Acórdão nº 02322/14.4BEPRT-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | Esperan |
Data da Resolução | 22 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte 1.
G... – COMPANHIA GERAL DE RESTAURANTES E ALIMENTAÇÃO, SA, interpõe recurso jurisdicional do despacho saneador do TAF do Porto, proferido no processo de contencioso pré-contratual intentado pela Recorrente contra o MUNICÍPIO DE GONDOMAR e, como contrainteressadas, E..., LDA, U..., SA, K..., SA, e I…, SA, na parte em que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação quanto à apreciação da legalidade da cláusula 4ª do Caderno de Encargos.
A Recorrente apresentou alegações, onde conclui nos seguintes termos, que delimitam o objeto do recurso: I.O douto despacho saneador julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação contra a cláusula 4ª do caderno de encargos, absolvendo, dessa parte, o Réu da instância nos termos do artigo 89º, n.º 1, alínea h) do CPTA.
II.
Entende o douto despacho saneador que, como a Autora não impugnou as peças concursais no prazo de um mês contado do respetivo conhecimento, está precludido o direito de, nestes autos, vir invocar a ilegalidade da cláusula 4ª do Caderno de Encargos.
III.
Para assim o entender, estriba-se o douto despacho saneador no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27-01-2011, proferido no processo n.º 0850/10.
IV.
Porém, o Supremo Tribunal Administrativo há muito que reviu a sua posição em acórdãos posteriores, nomeadamente, nos seus Acórdãos de 20/12/2011, proc.º 0800/11, de 20/11/2012, proc.º 0750/12, de 05/02/2013, processo 0925/12 e de 23/05/2013, proc.º 0301/13 (www.dgsi.pt); V.
Entendendo agora, e de forma uniforme, que a falta de impugnação de normas do concurso não preclude a faculdade dos interessados impugnarem o ato final de adjudicação, ou qualquer ato posterior, com fundamento na ilegalidade dessas normas (cf. acórdãos de 20/12/2011, proc.º 0800/11, de 20/11/2012, proc.º 0750/12, de 05/02/2013, processo 0925/12 e de 23/05/2013, proc.º 0301/13, www.dgsi.pt).
VI.
Também Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, entendem que “Pela nossa parte, não temos dúvidas de que a possibilidade da impugnação direta dos documentos conformadores do procedimento representa um acréscimo de tutela, introduzido por imposição das diretivas comunitárias, que constitui uma faculdade, e não um ónus de impugnação. Significa isto que, v.g., na ausência da impugnação tempestiva de uma disposição contida no programa do concurso, o interessado não perde a possibilidade de proceder à impugnação do ato administrativo que, durante o concurso, venha dar aplicação concreta a essa disposição”(“Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 3ª edição revista, 2010, pág. 682).
VII.
No mesmo sentido, o Tribunal Central Administrativo Norte entende que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo firmada no acórdão de 17-01-2011 (Proc. n.º 0850/10) – acórdão no qual se estriba o douto despacho saneador – não constitui “a leitura e interpretação mais acertadas do quadro normativo em referência, aderindo-se aquilo que foi o entendimento do STA no seu acórdão de 04.11.2010 (Proc. n.º 0795/10) e que veio a ser reiterado, nomeadamente, nos acórdãos de 20.12.2011 (Proc. n.º 0800/11) e de 20.11.2012 (Proc. n.º 0750/12)” (cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 30-11-2012, processo 00028/12.8BEMDL, www.dgsi.pt) VIII. O entendimento de que a falta de impugnação de normas do concurso não preclude a faculdade dos interessados impugnarem o acto final de adjudicação, ou qualquer acto posterior, com fundamento na ilegalidade dessas normas, é a que melhor se coaduna com o quadro normativo aplicável e a que assegura os objectivos estabelecidos na Directiva Comunitária Recursos; IX.
Entendimento que é, de longe, o mais acolhido pelo Supremo Tribunal Administrativo.
X.
Ao decidir em sentido contrário, violou o despacho saneador as disposições dos Art.
os 7º, 51º n.º 3, 100º n.
os 1 e 2 e 101º do CPTA.
*A Recorrida E... contra-alegou, concluindo o seguinte: A. O presente recurso está absolutamente condenado ao fracasso, já que o que está em causa no caso dos autos é a ilegalidade, tout court, da cláusula 4.ª do Caderno de Encargos, o que levou a que a Autora pedisse a anulação do procedimento no seu todo e não o ato de adjudicação que a aplica; B. Assim, tendo a Recorrente intentado a competente ação de contencioso pré-contratual mais de um mês após o conhecimento das peças concursais, caducou o seu direito de ação nos termos e para os efeitos do disposto nos art.ºs 51.º, n.º 3 e 101.º do CPTA; C. Este entendimento é absolutamente consentâneo com a jurisprudência do Acórdão do STA proferido em 23.05.201 no âmbito do proc. n.º 0301/13 (citado pela Autora), nos termos do qual citando o Acórdão de 20.12.2011, proferido no proc. 0800/11, em que se conclui pela necessidade de impugnação do ato de adjudicação ou qualquer outro com fundamento nas ilegalidades procedimentais; D. No caso dos autos, a Recorrente não reputa qualquer ato ilegal com esse fundamento, antes pede a anulação de todos os atos do procedimento, o que revela que impugna as peças concursais por si, em vez de invocar a respectiva ilegalidade para fundamentar a ilegalidade do ato que as aplique; E. Razão por que está totalmente condenado ao fracasso o recurso interposto, como é da mais elementar justiça!*O Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, por considerar que a melhor interpretação dos artigos 101.º/1 e 51.º/3 do CPTA/2004, e a mais consentânea com o princípio pro actione, é a adotada, nomeadamente, no Acórdão do STA, de 20.12.2011, P. 0800/11, no qual, além do mais, se conclui que “a falta da sua impugnação [das normas do concurso] nesse prazo [de 1 mês] não preclude o direito dos interessados de impugnarem o ato final de adjudicação com fundamento na ilegalidade dessas normas, desde que nele se repercutam”.
***2.
O despacho recorrido tem o seguinte teor na parte relevante: “Da alegada caducidade do direito de ação contra uma peça do procedimento.
O n.º 2, do artigo 100.º do CPTA, permite a impugnação direta do programa do procedimento, do caderno de encargos ou de qualquer outro documento procedimental, embora, quanto a nós, a respetiva ação de...
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