Acórdão nº 0726/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 674/07.1BELLE 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A…………….., Lda.” (adiante Impugnante ou Recorrida) deduziu impugnação judicial contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) que lhe foram efectuadas com referência a cada um dos trimestres do ano de 2002.
1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé proferiu uma primeira sentença (de fls. 294 a 310) em que julgou caducado o direito de impugnar e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública do pedido.
1.3 Dessa sentença recorreu a Impugnante para o Tribunal Central Administrativo Sul que, pelo acórdão de fls. 361 a 379, concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença recorrida e ordenou que os autos regressassem à 1.ª instância para conhecimento do mérito da impugnação judicial.
1.4 Regressados os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, foi proferida nova sentença (de fls. 387 a 403) que, julgando procedente a impugnação judicial com fundamento na caducidade do direito à liquidação, anulou a liquidação impugnada.
1.5 Dessa sentença recorreu a Fazenda Pública para este Supremo Tribunal Administrativo e o recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.6 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « a) As questões decidendas são: a impugnante foi validamente notificada do exercício do direito de audição e como tal poderia ser notificada da liquidação adicional de IVA através de carta registada, nos termos do art. 38.º n.º 3 do CPPT? E, caso assim se não entenda, se a formalidade da exigência de notificação por carta registada com aviso de recepção, se degradou em formalidade não essencial com a tomada de conhecimento da liquidação pela ora recorrida? b) Do art. 77.º n.º 6 da LGT e art. 36.º do CPPT resulta que os actos tributários que afectem os direitos e interesses dos contribuintes só produzem efeitos quando lhes sejam validamente notificados (Vide art. 268.º n.º 3 da CRP); c) O art. 60.º n.º 1 al. e) e n.º 4 da LGT conjugado com art. 60.º do RCPIT prevê que o direito de audição deve ser enviado em carta registada simples para o domicílio fiscal do contribuinte; d) A carta registada enviada para a sede da sociedade impugnante, para efeitos do exercício do direito de audição relativamente ao projecto de relatório, foi devolvida com a indicação de “mudou-se”, mas por consulta aos dados do Sistema Informático da DGCI (Cadastro dos Contribuintes), verificou-se que naquela data a sua sede manteve-se inalterada; e) Logo, qualquer posterior alteração da sua sede é ineficaz perante a Administração Tributária enquanto não lhe for comunicada, nos termos do disposto no art. 43.º n.º 2 do CPPT e art. 19.º n.º 3 da LGT; f) Ora, tendo a sociedade mantido a sua sede, tal notificação tem de considerar-se validamente efectuada, já que a lei não exige para a mesma a notificação pessoal ou com aviso de recepção; g) O n.º 3 do art. 38.º do CPPT (redacção dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30/12), estabelece que as notificações de liquidações de tributos que resultem de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição são efectuadas por carta [registada] simples, presumindo-se efectuadas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte quando aquele seja dia não útil, nos termos do n.º 1 do art. 39.º do CPPT; h) Razão porque a Administração Tributária procedeu ao envio de carta registada simples para a sede da impugnante para concretizar, de forma válida, a notificação do acto de liquidação, a qual se deve considerar feita no 3.º dia posterior ao registo, tendo em conta que a mudança da sede, não comunicada à Administração, implica a inoponibilidade da falta do seu recebimento (Cfr. art. 38.º n.º 3 e art. 43.º n.º 2 ambos do CPPT); i) Ou seja, a efectiva notificação para efeitos do exercício do direito de audição da correcção efectuada à matéria colectável torna suficiente o envio de carta registada simples para a perfeição da notificação do acto de liquidação, o que aqui ocorreu; j) Se assim não se entender, o que só por mero dever de patrocínio se concede, sempre se dirá que, a formalidade da exigência de notificação por carta registada com aviso de recepção, degradou-se em formalidade não essencial com a tomada de conhecimento da liquidação pela impugnante, ora recorrida, senão veja-se: k) As liquidações de IVA foram igualmente devolvidas com a indicação de “mudou-se”, mas do Sistema Informático da DGCI (Cadastro dos Contribuintes) não consta qualquer alteração da sede da sociedade, por isso, não tendo cumprido o dever de a actualizar, tal facto não pode ser oponível à Administração Tributária, nos termos do art. 43.