Acórdão nº 01228/09.3BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2018

Data12 Abril 2018
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida em 13/12/2016, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por M...

, NIF 2…, residente na Avenida…, 3600-199 Castro Daire, contra as liquidações adicionais de IRS e respectivos juros compensatórios, referentes aos exercícios económicos dos anos 2006 e 2007, no valor global de €18.243,07.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “A. Incide o presente recurso sobre, a aliás douta sentença, que julgou procedente a presente impugnação, com a consequente anulação das liquidações de IRS referentes aos exercícios de 2006 e 2007 (e respetivos juros compensatórios).

  1. Como melhor se extrai da sentença recorrida, a decisão de total procedência da impugnação resulta do facto de o julgador ter considerado que a AT não demonstrou o preenchimento dos pressupostos que a legitimavam a proceder à avaliação da matéria tributável com base na metodologia indiciária, pois entendeu no juízo decisório que o técnico inspetivo misturou os pressupostos da tributação por métodos indiciários e a quantificação da matéria tributável.

  2. Para o efeito de julgar procedente a impugnação consignou-se na douta sentença “A Administração Tributária considerou verificar-se a impossibilidade de comprovação direta e exata da matéria tributável nos termos do artigo 87º n.º 1 alínea b) da LGT, invocando a existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado do bens ou serviços [alínea d) do citado artigo 88º] devido apenas e só às margens de comercialização apuradas…”.

  3. Depois de assinalar que “…se levantam várias dúvidas quanto à valia de percentagens de lucro obtidas por testes, como indicador de que existem proveitos omitidos que permitam assim à Administração Tributária afastar-se das declarações do sujeito passivo, e vir a apurar a matéria por recurso a métodos indiciários”, a sentença em causa conclui que “…as diferenças entre as margens de lucro declaradas e as apuradas pela Administração Tributária pela amostragem realizada, com a consequente diferença entre as prestações de serviços/vendas declaradas e as estimadas, não constituem um elemento objetivo e concreto que permitisse à Administração Tributária concluir que a contabilidade da impugnante não refletia a sua real situação e que era inviável o apuramento direto”.

  4. No fundo, a sentença sob análise considerou que a AT não recolheu qualquer elemento que a legitimasse a recorrer aos métodos indiretos, sendo que, ressalvando-se o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, sendo nosso entendimento que, da factualidade e elementos probatórios existentes nos autos, nunca poderia a decisão ser aquela que agora se sindica.

  5. Com efeito, entende a Fazenda Pública que a douta sentença recorrida procedeu a uma incorreta aplicação do direito à factualidade apurada e demonstrada em sede inspetiva.

  6. Assim, o técnico inspetor apercebeu-se que a atividade desenvolvida pela impugnante resultava, sem mais, da mera transferência dos elementos do ativo e passivo de uma sociedade titulada por familiares diretos da impugnante, a qual dispunha já de uma estabilidade comercial cimentada ao longo de 10 anos no mercado.

  7. A Administração Tributária não pôs em causa a motivação inerente a esta transferência da mesma atividade para um familiar direto, mas ciente de que, regra geral, este tipo de operações são alavancadas por um propósito de incumprimento tributário, o técnico inspetor, não deixou de considerar especialmente apropriada a realização de testes que permitissem validar os dados constantes da contabilidade, cuja credibilidade, atento o que ficou dito, carecia de ser confirmada.

    I. Ora, perante este enquadramento, o técnico inspetor decidiu – e bem, saliente-se – aprofundar a sua investigação. Sucede que, à míngua de elementos que permitissem uma verificação global e completa, designadamente porque os artigos comercializados nem sempre eram devidamente identificados nas faturas e também porque não existia correspondência de referências Compra/Venda, realizaram-se testes com recurso aos documentos constantes da contabilidade, em que, sem margem para dúvidas, era possível identificar os produtos transacionados, tendo em vista o apuramento das margens de comercialização existentes na contabilidade.

