Acórdão nº 00081/11.1BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Fevereiro de 2016

Data19 Fevereiro 2016
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Ministério Público, devidamente identificados nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, inconformados com a Sentença proferida em 20 de Fevereiro de 2015, no TAF de Coimbra (Cfr. fls. 206 a 213 Procº físico), que julgou a ação improcedente, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 26 de Março de 2015 (Cfr. fls. 217 a 225 Procº físico), no qual, a final, formulou as seguintes conclusões: “I - O Ministério Público veio pedir na ação em causa a declaração de nulidade do Contrato de "Concessão da Exploração do Sistema de Captação, Tratamento e Distribuição de Água e do Sistema de Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes do Concelho da Figueira da Foz", celebrado em 29 de Março de 1999, com as alterações de 4 de Dezembro de 2001 e de 7 de Dezembro de 2004 (Docs. n° 1 -76 fls., n° 2 -9 fls. e n°3 -48 fls.), demandando para o efeito o Município da Figueira da Foz e as “AF, S.A.”.

II – Para tanto alegou a violação do art.6º do DL nº 147/95, de 21.06 por ter havido antecipação das receitas municipais nos primeiros nove anos da concessão, ou seja, de 1999 a 2008, tendo ficado provado que o Réu Município da Figueira da Foz recebeu nesse período de tempo a título de rendas, o montante de €10.298.577, o que representa mais de metade do valor da retribuição fixada para a concessão, no valor global de €18.020.406,31.

III – Assim não houve um escalonamento equitativo ao longo dos 30 anos de vigência do contrato que vigora até ao ano de 2029.

IV – O que contraria a parte final do art. 6º do DL nº147/95, de 21.06 que diz que: “A retribuição na expansão e renovação dos sistemas, a cargo do município concedente, é prestada sob a forma de anuidades, que não poderão ser pagas antecipadamente.” V – Dito de outra forma, não foi respeitada a norma legal em referência que prescrevia, sem margens para dúvidas, que a retribuição a pagar pela concessionária (…) é prestada sob a forma de anuidades, que não poderão ser pagas antecipadamente.

VI – Por anuidade, o legislador quis dizer, como o termo indica, que a retribuição deveria ser paga anualmente de forma equilibrada, sendo revertida obrigatoriamente para um plano de investimentos na expansão e renovação dos sistemas a cargo do município concedente.

VII – Em momento algum o legislador mencionou que a antecipação de rendas a que a norma se refere apenas diria respeito a adiantamentos por conta do contrato, e que vão além do inicialmente acordado, conforme se considerou na sentença, agora em crise, para depois se decidir pela não violação da norma, entendimento com o qual não concordamos, nem resulta da lei, seja na letra ou no seu espírito.

VIII – Se assim fosse, tal levaria a que fosse possível, como aconteceu no caso, contornar a lei, de proibir o pagamento antecipado das devidas anuidades ao longo de todo o período de vigência do contrato, bastando para tal que houvesse um acordo contratual nesse sentido.

IX - Diga-se, ainda, que na linha do nosso entendimento veio mais tarde a ser elaborado o DL nº194/2009, que entrou em vigor, em 01.01.2010, que no seu art. 42º, nº4, veio concretizar a letra e o espirito do art. 6º acima referido do DL nº147/95, ditando, inclusive, percentagem nos respetivos pagamentos anuais, já que dispõe, claramente que: “Os pagamentos relativos à retribuição devem ser feitos sob a forma de anuidades ao longo de toda a concessão, não antecipáveis, e cujo valor previsto para os primeiros cinco anos de contrato de concessão não pode exceder 40 por cento do valor atualizado à taxa de juro sem risco da totalidade dos pagamentos previstos no contrato de concessão.” X – Tal deveu-se ao facto de se tentar ser mais preciso de forma a que fosse mais difícil ou impossível contornar o legalmente estabelecido anteriormente, e verificar-se o que o legislador não queria, ou queria prevenir: o pagamento antecipado das retribuições que deveriam ser prestadas sob a forma de anuidades, e desde a entrada em vigor deste diploma legal em obediência à percentagem dos 40 por cento.

XI – No aditamento ao contrato, de 2004.12.07, foi também violado o princípio da equidade estipulado pelo art. 10°, n° 1, da Lei n° 91/2001, de 20 de Agosto, com o aditamento introduzido pela Lei n° 48/2004, de 24 de Agosto (Lei do Enquadramento Orçamental).

XII - Esta norma estabelece que: "O Orçamento do Estado subordina-se ao princípio da equidade na distribuição de benefícios e custos entre gerações".

Salvo o devido respeito, não acolhemos o entendimento exarado na sentença recorrida quando quer fazer crer que tais normas não incidem sobre contratação pública, mas apenas se destinam aos orçamentos do Estado e das Autarquia, embora se aceite que as contrapartidas recebidas pelo Município não deixarão de ser orçamentadas, mas apenas são uma de múltiplas parcelas do seu orçamento e este é que terá que obedecer ao aludido princípio.

XIII - Todavia, conforme frisámos na petição inicial, não podemos partilhar deste entendimento redutor mas sim ter em atenção que este princípio da equidade intergeracional veio, aliás, a ser consagrado, mais tarde, na atual Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei n° 2/2007, de 15 de Janeiro, no seu art. 40 n.ºs 1 e 3, alínea f), sobre princípios e regras orçamentais, ao estipular o seguinte: "O princípio da equidade intergeracional, relativo à distribuição de benefícios e custos entre gerações, implica a apreciação nesse plano da incidência orçamental: (...) Dos encargos explícitos e implícitos em parcerias público-privadas, concessões e demais compromissos financeiros de carácter plurianual".

XIV - No caso, em referência, o adicional penaliza as gerações atuais e beneficia as gerações futuras, sendo certo que o aludido contrato de concessão vigora até 2029, vinculando os autarcas que o executam permanentemente.

XV - Assim, contrariamente ao decidido, consideramos que há violação do princípio da equidade, tendo em consideração a distribuição de benefícios e custos para os consumidores.

XVI – Entendemos, sim, que a antecipação de receitas deste contrato representa, do ponto de vista substantivo, pela sua natureza, um verdadeiro empréstimo da empresa concessionário ao concedente, embora de forma camuflada.

Conclusão que não é aceite pelo Mmº Juiz “a quo” já que não é viável deduzir que pela via contratual se pretendeu transferir fundos para o Município e que este, por alguma forma, haveria de retribuir financeiramente à concessionária tais pagamentos.

A tal diremos que se “empréstimo” não houve, houve decerto um benefício na antecipação das anuidades devidas.

XVI - Com efeito, a antecipação de receitas poderá potenciar, no curto prazo, por um lado, a realização de despesas, e, por outro, a desorçamentação de exercícios futuros, em violação do mencionado princípio da equidade orçamental.

XVII - Como se disse, o "Contrato de Concessão da Exploração do Sistema de Captação, Tratamento e Distribuição de Água e do Sistema de Recolha, Tratamento e Rejeição de Fluentes", outorgado em 29 de Março de 1999, com as posteriores alterações outorgadas em 4 de Dezembro de 2001 e 7 de Dezembro de 2004, entre o Município da Figueira da Foz e a sociedade "AF, SA", viola o art. 6°, do Decreto-Lei n° 147/95, de 21/06, vigente à data, razão pela qual, por força do art. 280°, n° 1, do Código Civil, tal contrato é nulo, por ser contrário à lei.

"A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer...

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