Acórdão nº 0226/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2014

Data25 Setembro 2014
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A……………, identificado nos autos, requereu a execução do julgado que declarara nulo o acto do Director do Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal do Funchal que licenciara a construção de uma moradia a favor de B…………. E, inconformado com o aresto do TCA-Sul que mandou atender na execução ao novo regime do loteamento vigente no local, o exequente deduziu dele esta revista, onde ofereceu as seguintes conclusões: 1) O douto acórdão recorrido indeferiu o recurso interposto da douta sentença do TAF que julgara improcedente a execução, por considerar que esta não violara o Caso Julgado que se formou sobre o douto acórdão do STA de 30/09/2009, que em recurso excepcional de Revista concretizara o dever da entidade administrativa de executar a sentença anulatória do licenciamento da construção do CI, por violação do alvará de loteamento.

2) Para tanto, o Tribunal Central considerou que aquela sentença julgou num quadro normativo diferente do vigente à data do acórdão do STA, por força da alteração ao alvará de loteamento entretanto operada.

3) Porém, o acórdão do STA de 30/09/2009, transitado em julgado a 17/06/2010, além de especificar as operações em que considerou dever consistir a execução do julgado anulatório, e de identificar o responsável por elas (a CMF), fixou prazos para a prática das mesmas.

4) Além disso, quer na sua fundamentação, quer na sua parte dispositiva, deixou claramente expresso que o dever de executar devia consistir na concessão pela CMF ao CI da oportunidade de apresentar “um projecto de legalização da sua moradia com respeito pelas condicionantes fixadas no alvará de loteamento”, e na apreciação e decisão desse projecto de acordo com essas condicionantes.

5) De tal modo que segundo o douto acórdão, ou o projecto que fosse apresentado conformava-se com tais condicionantes, e então da construção do CI devia ser demolido o volume que com ele não se harmonizasse; ou não se conformava, e então a construção deveria ser demolida na totalidade.

6) Apesar de ter reconhecido em despachos de 06/10/2011 e de 03/11/2011, que os prazos fixados pelo STA para os actos de execução estavam há muito decorridos, e de o Exequente ter-lhe repetidamente requerido que então aplicasse as consequências cominadas pelo Acórdão do STA para a inexecução desses actos, o TAF jamais o fez.

7) E ao invés, notificou a CMF para informá-lo de quanto tempo mais precisava para alterar o alvará de loteamento, e sobrestou na execução até que essa alteração fosse aprovada, o que veio a ocorrer já a 16/02/2012.

8) Essa alteração incidiu somente sobre o lote do CI (o lote n° 11), e consistiu no aumento de todas as condicionantes do alvará de loteamento, na medida necessária para adaptá-las às dimensões da construção nele realizada ao abrigo do licenciamento declarado nulo.

9) E por sentença proferida a 14/03/2012, o TAF decidiu “não conceder provimento” à execução, dando à CMF “o prazo de 45 dias para apreciar o processo de legalização da obra ao abrigo do alvará de loteamento alterado por deliberação da Câmara Municipal de 16 de Fevereiro de 2012”.

10) O Exequente recorreu dessa sentença para o TCAS, com fundamento na violação do Caso Julgado que se formara sobre o referido acórdão do STA.

11) Já porque a sentença ignorava a ultrapassagem dos prazos fixados pelo Supremo Tribunal para a prática dos actos de execução que especificou, e não aplicava as consequências nele cominadas para a omissão dos mesmos, fixando ao invés ela própria um novo prazo à executada, para a prática de um acto diferente; 12) Já porque a sentença ignorava o dever de conformação da construção do CI com as condicionantes fixadas no alvará de loteamento, claramente expresso nos fundamentos e no dispositivo do Acórdão do STA, para admitir um alteração casuística dessas condicionantes à medida das dimensões daquela construção, e um novo licenciamento desta em conformidade com as novas condicionantes.

13) Ao indeferir o recurso por considerar inexistente a violação do Caso Julgado, porque a sentença teria sido proferida após uma alteração do alvará de loteamento posterior ao Acórdão do STA, o acórdão recorrido não cuidou da questão, prévia, da invalidade dessa alteração, por ser acto desconforme com aquele Acórdão do Supremo Tribunal, que o Recorrente suscitara na conclusão 14 das suas Alegações de recurso.

