Acórdão nº 0438/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução20 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo I- RELATÓRIO 1- A Associação Sindical dos Juízes Portugueses, «em representação e defesa colectiva dos direitos e interesses de alguns dos seus associados, os Juízes Conselheiros referidos a fls. 23, intentou contra o Tribunal de Contas a presente acção administrativa especial, pedindo a anulação dos actos que, a partir de Janeiro de 2014, inclusive, processaram os vencimentos daqueles magistrados ao abrigo de uma norma inconstitucional e a condenação da entidade demandada a pagar-lhes as diferenças remuneratórias retidas e os respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, até efectivo cumprimento.

2- O Tribunal de Contas apresentou «a sua contestação», em que se limitou a oferecer «o merecimento dos autos» e a esclarecer «que se tratou de aplicar a lei».

3- Somente alegou a autora, preconizando a procedência da acção.

4- A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta neste STA emitiu douto parecer no sentido dessa mesma procedência.

5- Com dispensa de vistos, mas entrega em mão do acórdão, cumpre apreciar e decidir II-FUNDAMENTOS 1- DE FACTO Estão assentes os seguintes factos, pertinentes à decisão: “1 – Os Juízes Conselheiros do Tribunal de Contas indicados a fls. 23 são associados da autora.

2 – A partir de Janeiro de 2014, inclusive, os vencimentos desses magistrados foram processados e pagos com a redução imposta pelo art. 33º da Lei do Orçamento de Estado para 2014.

3 – O Acórdão do Tribunal Constitucional de 30/5/2014, proferido no proc. n.º 14/2014, declarou essa norma inconstitucional, com força obrigatória geral e com restrição de efeitos à data do aresto, por violação do princípio da igualdade.” 2- DE DIREITO 2-1- Através da acção administrativa especial dos autos, vem a associação sindical autora, em representação dos Juízes Conselheiros seus associados que constam do rol de fls. 23, pedir a anulação dos actos que, ao abrigo do art. 33º da Lei do Orçamento de Estado para 2014 (a Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), processaram os seus vencimentos no mês de Janeiro de 2014 e nos meses subsequentes; e, a título complementar, a autora pede que o Tribunal de Contas seja condenado a restituir aos mesmos associados as diferenças remuneratórias retidas e a pagar-lhes os juros moratórios correspondentes, à taxa legal.

Acontece que aquele art. 33º foi declarado inconstitucional, com força obrigatória geral e por ofensa do princípio da igualdade, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional, de 30/5/2014, proferido no Proc n.º 14/2014.

No entanto, o acórdão determinou que tal declaração de inconstitucionalidade só produziria efeitos «a partir da data da presente decisão».

A questão que se coloca é a de saber como conjugar a resssalva de efeitos do acto normativo declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional em sede de fiscalização abstracta, com a fiscalização sucessiva concreta a cargo de qualquer tribunal num processo ainda pendente.

Vejamos.

2-2- A possibilidade de um acto nulo poder produzir efeitos como se tratasse de um acto válido, ainda que durante um período temporalmente limitado, não é isenta de dificuldades quanto ao seu sentido e alcance, em especial no que se refere à força vinculativa da decisão do Tribunal Constitucional quanto à limitação de efeitos.

Para alguma doutrina, decorre da própria essência da nulidade da declaração de inconstitucionalidade, que devem “(…) os tribunais recusar-se a aplicar, declarando implicitamente nulos, actos inconstitucionais nos processos pendentes relativos a factos anteriores ao início da produção de efeitos de uma declaração expressa de inconstitucionalidade com força obrigatória do Tribunal Constitucional, mesmo que esta tenha salvo todos os efeitos do acto nulo até à sua publicação”, sob pena de, por esta via, se esvaziar de conteúdo a sanção de nulidade (cfr. MARCELO REBELO DE SOUSA, O valor jurídico do acto inconstitucional, Lisboa, 1988, p. 262).

Para outros autores, os casos pendentes devem ficar fora da ressalva de efeitos, sob pena de a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória poder funcionar como «prémio» para a norma em causa, ou seja, para o legislador, na fiscalização concreta. “Por isso, mesmo que haja ressalva de efeitos, nos processos pendentes, os tribunais, incluindo o TC, não ficam impedidos de julgar essa norma como inconstitucional (ou ilegal) e de se recusar a aplicá-la” (cfr. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2006, pp. 981/82).

Afigura-se, porém, que as teses mencionadas não correspondem à interpretação que resulta do art. 282º da CRP, tendo especialmente em conta o seu nº 4.

Senão vejamos.

2-2-1- Nos termos do nº 1 do art. 282º da CRP “a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade com força obrigatória geral produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional ou ilegal e determina a repristinação das normas que ela, eventualmente haja revogado.” Segundo a doutrina, a declaração de inconstitucionalidade ou da ilegalidade de normas é equivalente, em geral, à declaração de nulidade, considerando-se que as mesmas se...

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