Acórdão nº 0279/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução09 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: A…………, com os demais dos autos, instaurou, no TAC de Lisboa, acção ordinária de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito contra: - Maternidade Dr. Alfredo da Costa - B…………, - C…………, - D…………, E………… e - F………… pedindo a sua condenação no pagamento de uma quantia não inferior a 70.579.779$00 [€ 352.050,45] pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe causaram em resultado de um acto cirúrgico deficientemente executado e da falta de tratamento ou de tratamentos inadequados que lhe ministraram.

Os RR contestaram por excepção - para invocar a sua ilegitimidade e a prescrição do direito reclamado - e por impugnação - para contrariar a factualidade alegada pela Autora e pugnar pela improcedência da acção.

Foi realizada audiência preliminar onde se decidiu (1) julgar procedente a questão da ilegitimidade processual das pessoas singulares demandadas e (2) fixar a base instrutória.

Realizado o julgamento foi proferida sentença, em 6/07/2011, concedendo parcial provimento à acção e condenando a Maternidade Alfredo da Costa a pagar à Autora “a quantia de 172.000 euros acrescida de juros de mora desde a data da citação até integral pagamento e as quantias que se vierem a liquidar em execução de sentença ou em incidente de liquidação a deduzir, correspondentes aos danos patrimoniais e aos danos morais futuros.

” O Centro Hospitalar de Lisboa, Central, E.P.E - que sucedeu à Maternidade Alfredo da Costa - interpôs o presente recurso onde formulou as seguintes conclusões: 1.

A douta sentença recorrida fez uma errada interpretação dos factos provados e não provados, bem como do direito aplicável, violando, desde logo, o artigo 607.°, n.ºs 2 e 3, do C. P. Civil; 2.

Com os fundamentos constantes dos artigos 19.° a 25.°, que aqui se dão como integralmente reproduzidos, a douta sentença decidiu com base em erro de direito, na análise dos factos quanto ao facto ilícito durante a cirurgia a que se submeteu a A., quando concluiu pela ilicitude da conduta dos médicos da Ré que efectuaram a intervenção; 3. Com os fundamentos constantes dos artigos 26.° a 34.°, que aqui se dão como inteiramente reproduzidos, a douta sentença recorrida, por erro na aplicação das regras do ónus da prova, violou o disposto no artigo 342.°, n.º 1, do Código Civil; 4.

Com os fundamentos constantes dos artigos 35.° a 37.°, a douta sentença recorrida violou igualmente o artigo 487.°, n.º 2, do Código Civil; 5.

Com os fundamentos constantes dos artigos 38.° a 47.°, que aqui se dão como integralmente reproduzidos, a douta sentença errou de direito na análise do nexo de causalidade adequada, o que fez em violação o artigo 566.°, n.º 2, do Código Civil; 6.

Com os fundamentos constantes dos artigos 48.° a 57.°, cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido, a douta sentença recorrida errou também na análise que fez em relação aos danos alegados pela Autora e que deu como provados; 7.

Com os fundamentos constantes dos artigos 58.° a 67.°, que aqui se dão como integralmente reproduzidos, a douta sentença recorrida errou quando fixou indemnização pela perda permanente da incapacidade de ganho da Autora, como também, por ter feito uma errada interpretação, quanto aos danos por ela alegados, dos factos dados como provados, alguns com respostas contraditórias, tendo errado na aplicação do direito, por violação, uma vez mais, das regras do ónus da prova (artigo 342.° do C. Civil); 8.

Com os fundamentos constantes dos artigos 69.° a 72.°, cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido, a douta sentença recorrida violou também, nesta parte, por errada interpretação dos factos e por erro na aplicação das regras do ónus da prova, quanto aos danos alegados a este título, o artigo 342.°, n.º 1, do Código Civil; 9.

Com os fundamentos constantes dos artigos 78.° a 81.º, cujo teor aqui também se dá como inteiramente reproduzido, e relativamente à condenação por danos não patrimoniais, a douta sentença recorrida violou, por errada interpretação dos factos e por erro na aplicação das regras do ónus da prova e do nexo de causalidade adequada, quanto aos danos alegados a este título, os artigos 342.°, n.º 1, e 566.°, n.º 2, ambos do Código Civil; 10. Tendo, pelos mesmos fundamentos, a douta sentença recorrida errado de direito, ainda relativamente à condenação por danos não patrimoniais, também os artigos 494.° e 496.°, n.º 3, do Código Civil; 11.

Em suma, com todos fundamentos atrás aduzidos, a douta sentença recorrida violou o artigo 483.° do Código Civil, uma vez que, no entender do recorrente, se não mostram, nos presentes autos, satisfeitos todos os pressupostos de que depende a condenação em indemnização a favor da Autora; 12.

Tendo também a douta sentença recorrida, quer por manifesto erro de análise dos factos que deu como provados e não provados, quer por errada aplicação do direito, violado, o artigo 607.°, n.ºs 3 e 4, do (novo) C. P. Civil.