  8. Ou seja, na impossibilidade evidente de concretizar um controlo completo, apurou-se a margem de comercialização do sujeito passivo a partir de alguns artigos, tendo-se constatado que as margens calculadas com base na contabilidade do contribuinte eram irrealistas e completamente descabidas, sendo notória a omissão de proveitos e a sobrevalorização dos custos. Esta demonstração saiu reforçada na sequência da resposta formulada pela impugnante, quando lhe foi solicitado que informasse as margens médias por si praticadas.

  9. Ou seja, o técnico inspetor não tinha outra forma de validar a veracidade da contabilidade, se não através do apuramento das margens declaradas à luz dos elementos da própria contabilidade.

    L. Todo este trabalho de investigação desenvolvido aquando da inspeção, tem uma sequência, uma lógica, uma coerência e um propósito que é o de verificar, com os próprios dados da contabilidade, se os dados são coerentes e consentâneos com os resultados ou se, como se verificou, estamos perante uma contabilidade fictícia, com uma coerência apenas aparente.

  10. Atente-se que, regra geral, no início do trabalho inspetivo todas as contabilidades estão aparentemente corretas, sendo que nalguns casos se verifica com a investigação subsequente, que por trás de uma roupagem de aparente rigor e correção (cuidadosamente preparada para transmitir essa imagem), se escondem omissões de compras, de vendas ou sobrevalorização de custos.

  11. E essa investigação não pode deixar de ser concretizada através da validação e confronto de elementos internos da própria contabilidade, pois é no seu seio que residem (ou não) as possíveis incongruências.

  12. Foi justamente isso que aconteceu no caso vertente.

  13. Por outras palavras, os testes realizados não são o pressuposto para a aplicação dos métodos indiretos, são, isso sim, uma forma adequada e particularmente apropriada, de verificar se a contabilidade é credível e verdadeira ou se foi “preparada” artificialmente de molde a parecer corretamente elaborada.

  14. Sublinhe-se que, a vingar o entendimento vertido na sentença sob recurso, tal significa que as contabilidades são insuscetíveis de serem sujeitas a testes de validação interna, justamente o instrumento mais poderoso para averiguar da sua veracidade. Ora, afigura-se-nos que uma tal ideia colide com o princípio transpositivo e supra legal do apuramento da verdade material, da verdade concreta e concretamente apurada dos factos, no caso contabilísticos.

  15. Atente-se que, na situação em apreço, a falta de correspondência das referências e a correta identificação dos artigos comercializados nas faturas, já supra elencadas, inviabilizaram a realização de outras metodologias de investigação (nem tão pouco a sentença identifica qualquer outra forma ou método que, ao invés do utilizado, pudesse e devesse ter sido empregue, de molde a possibilitar a rigorosa análise da contabilidade).

  16. Sintetizando, o apuramento das margens de comercialização com base na contabilidade constituiu não um ponto de chegada, uma conclusão, mas sim um ponto de partida, uma base que, depois de conjugada e articulada com os demais elementos da contabilidade, permitiu demonstrar a omissão de proveitos e a sobrevalorização de custos na atividade e, consequentemente, a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável.

  17. Dito de outro modo, ao contrário do expressamente afirmado na sentença sob recurso, os testes não foram o pressuposto para o recurso da metodologia indiciária, mas foram o seu resultado (que teve como premissas base, os elementos da própria contabilidade) que permitiu constatar da verificação desses tais pressupostos. Daí que nenhuma confusão exista entre pressupostos dos métodos indiretos (fase da qualificação) e a quantificação da matéria tributável (fase da quantificação).

  18. Nisto consiste o erro de julgamento da douta decisão recorrida, o qual implica a respetiva revogação.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que julgue improcedente, por não provado, o vício de erro nos pressupostos legitimadores da aplicação da metodologia indiciária, com as legais consequências.”****A Recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma: “A. Dos autos resulta que a AT não conseguiu, sequer minimamente, preencher com o seu itinerário cognoscitivo a previsão das normas legais às quais pretendeu essencialmente subsumir a sua actuação - a alínea b) do artigo 87° e a alínea d) do artigo 88° da LGT...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT