Acórdão nº 01595/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelASCENSÃO LOPES
Data da Resolução12 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A sociedade A……………………, Lda, melhor identificada nos autos, veio recorrer do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul (Secção de Contencioso Tributário) de 12 de Março de 2013, (cfr. fls. 541-597), por oposição com o Acórdão proferido em 23 de Fevereiro de 2006 – Processo nº 0105/01 do Tribunal Central Administrativo Norte.

Admitido o recurso por despacho do relator a fls. 625, foram apresentadas alegações tendentes a demonstrar a oposição entre os citados acórdãos (cfr. fls.629-632 verso).

Por despacho de fls.656-660 foi determinado o prosseguimento do recurso, tendo sido ordenado a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos do artigo 282.º nº 3 do CPPT, aplicável por força do disposto no nº5 do artigo 284.º do CPPT.

A recorrente apresentou a fls.665-677 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: «1 — De acordo com os critérios doutrinal e jurisprudencialmente fixados, existe contradição de julgados quando (i) há identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica; (ii) não houve alteração substancial na regulamentação jurídica; (iii) se perfilhe, nos dois arestos, solução oposta; (iv) a oposição decorra de decisões expressas e não implícitas.

II - Ambos os acórdãos partem do mesmo pressuposto que consiste na desconsideração dos custos apresentados pelo contribuinte em sede de IRC e em ambos os processos apreciou-se se, nestes casos, se impõe ou não à Administração Fiscal o recurso a métodos indirectos de forma a apurar os custos que existiram e que geraram os proveitos objecto de tributação.

III - No acórdão recorrido foi decidido que não se impõe à Administração Tributária o recurso a métodos indirectos enquanto que no acórdão fundamento decidiu-se em sentido contrário, concluindo-se que se impõe “essa avaliação, nomeadamente por os custos, em virtude de a contabilidade não ser credível, não poderem ser apurados por outros meios”.

IV - Estão em causa duas decisões expressas e opostas que recaem sobre uma questão apreciada à luz da mesma regulamentação jurídica, que não sofreu até à prolação do acórdão recorrido alteração substancial, pelo que se pugna de imediato pela verificação dos três últimos critérios supra explicitados.

V - Resta apreciar a existência de uma identidade da questão de direito, o que pressupõe igual identidade na matéria de facto, entendida não como uma total identidade dos factos, sob pena de uma quase impossibilidade de verificação deste critério, mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

VI - Nos presentes autos, provou-se que no exercício de 2002 a ora recorrente emitiu as facturas constantes de fls. 102 a 194 dos autos (als. B) a P) dos factos provados) e provou-se ainda que as facturas emitidas pelos subempreiteiros à recorrida são as constantes de fls. 242 a 250, no valor global, sem IVA, de € 274.641,60 e que esse valor foi totalmente desconsiderado pela Administração Fiscal enquanto custo e acrescido ao resultado tributável do exercício de 2002 (cfr. al. U) dos factos provados, bem como a al. W), em especial, as páginas 24, 29 e 30 do douto acórdão recorrido).

VII - Analisados os serviços descritos nas facturas emitidas pela recorrente, verifica-se que estão em causa essencialmente serviços de beneficiação florestal, de vedação, de limpeza e de manutenção de zonas verdes, cuja execução depende essencialmente de mão-de-obra, resultando ainda dessa análise a grande dimensão dos trabalhos executados, perfeitamente demonstrada pelo volume de facturação.

VIII - De acordo com a Administração Fiscal, a recorrente não teve, no exercício de 2002, qualquer custo com subempreiteiros, o que é totalmente irrealista quando se atende ao volume de trabalhos prestados e facturados e à natureza dos mesmos, o que resulta evidente da matéria de facto dada por provada.

IX - Existindo uma identidade fáctica entre os dois processos, como se crê existir, e tendo a mesma questão de direito, ou seja, a imposição ou não do recurso a métodos indirectos para determinação dos custos fiscalmente desconsiderados, sido decidida em sentido oposto, entende-se estar verificado o último requisito para que se conclua pela oposição de julgados.

X - Resulta da matéria de facto dada por provada nos presentes autos — cfr. alíneas B) a P) e JJ) - que a ora recorrente, no âmbito da sua actividade, prestou serviços com um volume de facturação na ordem dos € 500.000,00 (quinhentos mil euros), cuja execução depende quase única e exclusivamente de mão-de-obra.

XI - A recorrente para executar esses trabalhos teve necessariamente de recorrer a subempreiteiros, cujos custos se encontram documentados pelas facturas de fls. 242 a 250 dos autos, no valor global de € 274.641,60, totalmente desconsiderados pela Fazenda Pública enquanto tal, que optou pela mera operação aritmética de fazer acrescer esse valor ao resultado tributável do lucro de 2002.

XII - Tendo a Administração Fiscal acesso ao volume de facturação da recorrente e ao seu quadro de pessoal, constituído em 2002 por cerca de 15 trabalhadores, necessariamente teria de concluir que a sociedade não dispunha de capacidade para executar, pelos seus próprios meios, os serviços adjudicados e que teve de recorrer à ajuda de terceiros, o que implica a assunção de custos.

XXII - Mesmo que se opte por desconsiderar as facturas apresentadas, e impondo a Constituição da República Portuguesa que as sociedades sejam tributadas pelo seu lucro real (artigo 104°, n.º da C.R.P.), a Administração Fiscal não poderia deixar, por a isso estar obrigada, de recorrer a métodos indirectos para a determinação dos custos suportados pela recorrente, mas não o fez.

XXV - De acordo com o disposto na al. b) do n.º 1 do artigo 87° da LGT, em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto, não só poderá, como deverá (em respeito pela mencionada regra constitucional), a Administração Tributária recorrer a métodos de avaliação indirecta.

XV - O recurso aos métodos indiciários não é uma mera faculdade da Administração Fiscal, mas sim uma obrigação nos casos discriminados na lei, sob pena de, ao não ser aceite qualquer custo, serem inflacionados os resultados para além do verosímil, atingindo valores que nada têm a ver com a realidade.

XVI - O acórdão recorrido ao ter decidido que não se impunha a aplicação de métodos indirectos para a determinação dos custos suportados pela ora recorrente, não anulando o acto de liquidação impugnado, violou os princípios da legalidade, da justiça e da tributação pelo lucro real e as normas dos artigos 103º e 104º, n.º 2 da C.R.P. e dos artigos 5º, n.º 2, 87.º e 90° da LGT.

XVII - Deverá prevalecer, assim, o entendimento sufragado no douto acórdão fundamento, anulando-se a liquidação impugnada e fixando-se jurisprudência no seguinte sentido: No exercício de uma actividade em que a subcontratação de mão-de-obra assume valor significativo, a serem desconsiderados pela Administração Fiscal os custos declarados pelo contribuinte, deverá ser utilizada a avaliação indirecta para apuramento dos custos que no caso concreto tiveram de existir, sob pena de violação do princípio constitucional da tributação pelo lucro real.

Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o recurso ser julgado procedente, fixando-se jurisprudência de acordo com o entendimento sufragado no acórdão fundamento e anulando-se a liquidação impugnada, pois só assim se fará a COSTUMADA JUSTIÇA!» Contra alegou a representante da Fazenda Pública, concluindo que: «

  1. A invocação da oposição de acórdãos depende da verificação dos seguintes pressupostos cumulativos: - que exista contradição entre acórdão do TCA e outro acórdão anterior, do mesmo TCA ou do STA ou entre acórdãos do STA; - que essa contradição recaia sobre a mesma questão fundamental de direito; - que se tenha verificado o trânsito em julgado do acórdão impugnado e do acórdão fundamento; - que não exista, no sentido da orientação perfilhada no acórdão impugnado, jurisprudência mais recentemente consolidada no STA.

  2. No presente recurso com fundamento em oposição de acórdãos, entendemos que não existe real contradição entre as doutrinas adoptadas por cada uma das decisões — o que existe sim, são duas situações fácticas distintas, porquanto: c) No acórdão fundamento, os custos desconsiderados pela Administração Fiscal foram levados à base instrutória e fundamento da decisão, contrariamente ao que sucedeu no acórdão recorrido.

  3. No acórdão fundamento foi proferido com base em um contexto factual específico que o próprio acórdão reflecte na factualidade mencionada no probatório.

  4. Constitui, portanto, a ausência de custos o real fundamento da decisão proferida no acórdão fundamento, o que não ocorre no acórdão recorrido, no qual não resulta do probatório qual o valor dos custos subsistentes após as correcções técnicas efectuadas por desconsideração das facturas falsas; f) Isto é, a questão sobre os custos constantes na contabilidade após a correcção aritmética é omissa no probatório.

  5. Não foi, portanto, ponderado, no acórdão recorrido, a questão dos custos subsistentes após a correcção e, consequentemente, e essencialmente, não se pronunciou sobre se os montantes permitiam a obtenção dos proveitos declarados, neste sentido vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 17/10/2012, proferido no processo n.º 0287/12.

  6. Os Acórdãos recorrido e fundamento, decidiram, pois, a mesma questão - legalidade do recurso a correcções técnicas para desconsideração de custos titulados por facturas falsas - de forma distinta, não por força de divergência de entendimentos jurídicos, mas, antes...

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