14) Nem apreciou a questão, igualmente prévia, de que um ano antes da aprovação dessa alteração já se haviam esgotado todos os prazos fixados pelo STA para a prática dos actos de execução, e que para aguardar por ela o TAF sobrestou no processo de execução.

15) Assim, o acórdão recorrido suscita em primeiro lugar a questão de saber se os prazos fixados por decisão de tribunal superior, transitada em julgado, para a prática dos actos e operações que nos termos do n° 1 do artigo 179° do CPTA especifica como os devidos para a execução de uma sentença anulatória de acto administrativo, integram-se ou não no núcleo da força obrigatória do Caso Julgado que se forma sobre aquela decisão, em termos de se imporem ao tribunal da execução.

16) E suscita em segundo lugar a questão de saber se viola ou não a força obrigatória do Caso Julgado que se forma sobre decisão de tribunal superior que em processo de execução de sentença anulatória de licenciamento de obra particular por violação de alvará de loteamento, admite a legalização da obra construída, mediante projecto a apresentar pelo CI com respeito pelas condicionantes fixadas nesse alvará, uma decisão posterior do tribunal da execução que permite à entidade administrativa alterar aquelas condicionantes, de modo a adaptar o alvará à construção realizada ao abrigo do licenciamento nulo.

17) A primeira questão afigura-se revestir importância fundamental pela sua relevância jurídica, por implicar o esclarecimento do âmbito do Caso Julgado de uma decisão concretizadora do dever de executar uma sentença anulatória de acto administrativo, nomeadamente se ele abrange os prazos fixados para a prática dos actos de execução, e ainda pela elevada susceptibilidade de repetição dessa questão num número indeterminado de processos de execução de julgados anulatórios.

18) E suscita a necessidade da intervenção do Supremo Tribunal Administrativo para uma melhor aplicação do direito, porquanto a passar em claro a total irrelevação pelas Instâncias dos prazos por ele próprio fixados para a prática dos actos de execução de uma sentença anulatória, proporcionar-se-ia a criação da ideia de que esses prazos são meramente indicativos, e não verdadeiramente obrigatórios, susceptível de influenciar o curso e a gestão pelos tribunais inferiores dos processos de execução de sentenças anulatórias de actos administrativos, com o consequente enfraquecimento da força obrigatória e da eficácia das decisões judiciais proferidas nos termos do n° 1 do artigo 179º do CPTA, e da própria autoridade e prestígio do Supremo Tribunal.

19) Por sua vez, a segunda questão afigura-se revestir importância fundamental pela sua relevância social, por versar sobre problema de direito urbanístico e de ordenamento do território, importante para a Comunidade e de espectro subjectivo muito alargado, dado o impacto que é passível de nela gerar (a resposta negativa à violação do Caso Julgado terá como consequência a manutenção da construção do CI, e a positiva a sua demolição), e o seu interesse significativo para um conjunto indeterminado de casos futuros (pois são frequentes as violações de alvarás de loteamento e de outros instrumentos de ordenamento do território).

20) Além de que reclama também a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo para uma melhor aplicação do direito, porquanto o entendimento das Instâncias não só atenta ostensivamente contra aquele que na Revista excepcional o STA dispôs, como não pode ser em geral sufragado, por contrariar a natureza geral e abstracta das normas jurídicas, e subverter a função reguladora das mesmas.

21) O acórdão recorrido é nulo, porque não apreciou a questão da violação do Caso Julgado sob o aspecto da desconsideração pelo TAF dos prazos fixados pelo STA, suscitada nas conclusões 4ª a 6ª e 9ª das alegações do recurso.

22) E ao indeferir o recurso por considerar não verificada a violação do Caso Julgado do acórdão do STA de 30/09/2009, o acórdão recorrido violou as normas dos artigos 619°/1 e 621° do CPC, ex vi do artigo 1° do CPTA.

O Município do Funchal contra-alegou, concluindo do...

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