º n.º 1 e 2 do CPPT e do art. 19.º n.º 3 da LGT, pelo que têm-se por validamente notificadas; l) A teoria das formalidades não essenciais é uma decorrência do princípio do aproveitamento dos actos, defendendo que quando uma formalidade não é realizada mas o objectivo material foi atingido, essa formalidade transforma-se em formalidade não essencial, sendo o acto apenas irregular, assim m) A prova que a notificação foi recebida pela impugnante sana a irregularidade procedimental (formalidade ad probationem); n) Do probatório (prova documental - doc. 3 a 6 da contestação e prova testemunhal cassete n.º 236) retira-se com segurança que a impugnante teve conhecimento da liquidação de imposto, já que foi a sua conduta durante todo o procedimento inspectivo que obstaculizou qualquer notificação postal ou pessoal; o) Na mesma sede da sociedade existia uma outra empresa cujos sócios gerentes eram os mesmos desta sociedade impugnante, então como é que se pode dizer que a Administração Tributária não provou o efectivo conhecimento pela impugnante daquela notificação, se esta foi para aí enviada e entregue; p) Assim sendo, provou-se que foi efectivada a notificação ao contribuinte pela forma legal, dentro do prazo de caducidade, pelo que não há dúvidas que tem-se por verificada a caducidade do direito à respectiva liquidação; q) A douta sentença padece de erro de julgamento por violação do disposto nos arts. 38.º n.º 3 e 43.º n.º 2 ambos do CPPT e art. 19.º n.º 3 e 45.º n.º 1 da LGT.
Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, só assim se fazendo JUSTIÇA» (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgem aqui em tipo normal.
).
1.7 A Impugnante contra alegou, resumindo a sua posição em conclusões do seguinte teor: « I - O recurso interposto pela recorrente incide sobre sentença proferida, em 18.4.2011, pela 2.ª Unidade Orgânica, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, a qual julgou procedente a falta de atempada e regular notificação da impugnante no prazo de caducidade do direito de liquidação.
II - A sentença sub judice foi emitida pelo douto Tribunal a quo na sequência e em cumprimento de anterior Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) proferido em 3.11.2010, no processo n.º 4270/10, o qual havia já transitado em julgado.
III - No âmbito do recurso já apreciado pelo TCAS “A questão decidenda traduz-se em saber se a impugnante deve considerar-se notificada da liquidação dentro do prazo de caducidade nos termos prescritos para a notificação por carta registada e, por conseguinte, se a presente impugnação foi tempestivamente apresentada”.
IV - Tendo-se [n]esse Tribunal de recurso decidido o seguinte: “Mas isso significará que, no presente caso, a formalidade consistente na exigência de notificação por carta registada com aviso de recepção, se degradou em formalidade não essencial com a tomada de conhecimento da liquidação pela impugnante? A nosso ver a resposta terá que ser negativa pois que a irregularidade de falta de formalidades legais ocorridas na notificação de um acto só poderá obter sanação mediante a prova do conhecimento efectivo desse acto pelo destinatário, ónus a cargo da Fazenda Pública, sendo a dúvida contra ela resolvida.
Ora, não se provando nos autos o efectivo conhecimento e existindo fundada dúvida sobre se o destinatário teve tal conhecimento, sendo o ónus da Fazenda Pública, essa dúvida beneficiará a impugnante (cfr. art. 341.º n.ºs 1 a 3 do Código Civil) Desta forma, há que concluir que assiste razão à recorrente, não tendo ocorrido a caducidade do direito de impugnar, procedendo o presente recurso.” V - Uma vez que a sentença sub judice se adequou agora ao decidido – e já transitado em julgado – em sede de recurso, nenhuma crítica será de se lhe dirigir.
VI - Sob pena de, claro está, ocorrer uma violação de caso julgado.
VII - Atente-se que a sentença recorrida bem andou ao precisar que “a notificação irregular que impediu a caducidade do direito de acção, é precisamente a mesma que poderia impedir a caducidade do direito da administração fiscal proceder à liquidação do tributo.
” VIII - Representando um absurdo ilogicismo judiciário a tese da recorrente, segundo a qual, uma e a mesma notificação poderá ser tida como válida, regular e operante quando em causa esteja a análise da caducidade do direito de liquidação e ser inválida, irregular e inoperante quando se esteja a analisar a caducidade do direito de impugnação.
IX - De salientar que o cotejo das notificações de imposto subjacentes aos autos com a doutrina da degradação de formalidades essenciais em...
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