Acórdão nº 00105/13.8BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução22 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório CAA, MMA, LMC e MEJS, devidamente identificados nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada contra a Águas do Norte SA e Agência Portuguesa do Ambiente IP, na qual peticionaram, em síntese e designadamente, a atribuição de indemnizações “pelos prejuízos sofridos” resultantes da construção “da ETAR de Torre de Moncorvo” que terá transbordado “para os prédios rústicos dos requerentes”, inconformados com a Sentença proferida em 6 de maio de 2015, no TAF de Mirandela, na qual a ação foi julgada “improcedente”, vieram interpor recurso jurisdicional da mesma, em 12 de Junho de 2015 (Cfr. fls. 514 a 540 Procº físico).

Formulam os aqui Recorrentes nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões (Cfr. fls. 533 a 540 Procº físico): “I- O VÍCIO DO ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE FACTO QUANTO AOS FUNDAMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL IMPUTADA PELOS AUTORES AO RÉU INSTITUTO PÚBLICO AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE I. P.

  1. - Ao contrário do sustentado no último parágrafo da pág. 14 e na 1ª linha da pág. 16 da sentença recorrida de 6.05.2015, a responsabilidade civil imputada pelos autores ao Instituto Público Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. não assenta no facto de aquele Instituto ter licenciado a ETAR, tendo por fundamento os factos e razões indicados no art. 5º da presente alegação que se dão por reproduzidos.

  2. - Em parte alguma da petição inicial ou de qualquer outro ato processual os autores puseram em causa o licenciamento da ETAR de Torre de Moncorvo por parte do Instituto Público Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. ou imputaram responsabilidade àquele Instituto Público por tal facto.

  3. - Enferma pois a sentença recorrida do vício do erro sobre os pressupostos de facto, o que deve conduzir à respetiva anulação, por ter partido do pressuposto errado de que a responsabilidade civil imputada pelos autores ao Instituto Público Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. assenta no facto de aquele Instituto ter licenciado a ETAR, o que levou a concluir que «não se estabelecendo que o funcionamento da ETAR é causa do encharcamento dos terrenos dos Autores e, consequentemente, dos danos, ao Réu APA nada haverá a apontar» (pág. 16 da sentença recorrida).

  4. - No art. 16º da sua contestação de 2.05.2013 o Instituto Público Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. reconhece que «na qualidade de Autoridade Nacional da Água» exerce «funções de fiscalização… das utilizações dos recursos hídricos», reconhecendo nos artigos 40º e 41º da mesma contestação que lhe compete fiscalizar se a linha de água tem ou não «vazão para o efluente produzido pela referida ETAR».

  5. - Ora, comprovando as fotografias nr.s 7, 10 e 23, juntas aos autos pelo Inst. Público APA com a sua contestação, que a linha de água não tem vazão para o efluente nela descarregado pela ETAR, (ao contrário do sustentado no art. 24º da contestação da ré ATMAD SA), podendo ver-se em qualquer daquelas 3 fotografias que a água que circula no referido canal o enche por completo, estando na eminência de transbordar, ter-se-á de concluir que o réu Instituto Público APA não exerceu as suas supra referidas funções, sendo solidariamente responsável pelos prejuízos sofridos pelos autores e invocados na petição inicial.

    II- O VÍCIO DO ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE FACTO QUANTO AOS FUNDAMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL IMPUTADA PELOS AUTORES À RÉ, ÁGUAS DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO, SA.

  6. - Também a responsabilidade da ré ATMAD – Águas de Trás-os-Montes e Alto Douro, SA, não radica, face «à configuração que os Autores dão à causa», apenas «na circunstância de ter aumentado o caudal da linha de água de forma que ultrapassa os limites desta» (como se afirma no último parágrafo da pág. 14 da sentença recorrida), mas também nos factos e razões invocados nas alíneas a) a e) do art. 9º da presente alegação, que se dão por reproduzidos.

  7. Donde se terá de concluir que a sentença recorrida enferma do vício do erro sobre os pressupostos de facto também quanto aos fundamentos da responsabilidade civil imputada pelos autores à ré ATMAD SA., o que implica a anulação da sentença recorrida.

  8. - Por força do contrato de concessão que celebrou com o Estado em 26.11.2001, a que se alude no ponto 7 da fundamentação de facto, compete à ré ATMAD SA, enquanto concessionária da ETAR de Torre de Moncorvo, «o controle… dos efluentes tratados e dos meios recetores em que os mesmos sejam descarregados … incluindo a sua própria «conceção e construção», pelo que lhe competia e compete manter em bom estado de conservação o canal onde lança os efluentes, cuidando da sua impermeabilização, por forma a que tais efluentes tivessem ficado e fiquem confinados e não tivessem inundado ou continuem a inundar os terrenos agrícolas dos autores.

    III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO .

  9. - O ponto 11 da fundamentação de facto está em manifesta contradição com o ponto 15 da mesma fundamentação, na medida em que se a linha de água «confina com os prédios dos Autores» é porque não passa nesses terrenos.

