Acórdão nº 01526/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução05 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A FAZENDA PÚBLICA interpôs recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto no art. 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo TCA Sul que concedeu parcial provimento ao recurso jurisdicional que interpusera da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que, por sua vez, julgara procedente a impugnação judicial que a A……………, S.A. deduzira com vista a obter a restituição de IRC retido na fonte e respectivos juros indemnizatórios.

1.1.

Concluiu as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: A) Quanto à questão de saber se, de acordo com o direito comunitário, houve, ou não, discriminação injustificada entre accionistas residentes e não residentes quanto à tributação dos lucros distribuídos por uma sociedade residente a accionista não residente, verificam-se os requisitos que permitem a interposição de recurso de revista para o STA, nos termos do art. 150º do CPTA.

B) Uma vez que tal questão assume relevância jurídica ou social, aferida em termos de utilidade jurídica, com capacidade de expansão da controvérsia que ultrapasse os limites da situação singular, decorrendo da interposição do presente recurso a possibilidade de uma melhor aplicação do direito, tendo como escopo a uniformização do direito, dado que tal questão tem capacidade para se repetir num número indeterminado de casos futuros.

C) Assim, tal questão assume particular relevância jurídica ou social, atenta a necessidade de uma melhor aplicação do direito neste e em outros casos futuros, isto tendo em conta não só a pertinência da questão jurídica em causa que se pode considerar como questão “tipo”, contendo uma situação bem caracterizada susceptível de se repetir em casos futuros, mas também, no facto de estar em causa uma interpretação feita pelo Tribunal que pode ser contrária ao direito comunitário.

D) Deve, pois, ser admitido o presente recurso de revista, uma vez que o mesmo versa sobre matéria complexa acerca da qual é admissível existirem dúvidas interpretativas na aplicação do quadro comunitário, relativo à não discriminação em razão da nacionalidade, da proibição de restrição à liberdade de estabelecimento e de livre circulação de capitais, sendo certo que tal questão pode interessar a um leque alargado de interessados e eventuais casos futuros, bem como que, dados os montantes envolvidos e estando em causa uma hipotética interpretação contrária ao direito comunitário por parte do Tribunal recorrido, esse STA, em recurso de revista, pode suscitar questão prejudicial junto do TJUE.

E) Assim como se mostra necessária a intervenção do órgão de cúpula nacional da justiça administrativa tributária atendendo, até, à interpretação e aplicação divergente que o STA manifestou, recentemente, sobre esta matéria no seu Acórdão de 20/02/213, proferido no Processo nº 1435/12 e que deixa antever que, nesta matéria a interpretação dos Tribunais não é unânime e que há a necessidade de uniformização dessa mesma interpretação.

F) Quanto ao mérito do presente recurso, o Acórdão ora recorrido fez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação dos artigos 90º nº 1, al. c), 46º nº 1, 80º nº 2, al. c), 14º nº 3 e 89º nº 1, todos do CIRC, bem como da Directiva nº 90/435/CEE, do Conselho e dos artigos 12º, 46º, 48º e 56º do Tratado CE, pelo que não se deve manter.

G) Na verdade, considerou o Acórdão recorrido que havia distinção de tratamento entre entidades residentes e não residentes, ao ter sido efectuada retenção na fonte de dividendos distribuídos à ora recorrida pelo B………….. e na parte não reembolsada, correspondente a 15% do dividendo pago, consubstanciada num tratamento discriminatório, contrário aos princípios comunitários, por não ser neutralizada.

H) Ora, antes de mais, se foi efectuada essa retenção foi porque, à data da distribuição dos lucros, a entidade não residente não reunia os requisitos que, nos termos do nº 3 do art. 14º do CIRC, lhe permitia obter a isenção sobre os lucros que uma entidade residente em território português coloque à disposição de entidade residente noutro Estado membro da União Europeia.

I) O problema em causa nos autos reporta-se, pois, não à sujeição, ou não, dos dividendos a imposto, a retenção na fonte, mas sim, à forma de recuperação do imposto que foi, efectivamente, retido na fonte. Mais propriamente, ao regime da eliminação da dupla tributação económica de lucros distribuídos, constante do direito fiscal português.

J) Ora, a Directiva 90/435/CEE que introduziu um regime fiscal comum aplicável às sociedades mães e sociedades afiliadas de Estados-membros diferentes, visando garantir a criação de condições análogas às de um mercado interno e o bom funcionamento do mercado comum, evitando dificuldades resultantes de restrições, desvantagens ou distorções especiais inerentes às disposições específicas de cada Estado membro, encontra-se transposta no direito fiscal português, à data, nos artigos 14º e 89º do CIRC.

K) Havendo lugar à obrigação de retenção na fonte, nos termos do anterior art. 89º nº 1 do CIRC, isto é, relativamente aos lucros que uma entidade residente em território português, nas condições estabelecidas no artigo 2º da Directiva nº 90/435/CEE, de 23 de Julho, coloque à disposição de entidade residente noutro Estado membro da União Europeia ou de um estabelecimento estável, situado noutro Estado membro, de uma entidade residente num Estado membro que esteja nas mesmas condições e que detenha directamente, ou por intermédio de um estabelecimento estável situado no território de um Estado membro, uma participação no capital da primeira não inferior a 25% ou 20%, como se viu e quando esta participação não tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante os dois anos anteriores à data da sua colocação à disposição, a mesma é feita, a titulo definitivo, como não podia deixar de ser, atenta a natureza de não residente da entidade beneficiária dos dividendos.

L) Pelo contrário, no que toca a entidades residentes, a norma de dispensa de retenção na fonte, constante do art. 90º do CIRC, é uma norma excepcional, a regra é haver lugar a retenção na fonte, uma vez que os lucros distribuídos a residentes são considerados pelo direito fiscal português como proveitos ou ganhos, logo, a mesma tem sempre a natureza de pagamento por conta do imposto devido a final.

M) Nestes termos, também a norma constante do anterior art. 46º nº 1 do CIRC, é uma norma que respeita à tributação final desses lucros ou ganhos que estão sujeitos a imposto no território português e, assim, para evitar que eles sejam, aqui, duplamente tributados, permite-se a sua dedução ao lucro tributável, desde que estejam reunidas determinadas condições, veja-se a al. c) do referido n° 1.

N) Contudo, tais diferentes condições reportadas a um momento posterior, quando ainda seria permitido o reembolso do imposto retido aos não residentes e quando é permitida, em certas condições, aos residentes, a dedução à matéria colectável dos lucros distribuídos, são justificadas por situações diferentes.

O) O regime constante do art...

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