Acórdão nº 0250/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução17 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. O Magistrado do Ministério Público junto do TAF de Sintra e a Fazenda Pública recorrem da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgou procedente a impugnação que A….e B….., ambos com os demais sinais dos autos, deduziram contra a liquidação de IRS do ano de 2004, com o nº 20085000076259 e correspondentes demonstração de juros e de compensação, no montante de 27.080,41 Euros.

1.2. O Ministério Público termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 1. Recorre-se do acerto da douta sentença na qual o Meritíssimo Juiz "a quo" decidiu julgar procedente a impugnação judicial apresentada por A……. e o filho B……, com a consequente anulação do acto tributário impugnado.

  1. Assenta o decidido no fundamento de que existiu reinvestimento efectivo, porquanto foram cumpridas os requisitos do destino do imóvel e do limite temporal do reinvestimento, não existindo qualquer requisito legalmente formulado quanto à necessidade do reinvestimento ter de ser realizado em imóvel distinto do alienado.

  2. Concluiu que a liquidação impugnada é ilegal, devendo por isso ser anulada, o que sucederá da mesma forma quanto aos juros compensatórios respetivos.

  3. A nosso ver, não assiste razão no decidido na medida em que, se por um lado a sentença admite a necessidade de dois imóveis, referindo-se a "ambos" e ao imóvel "de partida" e o imóvel "de chegada", por outro lado, omite, o requisito legal "de que seja reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel".

  4. Os requisitos legais para que sejam excluídos da tributação os ganhos obtido mediante a alienação onerosa de imóveis são: - Que o imóvel alienado se destine à habitação própria e permanente do sujeito passivo e do seu agregado familiar; - Que o valor da realização seja reinvestido na aquisição de imóvel para o mesmo fim no prazo de 24 meses.

    - Que seja reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel.

  5. O significado de "outro" é: "o que não é o mesmo" , "diferente", "mais um" (cfr. busca no Google, definição de "outro" no Dicionário Português Online).

  6. A lei não contém palavras inúteis e, de facto, não é inútil a lei utilizar as palavras "reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel", porque o que o legislador quis dizer foi exactamente "propriedade de outro imóvel", referindo-se naturalmente a "que não é o mesmo", "diferente".

  7. Embora sendo certo que o sujeito passivo respeitou o prazo do reinvestimento - 24 meses - e destinou o imóvel à habitação própria e permanente, não preencheu o outro requisito exigido por lei que é - aquisição de outro imóvel - pois adquiriu o mesmo imóvel.

  8. Assim, e em função do exposto, haverá que reconhecer que o acto de liquidação adicional de IRS, impugnado nos autos, não pode ser feito com exclusão da tributação dos ganhos provenientes da transmissão onerosa do primeiro imóvel, porque o impugnante adquiriu o mesmo imóvel e não a propriedade do outro diferente.

  9. Ao decidir em contrário o Meritíssimo Juiz "a quo" violou o disposto nas disposições dos artigos 10°, n° 5, al. a), do CIRS.

    Termina pedindo que o recurso seja julgado procedente, e revogada a sentença recorrida, a substituir por outra que julgue improcedente a impugnação judicial.

    1.3. Por sua vez, também a Fazenda Pública apresentou alegações, terminando-as com a formulação das Conclusões seguintes: I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………..

    , NIF ………. e B………….

    , NIF …….contra a liquidação de IRS do ano de 2004 com o nº 20085000076259 e correspondentes demonstração de juros e de compensação, no montante de € 27.080,41.

    1. Na douta sentença recorrida foi anulada a liquidação, ora em crise, por violação do princípio da legalidade, mais concretamente a al. a) do n° 5 do art. 10º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS).

      III.

      Entendeu o Tribunal a quo que não era de “aceitar que o termo "outro" se encontre empregue pelo legislador como requisito substancial da norma de exclusão, encontrando-se empregue exactamente no mesmo sentido em que é empregue na al. a) do n° 5 do art. 100º, ou seja, apenas no sentido de destrinçar a aquisição do imóvel alvo do reinvestimento, sem que pretenda introduzir a exigência legal do reinvestimento ter de ser realizado em imóvel distinto do alienado”.

      IV.

      A Fazenda Pública insurge-se contra este entendimento que colheu procedência em 1ª Instância porque a al. a) do n° 5 do art. 10° do CIRS é claro, ao exigir que o valor da mais-valia seja "reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel".

    2. Outro é um determinante e/ou pronome indefinido que significa "não este", "diferente", "o que não é o mesmo" (cf.

      http://www.priberam.pt/d!po/outro, http://www.dicio.com.br/outro/, http://www.lexico.pt/outro).

    3. Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis (cf. n° 1 do art. 11° da LGT), pelo que devemos trazer à colação o art. 9,° do Código Civil e concluir que "o enunciado gramatical ou filológico da lei assume-se como o ponto de partida do intérprete, mas comporta também uma função de limite, já que não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (cfr n° 2 do art. 9°) Acresce que, "[N]a fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (sic n° 3)" [Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-10-2013, Proc. 443/09.4TTVFX.1,L1-4].

    4. "Assim, não se pode, na interpretação, transcender a linguagem, a construção linguística (sintatico-formal) para afirmar um significado que não resulte expresso" [cf. LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES E JORGE LOPES DE SOUSA in LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA E COMENTADA, 4ª EDIÇÃO, 2012, Página 120].

    5. Não...

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