A Autora recorreu subordinadamente formulando as seguintes conclusões: 1.

A recorrente entende que ao condenar a recorrida apenas no montante de 80.000€ (oitenta mil euros) a título de danos não patrimoniais o Tribunal “a quo” violou os artigos 483° e 496° do C. Civil; 2.

Atendendo aos graves danos não patrimoniais sofridos pela recorrente a indemnização deveria ser, quanto a esta matéria de 249.399€ (Duzentos e Quarenta e Nove Mil Trezentos e Noventa e Nove Euros); 3.

A recorrente uma mulher completamente activa, quer a nível profissional, social ou sexual, de um momento para o outro ficou totalmente incapaz; 4.

A recorrente ficou aos 50 anos de idade com incapacidade para manter relações sexuais, sem sensibilidade na zona genital, com perturbações esfincterianas e genitais, nomeadamente, incontinência ou retenção urinária e fecal, chegando ao ponto de pensar no suicídio.

  1. Onde até as funções mais básicas do dia a dia como sejam sentar-se ou andar lhe causam dores; 6.

    Sendo certo que as lesões sofridas pela recorrente e provocadas pelos médicos da recorrida são irreversíveis; 7.

    A Recorrente encontra-se a sofrer física e psicologicamente há mais de 18 anos, ou seja desde Maio de 1995, data em que os clínicos da recorrida operaram a recorrente; 8.

    Os danos morais sofridos pela A., na escala de graduação do IML são muito próximos dos valores máximos atribuídos: - A Nível psicológico e psiquiátrico uma incapacidade de 12 (Doze) pontos numa escala que vai até 15 (cfr. Documentação junta aos autos fls. 566 e seguintes); - A Nível de Quantum Doloris 5 (Cinco) pontos numa escala de 7 (Cfr. fls. 573 e seguintes); - A Nível de Incapacidade Permanente Geral 45 (Quarenta e cinco) (Cfr. fls 573 e seguintes); - A Nível de Prejuízo Sexual 3 (Três) pontos numa escala de 5 (Cfr. fls. 573 e seguintes); 9.

    Em termos de incapacidade multiuso, realizada por junta médica, nos termos do DL n.º 341/93, de 30/09 foi-lhe atribuída uma incapacidade permanente global de 73% (setenta e três por cento).

  2. A indemnização dos danos não patrimoniais ora invocados têm como objectivo compensar a recorrente daqueles danos, através duma quantia em dinheiro que lhe permita um acréscimo de bem-estar e o acesso a bens recreativos e culturais, enquanto naturais contrapontos das dores e angústias passadas e futuras, da perda da auto estima, da frustração da sociabilidade.

  3. “No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista. É que, não obstante visar reparar, de algum modo, mais do que indemnizar, também não se alheia da ideia de reprovar ou castigar no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado a conduta do agente.

    (A. Varela, “Das Obrigações em Geral, Vol. I, pág. 607, 608)” 12. Assim sendo, tendo em conta a gravidade e multiplicidade dos danos não patrimoniais sofridos pela recorrente e que foram provados e dados como assentes ao longo do presente processo, a ausência de culpa da sua parte, a sua idade e condição sócio - económica média, o juízo de equidade que constitui o critério decisivo da fixação do montante indemnizatório (art.° 496° n.°3 primeira parte do Código Civil), deve a recorrida ser condenada a pagar à recorrente a título de danos não patrimoniais o montante de 249.399€ (Duzentos e Quarenta e Nove Mil Trezentos e Noventa e Nove Euros), perfazendo uma indemnização no montante global de 341.399€ (Trezentos e Quarenta e Um Mil Trezentos e Noventa e Nove Euros), quanto ao mais se mantendo a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”; A Autora contra alegou o recurso da Ré finalizando-o do seguinte modo: I.

    A recorrida não pode deixar de lamentar que decorridos 18 (Dezoito) anos, sobre a intervenção cirúrgica que lhe causou danos irreversíveis, e após ter ficado claro em julgamento que as lesões foram provocadas na intervenção cirúrgica realizada naquele estabelecimento, a Recorrente venha ainda com o presente recurso pretender, unicamente protelar a presente instância; II.

    A Sentença proferida pelo Tribunal a quo se merece alguma censura prende-se com o facto de ter condenado a Recorrente a indemnizações demasiado baixas para os danos sofridos pela Recorrida; III.

    As considerações vertidas nas alegações da Recorrente não podem ser apreciadas pelo STA; IV.

    Aquilo que o recorrente pretende é colocar em causa a livre apreciação da prova efectuada pelo Tribunal “a quo” e não a violação de qualquer regra jurídica; V.

    O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto do recurso para o Supremo Tribunal a não ser quando haja ofensa de uma disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do fado ou haja violação de norma legal que fixe a força probatória de determinado meio de prova, o que não acontece manifestamente no caso sub judice.

    VI.

    Independentemente da discussão que existe entre saber se a responsabilidade da recorrente é contratual ou extra contratual no caso sub judice ficaram provados todos os factos necessários ao...

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