituindo um caso fortuito, fora do alcance e previsão dos agentes da Fiscalização da estrada e das Brigadas de Intervenção, a cargo do IP, aqui Ré, que estão sempre operacionais.

XIII.

Certo é que a IP não recebeu qualquer aviso ou chamada da GNR, Proteção Civil ou Bombeiros.

XIV.

Com efeito, apesar de tudo, fica-se sem saber afinal como era a pedra (grande, pequena, alta, baixa, muito menos a sua forma e a origem).

Um condutor passa primeiro por cima da pedra e ou não bate ou quase raspa na pedra. O outro condutor, imediatamente a seguir, com carro ligeiro (mais baixo de carroceria), consegue passar por cima da pedra, quando o mais provável seria bater na pedra, à frente, e ficar logo ali.

XV.

Para passar por cima da pedra, ela não podia ter 15cm de altura, como foi dito na audiência. Ou, então, o condutor viria a velocidade excessiva, a pedra seria arrastada e seriam produzidos outros efeitos que não os alegados.

XVI.

Não é o que consta dos autos. Isto é, nem a propria dinâmica do acidente foi explicada, com o devido nexo de causalidade e apuramento de eventual ilicitude.

XVII.

De facto, a Ré não podia ter evitado que a alegada pedra ali estivesse, não lhe podendo ser imputada qualquer culpa por ação ou omissão, tendo observado todos os deveres de cuidado possíveis ao seu alcance para a referida estrada. Na ausência de culpa os danos sempre se produziriam.

XVIII.

Por conseguinte, não se prova, pois, o facto indicado acima que o Autor pretendia, sendo certo que mesmo que fosse provado, era irrelevante.

Não tem razão de ser, ainda, a exigência de iluminação no local, pois trata-se duma estrada nacional e não duma estrada municipal...

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