Acórdão nº 00022/03-Coimbra de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução29 de Setembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: O…, Lda.

melhor identificada nos autos, impugnou as liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 1997 e 1998 nos montantes de 10.622.052$ (€ 52982,57) e de 12.639.204$ (€ 63044,53) e juros compensatórios, liquidadas pela AT com recurso a correcções técnicas.

A MMª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra julgou a impugnação improcedente por sentença de 29 de Maio de 2014.

Inconformada, a Recorrente recorreu para este TCA concluindo as alegações com as seguintes conclusões:

  1. A douta sentença é nula por omissão de pronúncia (art. 125.° do CPPT), quanto à matéria suscitada nos artigos 27.º a 29.° da p.i., quanto ao vício de preterição de formalidades legais por violação do direito de audição.

  2. Procedendo esse vício, deve a sentença ser julgada nula por omissão de pronúncia e, consequentemente, ser ordenada a remessa dos autos à primeira instância para reforma da decisão de acordo com tal juízo.

    Nessa medida, invocou-se ainda, subsidiariamente: c) A sentença erra ao não dar como provado que “nos anos de 1997 e 1998, o sócio gerente da impugnante utilizava, habitualmente, a viatura Mercedes-Benz” (alínea a) dos factos não provados), contradizendo, inclusivamente, o facto dado como provado na alínea e).

  3. A prova requerida e efectuada refere-se ao período abrangido pelas correcções contestadas e não a qualquer outro momento anterior ou posterior (cf., se necessário, depoimento de M…, rotações 15 a 20), razão pela qual ao dar como provado, com interesse para a decisão e sem alteração do friso cronológico circunstancialmente em causa, o facto de o sócio gerente da impugnante usar, “frequentemente”, a viatura Mercedes CLK, o juízo do Tribunal refere-se forçosamente ao facto controvertido pela impugnante e balizado entre os anos de 1997 e 1998.

  4. A primeira testemunha, referindo-se a esse facto, não diz apenas que a viatura em causa era a “habitualmente” utilizada, concretizando mesmo que esse veículo era “praticamente sempre” utilizado pelo sócio gerente da impugnante (cf. depoimento de M…, rotações 77 a 100). A segunda testemunha, refere-se também a essa viatura como sendo a “mais frequentemente” utilizada pelo sócio gerente da ora recorrente (cf. depoimento de E…, rotações 490 a 497).

  5. Logicamente que impugnando a recorrente as correcções pressupostas pela utilização do veículo, que forçosamente se referem à utilização daquele, a única conclusão validamente possível é a de que, nesses exercícios, a viatura encontrava-se em utilização porque gerava as despesas corrigidas e impugnadas.

  6. Não se compreende, por não ser compreensível, como pode a Douta Sentença referir-se à impossibilidade de “aferir o período de utilização da viatura”, quando estão em causa despesas que forçosamente a pressupõem. Se em 1997 e 1998 foi pago o seguro dessa viatura, se em 1997 e 1998 existiram gastos de combustível com essa viatura, então, forçosamente, em 1997 e 1998, foi utilizada essa viatura! Assim: h) conjugados os depoimentos testemunhais nas partes referidas e o relatório da inspecção e atenta a motivação da matéria de facto referida pelo Tribunal, conclui-se (a) pela existência de uma contradição insanável entre as alíneas e) e a) (dos factos provados e não provados, respectivamente); (b) que é patente o erro de julgamento quanto a esse ponto da matéria de facto na parte em que o Tribunal a refere “não provada”, contra os meios de prova atrás referidos; (c) que o juízo constante da alínea e) dos factos provados ficou aquém da prova produzida, o que constitui, não menos, um erro de julgamento da matéria de facto, porquanto o Tribunal deveria ter dado como provado que a viatura Mercedes Benz, com a matrícula 96-39-10, era aquela que o sócio gerente da impugnante mais frequentemente utilizava.

  7. Em consequência, conjugado o facto referido na alínea d) dos factos provados, com o facto de a viatura Mercedes-Benz ser aquela que o sócio gerente da recorrente mais frequentemente utilizava, fica atestada a sua utilização nessas deslocações e a necessidade desses encargos. Razão pela qual o juízo do Tribunal de acordo com o qual não se provou que “nos anos de 1997 e 1998, era necessária a utilização da viatura Mercedes-Benz para o desenvolvimento da actividade da impugnante”, não pode manter-se.

  8. O mesmo se diga quanto à alínea c) dos factos não provados. Também aqui o Tribunal exorbita do facto (provado de que a “a esposa do sócio gerente da impugnante ajudava o marido em algumas tarefas da sociedade, como a elaboração de relatórios e a realização de pequenas deslocações, nomeadamente a bancos” - alínea h) dos factos provados), para um juízo de valor de matriz exclusivamente subjectiva e, como tal, desprovido de natureza fáctica, sendo que, para além disso, se suporta numa evidente violação das regras de experiência comum porquanto se afigura notório que o il quod plerumque accidit em cidades com alguma dimensão, como Coimbra, é que mesmo as deslocações puramente citadinas são efectuadas através de viaturas automóveis.

  9. Dando-se por provado que a esposa do sócio gerente e também ela sócia da impugnante efectuava deslocações ao serviço da sociedade, da circunstância de as testemunhas não terem referido “se, para esse efeito, ela precisava de utilizar um veículo automóvel”, não resulta o “facto” levado à alínea c) dos factos não provados.

  10. Trata-se aí de um juízo presuntivo que não tem qualquer apoio no padrão de realidade pressuposto como critério de normalidade na ponderação da prova: se do facto “não efectua deslocações” pode colher-se “não precisa de automóvel”, já do oposto daquele não pode validamente extrair-se idêntica conclusão.

  11. Com base no depoimento da testemunha, E…, rotações 380 a 420., o Tribunal devia ter dado como provado, atento o interesse para a decisão que o sócio gerente se deslocava mensalmente a uma localidade onde tinha de instalar todo o equipamento oftalmológico necessário para as consultas que aí prestava.

  12. A viatura, com a matrícula IO era a mais frequentemente utilizada pelo sócio gerente da impugnante, e como tal, os encargos suportados com ela são dedutíveis fiscalmente.

  13. Os pressupostos de actuação da AT foram infirmados pela recorrente, não apenas por se ter demonstrado que a actividade não era exercida exclusivamente por um sócio e porque foram efectivamente suportadas despesas e encargos com viaturas, deslocações e estadas, que o fisco não acolheu.

  14. A indispensabilidade a que se refere o artigo 23.° do CIRC como condição para que um custo seja dedutível não se refere à necessidade (a despesa como condição sine qua non dos proveitos), nem sequer à conveniência (a despesa como conveniente para a organização empresarial), sob pena de intolerável intromissão da AT na autonomia e na liberdade de gestão do contribuinte, mas exige, tão só, uma relação de causalidade económica, no sentido de que basta que o custo seja realizado no interesse da empresa, em ordem directa ou indirectamente, à obtenção de...

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