    Confinar não só não é sinónimo, como é bem diferente de passar em ou passar por, pelo que das duas uma: ou a linha de água confina com os prédios dos autores ou atravessa tais prédios. No 1º caso os autores não são proprietários da linha de água, no 2º caso já o são na parte em que ela corre nos seus terrenos.

  10. - Mas mesmo que se tivesse concluído inequivocamente (que, como vimos, não foi o caso) que a linha de água passa pelos prédios dos autores, ainda assim caberia e cabe à ré ATMAD, SA «o controle… dos efluentes tratados e dos meios recetores em que os mesmos sejam descarregados … incluindo a sua própria «conceção e construção», por força do disposto no ponto 2 da cláusula 2ª do contrato de concessão de exploração que celebrou com o Estado Português em 26.11.2011, a que se alude no ponto 7 da fundamentação de facto da sentença recorrida de 6.05.2015, pelo que, no entender dos recorrentes, não carece de ser sanada a supra referida manifesta contradição, uma vez que a responsabilidade pela boa conservação da linha de água em questão cabe aos réus ATMAD, SA e Instituto Público AOA, I.P..

  11. - O que provoca «cheiros fortes» não é a «normal exploração da ETAR», nem «os efluentes rejeitados para a linha de água», mas sim a estagnação desses efluentes nos terrenos agrícolas dos autores, como é aliás confirmado, em certa medida, pelo ponto 19 da fundamentação de facto. Se os efluentes descarregados corressem regularmente na linha de água não causariam qualquer cheiro incómodo para os autores ou para quem passa na zona, mas a partir do momento em que saem do canal e ficam estagnados nos terrenos agrícolas dos autores, os cheiros surgem naturalmente como é aliás do conhecimento geral.

  12. - Desconhece-se quem procedeu ao desvio da linha de água a que se alude no ponto 17 da fundamentação de facto, tendo o próprio mandatário do réu APA afirmado nas alegações que «não se sabe se foi D. Diniz, se quem foi» (ponto 03.27.31 do CD respeitante à audiência de julgamento de 11.03.2015).

  13. - Dá-se acertadamente como provado no ponto 23 da fundamentação de facto, que o encharcamento dos terrenos dos autores se deve à «infiltração de águas nos muros da linha de água» concluindo-se porém erradamente no penúltimo parágrafo da pág. 15 da sentença recorrida que a origem desse encharcamento «não se pode ligar ao funcionamento da ETAR», sendo este, pelas razões supra invocadas, designadamente no art. 39º da presente alegação, o principal erro de julgamento cometido no caso sub judice.

    IV- DA «FACTUALIDADE NÃO PROVADA» .

  14. - Todos os factos descritos no capítulo relativo à «factualidade não provada», incluindo os danos invocados pelos autores e descritos nos doc.s 16 e 17 juntos com a petição inicial, deveriam ter sido dados (e deverão ser dados) como provados pelas razões apontadas no Capítulo IV da presente alegação de recurso, que se dão por reproduzidas, tendo também em consideração os extratos dos depoimentos nele indicados.

  15. - O ter-se considerado não provados os factos a que se alude no ponto 1 da «factualidade não provada», está em contradição com o que se dá por provado nos pontos 23 e 24 da fundamentação de facto. Só assim não seria se tivesse resultado provado e não resultou que teriam sido outras «águas» com exclusão das residuais que teriam provocado o encharcamento em parte dos terrenos dos autores por se terem infiltrado através dos «muros da linha de água» (ponto 23 da fundamentação de facto), cabendo às rés o ónus da prova de tal (pseudo) facto, o que não se verificou .

  16. - Acresce que a decisão de considerar não provados os factos a que se alude nos pontos 5 e 9 da «factualidade não provada» está em contradição com a decisão de considerar provado os factos a que se alude no ponto 9. da fundamentação de facto, pelo menos quanto ao facto de os autores trabalharem de sol a sol na vizinhança da ETAR, o que aliás terá de ser considerado provado tendo em consideração os extratos dos depoimentos supra indicados que incidem sobre esta matéria de facto .

  17. - Sintomático é o facto, sobejamente confirmado por múltiplas testemunhas, como se comprova pelos supra indicados extratos dos respetivos depoimentos, de que o encharcamento dos prédios dos autores se verifica todo o ano, quer chova, quer faça sol, o que deveria ter necessariamente conduzido a que fosse dado como provado que esse encharcamento se deve às águas residuais descarregadas pela ETAR, uma vez que nenhum outro fator o pode explicar nos períodos em que não chove, sendo esse o maior erro de julgamento cometido pelo tribunal a quo.

    V- DA VALORAÇÃO DA PROVA TESTEMUNHAL .

  18. - É absolutamente incompreensível que a sentença recorrida tenha valorado pouco o depoimento prestado pelos Engenheiros AMB e AgB por terem defendido o seu trabalho (último parágrafo da pág. 11), quando lógico seria a atitude oposta, ou seja, de forte valoração de tais...

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